Pesquisar este blog

quarta-feira, fevereiro 14, 2018

LEOPODO LUGONES - TRAD. ERIC PONTY

Delação morosa

A tarde com ligeira pincelada
Que se iluminou paz de nosso asilo,
Apontou-se em teu matiz de topázio 
Duma sutil decoração morada.

Surgiu-se enorme à lua na enramada,
As folhas se agravavam teu sigilo,
E uma aranha nesta ponta dum fio,
Tecia-se sobre o astro, hipnotizada.

Assentado de morcegos nas rochas
Céu à maneira de chineses biombos,
Tuas rodas exangues sobre as pinturas.

Manifestam tua delícia inerte
E nossos pés um rio com jacinto
E corria sem o rumor até à morte.

Amapola

Com a tua saia de velhos brocais,
Se ia Clori saborosa até as trilhas,
Vê-las entre meses amarelados
Se inflavam-se em seus rincões dóceis.

Evocavam fandangos e rondeis,
Nas medias furaste panturrilhas,
E ao sangue pintava em seus círios,
Como duma descendia de encravados.

Só dum beijo.... Vasos resíduos canas,
Se fatigavam em ardente brisa,
Enquanto Clori com fingido nojo.

Sorria ajustando-se da tua camisa,
Brotou lhe duns pequenos partem ao roxo
Deste tremulo coral de teu sorriso.

Camélia

Como se chama do coração de augura:
-Clélia, Eulália, Clotilde – primeiro
Nome com muitos eles como um fino
Cristal, todo vibrante de água pura.

Se incende no claro de tua brancura,
Com diminuta chama, dum essênio,
Carmim. Alma lilial conta ao destino
Românticas novelas da amargura.

No vago perfil donde se destila,
Seu olho negro fatal desola aquela
Palidez. Tuas maneiras tão prolixas.

Como as dessas moribundas e rasas,
Que se cobrem dedos destes anéis,
E se desvivem pôr as sedas claras.
LEOPODO LUGONES
TRAD. ERIC PONTY

Teresa Wilms Montt - Inquietudes sentimentais – TRAD. ERIC PONTY

Na da luz da lâmpada, atenuada pela tela violeta, se desmaia sobre a mesa.

Os objetos tomam duma tintura sonambúlica de delírio doentio; dirias sê que uma mão tísica houvera afagado o ambiente, deixando nele sua languidez aristocrática.

Una campainha impiedosa repete a hora e me faz compreender que vivo, e me recorda, também, que sofro.

Sofro dum estranho mal que fere enfadando; mal de amores, de incompreendidas grandezas, de infinitos ideais.

Mal que me incita a viver em outro coração, a descansar da rude tarefa de sentir-me viver dentro de mim mesma.

Como os sedentos querem à água, assim eu anseio que meu ouvido ouça uma voz prometendo-me doçuras arrebatadoras; anseio que duma astucia infantil se apodere sobre minhas pálpebras cansadas de velar e abrande em meu espírito rebelde, aventureiro.
Assim desejaria eu morrer, feito a luz da lâmpada sobre as coisas, espargida em sombras suaves e temerosas.
Teresa Wilms Montt
TRAD. ERIC PONTY

Rimas y leyendas - Gustavo Adolfo Bécquer - TRAD. ERIC PONTY

Eu sei dum hino gigante e estranho
Que se anuncia noite d´ alma uma aurora,
E essas páginas são desse hino
Cadências que ao ar dilata nas sombras.

Eu quisera escrever-lhe, do homem
Domando o rebelde, mesquinho idioma,
Com palavras que fossem há um tempo
Suspiros e risos, cores e notas.

Porém é vão lutar; não havendo conjunto
Capaz de prendê-lo, apenas ô formosura!
Se tende em minhas mãos nas tuas
Poderiam, ao ouvido, causá-los aos pés.

Salta qual uma voadora
Cruzou, arrojada ao azar,
E que não se sabe onde
Temendo se prenderá.

Folha que d´árvore seca
Deslumbra-se do vendaval,
Sem nada lhe acerte sulco
Onde ao pó retornará.

Gigante onda que do vento
Ergueu e empurrou ao mar
E roda passou e se ignora
Que da praia busca está.

A luz nos acerca temerosa
Brilhar próxima ao expirar,
E que não sei saber
Qual será último a ser.

Isso sou eu que do acaso
Cruzou do mundo sem pensar
De onde venho nem onde
Meus passos me levaram.
Gustavo Adolfo Bécquer
TRAD. ERIC PONTY

terça-feira, fevereiro 13, 2018

De Atlas - Jorge Luis Borges - TRAD. ERIC PONTY


Istambul

Cartago é o exemplo mais evidente duma cultura caluniada, nada podemos saber dela, nada pode-se saber de Flaubert, senão o que referem seus inimigos, que foram implacáveis. Não sendo impossível que algo parecido ocorra com a Turquia. Pensamos em um país de crueldade; essa noção data das Cruzadas, que foram as empresas mais cruéis que se registra na história e a menos denunciada de todas. Pensamos no ódio cristão acaso não inferior ao ódio, igualmente fanático, do Islam. No Ocidente lhe há faltado um grande nome turco aos otomanos. O único que nos hei chegado é o de Suleimán o Magnífico (e só em parte vide os Saladino).

Que posso eu saber da Turquia ao fim de três dias? Hei visto uma cidade esplêndida, o Bósforo, O Corno doiro e a entrada ao Mar Negro, em cujas margens se descobriram pedras rúnicas. Hei escutado um idioma agradável, que me sonha a dum alemão mais suave. Por aqui caminharam os fantasmas de muitas e diversas nações; prefiro pensar que os escandinavos formavam a segurança do imperador de Bizâncio, aos que se uniram aos salões que existiram da Inglaterra despois da jornada de Hastings. É inundável que devemos retornar a Turquia para empregar ao que se descobrira.

Jorge Luis Borges

Os Dons

Lhes foi dada a música invisível
Que é dom do tempo e que no tempo cessa;
Lhes foi dada a trágica beleza,
Lhe foi dado o amor, coisa terrível.

Lhe foi dado saber que entre as belas
Mulheres da terra só há uma;
Posso uma tarde descobrir a lua
E com a lua a álgebra de estrelas.

Lhes foi dada a infâmia. Docilmente
Estudou-se os delitos da espada,
A ruina de Cartago,
Semelhante batalha do Oriente e do Poente

Lhe foi dado à linguagem, essa mentira,
Lhe foi dada a carne, que é argila,
Lhe foi dado o obsceno pesadelo
E no cristal do outro, ele que nos observa.

Dos livros que o tempo há acumulado
Lhe foram concedidas dumas folhas;
De Elia, uns contados paradoxos
Que o desgaste do tempo não há comido.

O erguido do sangue do amor humano
(A imagem é dum grego) lhe foi dada
Por aquele cujo nome é duma espada
E que dita as letras das mãos.

Outras das coisas lhes deram aos seus nomes:
O cubo, a pirâmide, a esfera,
Á inumerável areia, a madeira
E um corpo a andar entre os homens.
Fui digno do sabor de cada dia;
Tal é tua história, que é também da minha.
Jorge Luis Borges
TRAD. ERIC PONTY

O Livro de Job - As 3 Primeiras Parabolas - TRAD. Eric Ponty

Quem foi Job?

Havendo uma vez, dum certo país chamado Uz, um homem muito bom e honrado. Sempre sendo obediente a Deus em tudo evitando fazer o mal. Ele se chamava Job,

2-3 E era o homem mais rico na região do lugar. Tinha sete filhos e três filhas, e muitos escravos que estavam ao seu serviço. Uma vez, sendo dono de sete mil ovelhas, três mil camelos, mil bois e quientas jumentas.

Os filhos de Job faziam entre si grandes festas, e sempre convidavam as três irmãs a que comessem e bebessem junto deles. Eram tantas as festas que haviam, que se iam se transformado entre eles.
Despois de cada festa, Job chamava aos seus filhos e celebrava uma cerimônia em pedido a Deus que os lhes perdoasse qualquer pecado que poderiam de haver cometido. Se erguia muito cauteloso sendo que se apresentava a Deus numa oferenda por cada um de seus filhos. Job ao fazer isto pensando que talvez alguns de seus filhos pudessem haver ofendido a Deus no pecado contra ele, Deus. A Job, isto era um costume praticado todos os dias.

O Anjo delator
6 Num dia em que os anjos tinham por costume apresentar-se ante Deus, chegou também o anjo acusador.
7 E Deus lhe disse: —Como está! De onde surgiu? E este lhe contestou: —Venho de recorrer toda a terra. Então Deus lhe perguntou:
8 —Em tu pensas de Job, meu fiel servidor? Não existe em toda a terra nada de tão bom como ele o é. Sempre me obedece em tudo evita de fazer o mal.
9 O anjo acusador respondeu: — Isso tu o pensas! Porém si Job te obedece, é por puro interesse!
10 tu o sempre o proteges a ele e a tua família; cuidas tudo o que tem, e bendizes o que faz. Suas vacas e ovelhas vivem em sua região!
11, porém eu te afirmo que si o maltrates e lhe retiras tudo o que tem, falará mal em tua própria presença!
2 Então Deus lhe disse ao seu acusador: —Muito bem, faças o que tu queiras com todo do que ele possuir, porém nele nem te atrevas a tocá-lo. Dito isto, o anjo se retirou.

As Primeiras Provas de Job
13-14. Um dia, contudo, os filhos e as filhas de Job celebravam uma festa na casa do irmão maior, chegou um mensageiro a dizer-lhe a Job: Um dos bandidos da região de Saab nos atacaram e nos roubaram todos teus animais! Nós estávamos arando com os bois, contudo os burros se alimentavam por ali naquela região.
15. De repente, esses bandidos começaram a matar nossa gente, e só eu pude escapar para comunicar-te essa notícia.
16, contudo estava falando esse homem quando outro mensageiro chegou e comunicou a Job: Um raio termina de matar suas ovelhas e aos pastores! Só eu pude escapar para comunicar-te a notícia!
17. Não terminava de falar esse homem quando outro mensageiro chegou lhe dizendo: Três grupos de bandidos da região da Caldeia nos atacaram, e mataram aos teus escravos, e roubaram todos os teus camelos! Somente eu pude escapar para comunicar-te a notícia!
18. Contudo estava ainda falando esse homem quando um quarto mensageiro chegou e comentou a Job: Todos seus filhos estavam celebrando uma festa na casa de teu filho mais velho
19. De repente, veio um forte vento do deserto e destruiu a Casa. Todos os seus filhos morreram soterrados! Só eu pude escapar para comunicar-lhe essa notícia!
20 Enquanto Job ouvia isto, se pôs de pé e rompeu a sua roupa em sinal de dor; logo se pôs ajoelhar-se com sua cabeça e se inclinou até o chão a adorar Deus.
21 E proferiu: Nada hei atraído a este mundo, e nada me hei de levar. Bendigo a Deus quando este o meu deu! Sagro a Deus quando ele me falta!
22 Ao pesar de tudo o que lhe havia sucedido, Job não injuriou a Deus nem lhe encheu de alguma culpa.
TRAD. ERIC PONTY

segunda-feira, fevereiro 12, 2018

Manuel Silva Acevedo - Lobos e Ovelhas - Trad. ERIC PONTY

Há um lobo em minha entranha
Que pugna por nascer
Meu coração de ovelha, de lerda criatura
Se dessangra por ele.

Por que si sou ovelha
Deploro meu ovino azar
Por que maldigo minha pacífica cabeça
Volta até o sol
Por que desejo me afogar
No sangue de minhas brutas irmãs
Apascentadas

Me pareciam de má maneira
Me pareciam ovelha
Sou tão desgraçada e temerosa
Não sou mais que uma ovelha mendiga
Me depreciando a mim mesma
Quando ouço os lobos
Que ladram do monte adentro

Eu, a ovelha sonhadora,
Pascia entre as nuvens
Porém um dia a loba me pegou
E eu, a estúpida cordeira,
Conheci então a noite
A verdadeira noite
E ali na treva
De sua entranha de loba
Me senti um lobo mal de repente

Si me dessem a optar
Seria o lobo
Porém que posso fazer si esta pobre peleja
Não reluz como a noite negra
E estes magros colmilhos não mordem nem desagarram.

Si me dessem a optar
Saberia acometer como acometo agora
Esta mísera alfafa, famélica, ovelina

Si me dessem há optar
Os bosques silenciosos seriam minha guarida
E meu uivo ominoso faria temblar aos rebanhos
Porém que fazer com minhas albas lãs
Como transfigurar minha condição ovina.
TRAD.ERIC PONTY

ZONA – Guillaume Apollinaire – TRAD. ERIC PONTY

Absolutamente estás cansado deste mundo antigo
Pastora Ô torre Eiffel do rebanho das pontes de bala desta manhã
Está exausto de viver na antiguidade Greco romana
Daqui até os carros parecem velhos
Só a religião segue sendo completamente atual somente a religião
Vai indo sentida com seus hangares de Porta-Avião
Somente tu não foste velho na Europa ô Cristianismo
O europeu mais moderno de todos que você Papa Pio X
E tu há quem as janelas observam a vingança te previne
De entrar em uma igreja e confessar-te esta manhã
Lendo os prospectos dos catálogos os carteis que ti cantaram há pleno pulmão
Neles se encontrava a poesia desta manhã na prosa que ficou nos jornais
Nos jornais a 25 centímetros repletos de aventuras policiadas
São os retratos de grandes homens e de mil títulos distintos
Esta manhã vi numa rua preciosa cujo nome não me lembro
Uma rua nova limpa era como o clarim do sol
Os diretores os trabalhadores e as formosas taquigrafia
Das luzes ao sábado que ti apelam quatro vezes ao dia
Pela manhã se escutam gemer na sirene três vezes
Duma campainha escandalosa alertava-nos ao meio dia
As letras dos anúncios que estão pintados em murais
Nas placas de advertências que cintilam iguais aos louros
Me maravilham que tua graça tem esse caminho industrial
De Paris entre a de Aumont-Thiéville e a avenida des temes
Admira é uma rua jovem e tu não passes dum menino
Sua mãe não te olhou mais que do azul e do branco
Sendo tão devoto como teu velho amigo René Dalize
E nada os satisfaz tanto como as pompas da Igreja
Já são as nove luzes de gás decresce toda azul
Saís do aposento comum das ocultas
Rezais durante toda noite na capela do colégio
Contudo eterna e de adorável profundidade ametista
Roda sem fim na flamante glória de Cristo
Sendo a formosa Açucena que todos nós cultivamos
Tu és tocha perigosa que o vento não lhe mitiga
Sendo o filho pálido e turquesa da Mater dolorosa
Sendo árvore sempre frondosa de todas as reverências da fé
Sendo a nobre forca da honra e da eternidade
Sendo como uma estrela de seis pontas
Sendo o Deus que morre aos vermes e ressuscita no domingo
Sendo o Cristo que subiu ao céu qual do melhor dos aviadores
E detinha o Record mundial de altura
Pupila de Cristo da visão
Vigésima pupila dos séculos se as agarra bem
E se transforma em pássaro este século ascende como Jesus
Os diabos nos abismos alçam a cabeça a contemplar-lhe,
Dizem que tu que imitas a Simão o Mago da Judeia
Gritam que si ao saber voar deveria coze-las no voo
Os anjos volteiam no gracioso voador
Ìcaro Enoque Elias Apolônio de Tiana
Flutuam ao redor do primeiro avião
As vezes se afastam ao deixar-vos em tua marcha
Daqueles hão quem se transporta a Santa Eucaristia.

Esses sacerdotes ascendem eternamente alçando a hóstia.

Por fim o avião aterrissa sem encostar as asas
Do céu se alivia então de milhões de pombas
Ao todo voo chegando com corvos os algozes dos falcões
D` África nos vem os íbis os flamencos das tuas plumas
O pássaro Roch celebrado pelos contistas e os poetas
Planteiam levando em suas garras da primeira cabeça crânio de Adão
Sendo à águia que se cerne desde o horizonte lançando um grande berro
E da América vem o pequeno colibri
Da China hei chegado os pihis largos de ágeis dóceis
Que só tem uma asa e por isso voam em conjunto
Logo aparece a pomba em espirito imaculado
Escoltada pela ave lira e o pavão alado
E fénix essa fogueira que se produz a si mesma
Por um instante cuida todo com sua ardente cinza
As sirenes que hão descuidado os perigosos estreitos
Chegam cantando as três com a voz gentil
E todas águias de fénix e pilhes da China
Se fraternizam com a máquina voadora.

Agora que caminhas por Paris completo só entre os gentios
Rebanhos de caminhões mugem e passam ao teu lado
Na angústia do amor te abusas da garganta
Como si nunca jamais mais deverias ser amado
Si vivesses na época antiga te farias monge
Sempre senti há vingança quando os surpreendeis rezando
Te enganas há ti e ao teu riso crepita como o fogo do Inferno
As chispas de teus risos doiram ao fundo de tua vida
É como um quadro pregado em um museu sombrio
E as vezes vais admirá-la em volta

Hoje caminham por Paris as mulheres que vão sangrentas
Ocorrias e quis não a lembras ocorrias do declive do encanto

Envolta chamas fervorosas Nossa Senhora me há olhado em Chartres
Do sangue de vosso Sagrado Coração me há sendo negado em Montmartre
Me pões enfermo ao escutar as bem-aventuras
No amor que padeço é duma enfermidade vergonhosa.

Agora olhar-te nas orelhas do Mediterrâneo
Debaixo os limoeiros continuamente floridos
Passeiam na barca com teus amigos
Um é de Niza de outro de Mentor e dois da Turba
Todos ti observamos temerosos os polvos abissais
E dentre as algas nadam os pés das imagens do Salvador.







Estás em meio ao jardim dum boteco ao redor de Praga
Tu ti sentes completamente feliz há uma rosa sobre a mesa
E tu observas na vez de escrever teu conto falido

A ctônia que adormece no coração da rosa
Com horror te viste retratado nas Ágata de São Vitor.

Daquele dia estavas tão triste não mais poder
Te pareces à Lázaro enlouquecido pela tua luz.


As pontas do relógio do bairro judeu vão em sentido contrário
Como ti que retornas lentamente em tua vida
Subindo ao Hradschin ouvindo à noite
Ao cantar nas tabernas canções secas.


E também na Marselha cingido de flores amarelas

E também de koblenz  no hotel do Gigante

E também na Roma sentado embaixo dum vespeiro japonês
E também em Amsterdam com uma mulher que te pareceu formosa sendo feia
Tem que casar-se com um estudante de Leiden

Onde enganam habitações não em latim de locanda
A recordação de bem que ali se passou três dias e outros tantos em gudang

Estando em Paris no testamento de tua instrução
Debaixo do depósito penitenciário igual dum criminoso.

 Havendo feito viagens penosas e alegres
Antes de advertir da mentira e da idade

O amor te há feito sofrer aos vinte aos trinta.

Hei existido como um louco hei perdido no meu tempo
Já nem si quer te através ao olhar-te as mãos.

E sendo que a cada momento quis soluçar
Por ti por que ti amo por todo que hei te espantado
Admira com lágrimas nos olhos a esses pobres emigrantes.

Creem em deu rezando as mulheres nutrem os meninos
Seu odor exala o vestíbulo da estação de Saint-Lazare
Confiando em sua estrela como os Reis Magos.

Esperam regressar regressados da Argentina.



Regressar ao teu país é duma grande fortuna

Uma família se aquece num edredom rubro como vosso coração.

Esse edredom foi composto por nossos sonhos sendo também irreais

Alguns dos emigrantes permanecem aqui e o habitam
Tugúrios na rua des Rosiers em que a rua des Ecouffes



Ao menino lhes hei visto noite sair para tornasse fresco
E raramente se movem como as peças dum xadrez

A maioria são judeus suas mulheres vestidas de perucas
Se tornam sentadas enxagues nestes teus aposentos.

Estás de pé ante a barra dum bar do mal da morte
Tomando um café barato entre os desgraçados

Da noite te vais num grande restaurante
Essas mulheres não são malévolas sensivelmente tem seus problemas

Todas até a mais horrorosa hão de haver feito sofrer ao teu amante.


É sendo filha dum guarda municipal de Jersey
Suas mãos que há um não haviam visto são as que mais permanecem estão juntas

 Me dão muitíssima lástima as ligações de seu ventre

Agora humilho dum pobre pontinho de teu riso horrível minha boca

Estás só mui sadio e amanhecerá.

Nas ruas se escutaste o tinir das leiterias.

A noite se alheia como duma formosa mestiça

É Ferdine a falsa ou Léa a benévola

 E ao beber desse álcool abrasador como foi tua vida
Tua vida que bebeste como um copo de aguardente.

Caminhas até Auteuil sendo quer ir andando em tua casa
Adormecer entre teus fetiches da Oceania da Guiné
Sâo estes Cristos de forma marcada e distintos de crença.

São como de Cristos inferiores destas escuras esperanças.

Guillaume Apollinaire
TRAD. ERIC PONTY

O Perfume da Oração - APÓLOGO - VICENTE RIVA PALACIO, O POETA - TRAD. ERIC PONTY

APÓLOGO

Como da oferenda da dor
Que ferro mundo consume,
E subindo até o Criador,
Se encontraram com amor,
Uma oração e dum perfume.

E da extensão tão ampla
Ao cruzar com doce calma,
Dizem com voz melodiosa:
—Sou oração duma rosa.

—Sou o perfume da alma.
Quando de aguda paixão
Alma! A pena te abruma,
Pensa, com santa emoção,
Que é aroma desta oração,
E há sendo pregaria ao perfume.

El Imparcial, 29 de diciembre de 1872, p. 3.
 VICENTE RIVA PALACIO
TRAD. ERIC PONTY

domingo, fevereiro 11, 2018

De Atlas - Jorge Luis Borges - TRAD. Eric Ponty

O totem

Plotino de Alexandria, conta Porfirio, se negou a fazer-se retratar, alegando que ele era somente a sombra de seu protótipo platónico e que o retrato seria sombra duma sombra. Séculos despois Pascal redescobriria esse argumento contra a arte da pintura. A imagem que vemos aqui é a fotografia do fac-símile dum ídolo do Canadá; é dizer, é a sombra da sombra duma sombra. Seu original, chamemo-lo assim, se ergue, alto e sem culto, detrás da última das três estações do Retiro. Se trata dum regalo oficial do governo do Canadá. A esse país não lhe importa ser representado por essa imagem bárbara. Um governo sul americano não se atreveria ao abuso de regalar uma imagem duma divindade anónima e tosca.
Sabemos destas coisas sem constrangimento nossa imaginação se compasse com a ideia dum totem no desterro, dum totem que obscuramente exige mitologias, tribos, encantações e acaso sacrifícios. Nada o sabemos de seu culto; razão de mais para sondá-lo no crepúsculo duvidoso.

 Jorge  Luis Borges


O Lobo

Furtivo e gris na penumbra última
Vai deixando seus rastros na margem
Deste rio sem nome que há saciado
A sede de sua garganta e cujas aguas
Não repetem estrelas. Esta noite,
O lobo é uma sombra que está só
E que busca da fêmea e sente frio.
É último lobo de Inglaterra.
Odím e Thor o sabem. Na sua alta
Casa de pedra um rei houve decidido
Acabar com os lobos. Já forjado
Havendo sido o forte ferro de tua morte.
Lobo sadio, há engendrado em vão.
Não basta ser cruel. És o último.
Mil anos passaram e um homem velho
Te sonhará na América. De nada
Pode servir-te esse futuro sonho.
Hoje te cercam os homens que seguiram
Pela selva os rastros que deixaste,
Furtivo e gris nessa penumbra última.
Jorge  Luis Borges
TRAD. ERIC PONTY

De Atlas - Jorge Luis Borges - TRAD. ERIC PONTY

A deusa gálica
Quando Roma chegou a estas terras últimas e ao seu mar d´aguas doces indefinido e sendo interminável, quando César e Roma, esses deuses claros e altos nomes, chegaram, a deusa de madeira queimada já estavam aqui. A chamariam Diana o Minerva, de maneira indiferente dos impérios que não são missionários e que preferem reconhecer e anexar as divindades vencidas. Antes ocuparia seu lugar numa hierarquia precisa e seria a filha dum deus e a mãe de outro e a vinculariam aos dons da primavera ao horror da guerra. Agora a cobiça se exibe dessa curiosa coisa, dum punhado. Nos chegando sem mitologia, sem a palavra que foi sua, porém com o olvidado clamor de gerações hoje sepultadas. É uma coisa direita e sagrada que nossa ociosa imaginação possa enriquecer irresponsavelmente. Não oraremos nunca as pregarias de seus adoradores, não saberíamos nunca os ritos.
Jorge  Luis Borges
César


Aqui, o que deixaram os punhais.
Aqui essa pobre coisa, um homem morto,
Que se chamava César. Lhe hão aberto,
Chagas na carne os metais.
Aqui a atroz, aqui a destemida
A máquina usada fazer a glória,
A escrever e executar a história
E que para se goze pleno da vida.
Aqui também outro, daquele prudente
O imperador que se recusou lauréis,
Que comandou batalhas e navios
E foi horror e foi inveja da gente.
Aqui também o outro, o sucessor
Cuja grande sombra será a orbe inteira.

Jorge  Luis Borges

TRAD. ERIC PONTY

sábado, fevereiro 10, 2018

Torquato Tasso - SONETOS - TRAD. ERIC PONTY

Descrive la bellezza de la sua donna e il principio del suo amore, il quale fu ne la sua prima giovinezza.

Era da idade de meu alegre abril,
Por anseio d´alma ainda menina,
Me indagava qual bela despertava,
De aprazer em aprazer do gracejo.

Quando me olha dona mui parecidos,
Nem a tua voz é cândida qual de anjinhos,
Ali não mostraram ser quase já eleita,
Mostrar-se por dar meu formoso estilo.

Maravilha nova! Está meu verso e eu,
Circundava teu nome altera pluma,
Um por outro, eu ando retorna a prova.

Esta foi daquela o qual dei suave luz,
Lamentar só  o cantar de me servir,
Eu primo ardor espargir doce olvido.

Segue la medesima descrizione.

Tua ampla fronte crespa douro luzente,
Sumo encrespar lindos olhos de raios,
Ao terreno alega de florido maio,
Junho haver outro limite ardente.

Nem branco seno Amor carinhoso,
Estilhaçava não ouso agir ultraje,
E aura de falar cortês sensato,
Entre rosa aspirar odor tão amiúde.

Eu que forma celeste em terra vista,
Prendo luz digo: “Ali qual é aloucada,
Olhar nem ela se encara tão audaz.

Mas de outro perigo não me escapa,
Que me fui por orelha cerne ferido,
Chamo andar onde não chego e volto.

Dimostra come l’amore acceso in lui da l’aspetto de la sua donna fusse accresciuto dal suo canto.

Endereço já suave vago aspecto,
Quebro gelo onde armou desdém da cerne,
E deste vestígio antigo ardor,
Conheça dentro deste cambiante peito.

E de nutrir-me o mal preso da dileta,
Com isca tão doce dum suave do erro,
Esforçava num lisonjeiro amor,
Nem belos olhos albergados eleitos.

Quando eis novo canto cerne golpeia,
Espírito nem fogo e mais ardente,
Fez-se flama tão plácida e tranquila.

Nem crescer mais nem cintilar vinte,
Coisa vi jamais faz-se comovido,
Incêndio crescido nesta fagulha.

Dice d’aver veduta la sua donna su le rive de la Brenta e descrive poeticamente i miracoli che facea la sua bellezza

Sobre todas outras, amo estimo,
As Flores colhidas vi eu desta margem,
Mas não tanto outra eu agarro louro,
Quanto fez da erva branco não se abre.

Hesitava espalhar-se crina douro,
Amor mil e mil ligas se tramavam,
Aura desde falar doce do conforto,
Era do fogo de os olhos apagavam.

Firme curso rio puro qual incerto,
Espelho daquela cabeleira loura,
Desta igual e de que tua doce luz.

Parei em dizer; ”A tua bela imagem,
Se pura não digna só rio grande,
Ilumine dona plácidas ondas”
TRAD. ERIC PONTY

Dante Alighieri - SONETOS - TRAD. ERIC PONTY

Dante da Maiano a diversi rimatori.

Provendo-me sábio, da visão,
Arbítrio não trai vera sentença,
E digo duma dona bela facção
De meu coração medir mui agência.

Minha fé duma guirlanda doação,
Verde, frondosa bela recepção,
Aproveito meu trovar por vestígio
Camisa teu cume minha partida.

Destinai tant´ amigo,privilegio,
Docemente grandeza abraçar,
Não desacordo desprezar belo.

Coisa desprezando mui em beijar,
Coisa desprezando mui em beijar,
Qual já não digo minha fé julga
E morta minha mãe era como ela. 

Dante Alighieri a Dante da Maiano.

Salva julgamento vossa razão,
Que homem que prega salvar saber,
Porque vitando haver vossa questão,
Com teu respondo palavra ornar.

Desejo fértil arado ao fim se pôr,
Gesto de valor se faz obediente,
Imagina vossa amiga de opinião
Significasse um dom antes contasse.

A vestimenta rica vera esperança,
Que fia dela qual almejado amor,
Não prover vosso espírito bondoso.

Digo pensando nessa tua ocasião,
Figura que já morta sobrevir,
Na firmeza haverá no coração.

Dante da Maiano a Dante Alighieri

Vou qualquer sítio, amigo, teu manto,
A ciência falar tal não é jogo,
Sem que, por nem saber-me, d’ira toco,
Aludir-lhe, satisfazer tanto.

Sacia-te bem (Se vou conosco enquanto)
há de saber ver sou homem d’um pouco,
Nem por via maga parto nem volco,
Quase parente mago em cisco canto.

Põe  vontade saber minha de coragem,
Vez que olhei rosto intrigados há quem,
Forem qual por mago vosso falar:

Certos foram consciência do torpor,
Não é amado, se ele é teu amador,
A Cor vulto dor reza-lhe paraíso.

Dante da Maiano a Dante Alighieri

Não entendendo de amigo vosso nome,
Donde se movendo com medir fala,
Conosco bem ciência grande nome,
Se quanto saber ninguém por murmura.

Se pôr bem o conhecer que dum homem,
Ocasiona se há seno bem que murmura,
Acender, pois, vou saudar lhe por nome,
É forte língua minha disto falando.

Amigo é (certo sondar este amado,
Por amor conforta) saco bem que ama
Não és amado maiores ébrias portas.

Tal dor tem sob tua varinha ardida,
Todo outro inicio nenhum chamou,
Disto vem quanta da pena amor porta.

Dante da Maiano a Dante Alighieri

Lapso sorte fez meu destino serra,
É agradecer bem não sabendo como,
Por mim já sábio convergir-me como
É vosso saber cada questão serra.

Da sorte que mui gente disse se erra,
Tal fugir quem amo não há quanto,
Próprio se desejo saber  é sorte,
Disto amiúde digo, havendo serra.

Porém rogo argumentar sensato,
Autoridade mostrando isto porta,
Vou impressionar este já clara.

E logo parece falar disto claro,
Qual já explicou sorte pena porta,
Propor, amigo prova ajuizado.

Dante da Maiano a Dante Alighieri.

Amor fez sinceramente amar,
E si distrito em teu desejo feito,
Só um ora não poderia partir-se,
Do Coração de meu de pensar aflito.

D’Ovidio sorte filh´ incontável prova,
Que dizer por mal d´Amor em curar,
sorte ver-se não vale mais mentir,
Porque só me rendo mercê chamar.

E bem conosco tudo verdadeiro,
Que inverso Amor não vale força arte,
Engenho nem a lenda que homem se trova.

Nunca que mereça ser que do enfermo,
E bem servir coisa como é parte,
Provado d´ amigo sábio aprovar.

Dante Alighieri a Dante da Maiano.

Sabes cortesia engenho e da arte,
Nobilizar beleza o rigor,
Fortaleza humilde larga essência,
Proeza excelência vinda salvar.

Esta graça e ventura em uma parte,
Aprazer amo conseguir amor,
Uma já bem já feita de valor,
Inverso dele cada um não parte.

Onde se voos amigo ti valia,
Ventura natural e do acidente,
Leal aprazer amor deveria.

Não constatar de tua graciosa obra,
Nula coisa que encontro de potente,
Querendo prender ti com tua peleja.

TRAD. ERIC PONTY

Michelangiolo Buonarroti - SONETOS - TRAD. ERIC PONTY

III

Grato e feliz, dos ferozes males,
Ostentam e vencem foi concebido,
Ou laço, ao peito vou banhar frequente,
Contra minha cobiça, só quando vale.

E se danoso suprimir a fecha,
Signo do meu cerne não foi mais junto,
Saber golpear vingança si mesmo,
Do belo olhar, e fiar todos mortais.

Quantos laços até mesmo quanta redes,
Vaga passarinho por maligna sorte,
Mora mui anos a morrer infeliz.

Tal de mim, dona, Amor, como verás,
Á dar-me nesta época cruel morte,
Sem base meu grão tempo como vejo.

IV

Quanto si goza alegre bem contesta,
Da flor sopra crina doiro guirlanda,
Que um outro prévio há um outro manda
Como se primo vai beijar julgar.

Contenta tudo em torno aquela vesta,
Que cerra peito põe da que si expanda,
E que com fios douro si convida,
Guanche ajusta sonhar não abandonar.

Mas mais de alegre tira que goza,
Doirada ponta com si faz caráter,
Que pressiona e toca peito se liga.

A sincera cintura que se amarra,
Meu igual enxuto que corrente sempre,
Ou que fazeis coroa dos meus braços?

VI

Senhor, vero é dalgum dito antigo,
Isto é bem que pode, mas não queres,
Tu dás ao crédito ao valor tua palavra,
E premiado de ver o teu inimigo.

Eu sendo e fui teu bom servo antigo,
Que a ti são dados como raios sol,
E do meu tempo não aumenta esmola,
E homens gostam mais que fatigados.

Esperava ascender há tua altura,
E gosto peso da potente espada,
Agita precisão não há voz do eco.

Mas céu que certa virtude despreza,
Localiza mundo, se dá que outro vá,
Ao prender fruto da árvore tão seca.

X

Se faz de elmos cálices e espadas,
E sangue de Cristo se vende gamelo,
Cruz de espinhos sejam um lance a roda,
Pureza Cristo paciência cai.

Mas não chegue mais nesta província,
Que nem André sangue seu está estrela,
Depois que Roma vendeste tua pele,
Eis cada bem fechado nesta estrada.

Se haveria querer perder Tesauro,
Por isto que se obra minha partida,
Pode que nem manto Medusa em Mauro.

Mas se alto céu pobreza estimada,
Qual fia de nosso estado grão restauro,
Se outro signo apaga há outra vida?

23


Eu que fui já muitos anos mil voltas,
Ferido e morto não ganho exausto,
De ti minha culpa, de início branco,
Repreendê-lo tua promessa tola.

Quantas vezes ligada e quantas soltas,
Triste membro, sim incitando lado,
Apenas posso retornar meio anco,
Banhando peito com muitas das lágrimas.

Ti dolorido Amor, com triste fala,
Solta teu poder, que necessidade,
Pega arco cruel, tirou-lhe voto?

Lenho incinerado serra angústia,
Dentro dum correndo é grão da vergonha,
Perdeu firme cada destreza gesto.

34

A vida de meu amor não é imo meu,
Que amor de que ti amo sem coração,
Onde a coisa mortal, plena de erros,
Ser não posso, mas nem lhe pensei mau.

Amor nem repartir alma de Deus,
Me fez santo Olho tua luz esplendor,
Nem pode vê-lo naquilo que moras,
De ti por nosso mal, meu grão desejo.

Como do fogo caldo, elas dividem,
Não posso belo eterno cada estima,
Que exaltar, onde ela vem, mas semelha.

E por dentro meu olho tudo paraíso,
Por retornar onde alma fez primeva,
Recorro ardendo sob os teus cílios.

17

Cruel, amargo, impiedoso imo,
Vestido de doçura e de amar pleno
Tua fé ao tempo nasceu, e dura menos,
Ao doce vernal não faz todas flores.

Movendo tempo e repartir-se horas,
Ao viver nosso péssimo veneno;
Como foice e não seja como feno
. . . . . . . . . . . . . . 8

A fé sendo curta e graça não dura,
Mas de par seco par que se consuma,
Como pecado de querer de meu dano.

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Sempre de nós fará com todos anos.

42

Fala-me da graça, Amor, se olhos tem,
Chegando ver dela beleza aspiro,
Se eu olho dentro quando me miro.
Vejo esculpido rosto que faz desta.

Tu hás de saber que tu vens com ela,
Tira minha paz onde eu me provoco,
Nem quero pequeno mínimo suspiro.
Nem meus ardentes fogos pedidos.

Beleza que tu vês é bem daquela,
Mas crescendo melhor que um local sal,
Se por que olhos mortais d´alma que corre.

Ali se faz divina honesta e bela,
Como igual duma tal coisa imortal
Nesta não aquela que olhos teus percorre.
TRAD. ERIC PONTY

Luis de Góngora y Argote - SONETOS - TRAD. ERIC PONTY

A Juan Rufo, de sua “Áustria”

Cantastes Rufo, já, tão heroicamente,
Daquele César, novo augusta história,
Que está duvidosa entre os dois glória,
E a qual se devas dar nenhum assento.

E assim Fama, que hoje de gente em gente,
Quer que dos dois a igual da memória,
Do tempo e do olvido haja duma vitória,
Uniu do louro a cada qual à frente.

Deveis com grande razão ser igualados,
Pois fostes cada qual único em sua arte,
Ele só em armas, vós em nas letras só.

E ao fim ambos igualmente ajudados,
Ele à espada do sangramento de Marte,
Vós desta lira do teu sagrado Apolo.

A Córdova

Ô excelso muro, Ô torres consumadas,
Da honra da majestade, da galhardia!
Ô grande rio, grande rei Andaluzia,
De areias nobres, já que não doiradas.

Ô fértil canto, Ô serras levantadas,
Que privilegia o céu e doira teu dia!
Ô da sempre gloriosa pátria minha,
Já tanto de plumas quanto destas espadas.

Se entre aquelas ruinas teu despojo,
Que enriquece Genil e Dauro banha,
Tua memória não foi alimento meu.

Nunca mereçam de meu ausente olhar,
Ver teu muro tuas torres teu rio,
Teu canto e serra, pátria, flor da espada!

Duma enfermidade de Dom Antônio de pazos, bispo de Córdova

Deste mais que a neve, branco touro,
Robusta honra que deste gado meu,
E destas aves dois, que ao novo dia,
Saúdam de havê-lo com o doce choro.

A ti ele mais rubro, Deus do alto coro,
Tuas estranhas faço oferenda pia,
Sobre este fogo, que vencido envia,
Teu fumo de âmbar e tua chama douro.

Porque a tanta saúde foi restituída,
O nosso sacro e douto pastor rico,
Que dum dos que ao nascer que estão em vão.

Já que das três coroas já neste unido
Ao menos do maioral do Tajo, e sejam
A Planta abrigo, arminhos a pelica.

Do Márquez de Santa Cruz

Não em bronzes, caducam, mortal mão,
Ô católico Sol dos gananciosos,
(que já entre gloriosos capitães
És a deidade armada, Marte Humano.)

Esculpirão maduros, senão vãos,
Quando descobrir queira tua fadiga,
E as bem que reportadas bandeiras,
Do Turco, do Inglês, deste Lusitano. 

Em um mar de tuas velas coroado,
Teus remos ao outro escarnecido,
Tábuas serão coisas já tão estranhas.

Da imortalidade ele não cansado,
Pincel os logre, sejam tuas rojadas
D´Alma do tempo, d´espada do olvido.

A Don Luís de Vargas

Teu (cujo ilustre dentre um outro muro,
De imperial cidade, pátrio edifício,
Ao Tajo olha em teu húmido exercício,
Pintar os campos e doirar vos a areia).

Marginaliza aquele Lauro boa hora,
Aqueles dois (já mudas de ofício),
Relíquias doces do gentil Salício,
Heroica lira, pastoral aveia.

Chegadas, Ô claríssimo mancebo,
Ao douto peito, da tua suave boca,
Punindo lei ao mar, do freio aos ventos.

Sucedeu todo castelhano Febo,
(Agora és glória muita terra pouca),
Na pátria, em profissão, em instrumentos.

Na morte de duas senhoras monjas irmãs naturais de Córdoba

Sobre as urnas de cristal tão lavradas
De vidro em pedestais tão sustentadas
Chorando estão ninfas já sem vidas,
O Betis em tuas húmidas moradas.

Tanta tua formosura Dele amá-las
Que ao que as demais ninfas doloridas,
Se mostram de teu terno fim sentidas,
Ele derramado lágrimas de cansadas.

- Almas – lhes disse – vosso voo santo,
Seguir penso até estes sacros ninhos,
Do bem se goza sem tremer contrário.

Que vista esta beleza em meu grão canto,
Pelo céu nós seremos convertidos,
Que de gémeas vós outras, já em Aquário.
TRAD. ERIC PONTY

LOPE DA VEGA E CARPIO - SONETOS - TRAD. ERIC PONTY

I

Versos Amor, conceitos esparzidos,
Argilosos da alma em meus cuidados,
Partos dos meus sentidos abrasados,
Com mais dor e liberdade nascidos.

Expostos este mundo em de que perdidos,
De tão rasgados audíveis trocados,
Que só donde fostes e já argilosos,
Estiveram por sangue conhecidos.

Pois do que furtais labirinto a Creta
Ao Dédalo dos altos pensamentos,
Á fúria do mar, as chamas do abismo.

Se aquele réptil formoso não aceita,
Deixas à terra, entretida aos teus ventos,
Que descansais em vosso centro mesmo. 

II

Quando imagino meus breves dias
Aos muitos que Amor tirano me deve,
E em meu cabelo antecipar a neve,
Mais que os anos, que tristeza minha.

Veio com suas falsas alegrias,
Veneno que em cristal à razão se bebe,
Por quem este apetite que se atreve,
Vestida de minhas doces fantasias.

Que ervas do olvido há dado para o gosto,
Á razão sem saber deste teu ofício,
Queres contra à razão satisfazer? 

Mas consolar-te pode meu desgosto,
Que és o remédio há quem eu me indico
É remédio de Amor queres vencer.

III

Cleópatra e Antônio ardoroso vinho,
Duas pérolas, quis dar maior grandeza,
Que por se mostrar forma natureza, 
De instrumento de Amor tão divino.

Por honrar seu amoroso desatino,
Que foi mostro no Amor, como beleza,
A primeira bebeu, de cuja riqueza,
Honrar pudera à urbe deste menino.

Mas não querendo a segunda Antônio,
Que já Cleópatra desfazer queria,
De dois milagres, reservou o segundo.

Ficou a pérola solta em testemunho,
Que não teve igual, até aquele dia,
Bela Lucinda que nasceste ao mundo.

IV

Era da alegre véspera do dia,
Que há sem igual que nasceu nesta terra,
Do cárcere mortal e de humana guerra,
Á Pátria de tão celestial saia.

E era idade que mais viva ardia,
o novo sangue em meu peito encerra,
(Quando do conselho e razão desterra,
A vaidade do que apetite guia).

Quando o Amor me ensaiou primeira vez,
De Luciana em seu sol os olhos belos,
Me abraçando como teu raio fora.

Doce prisão e do doce arder por eles,
Sem dúvida seu fogo foi minha esfera,
Que com ver-me morrer descanso deles.

V

Serviu Jacob os sete largos anos,
Breves, sem fim que aspereza fora,
A Lia que gozava, e Raquel espera,
Outros sete, chorando desenganos.

Assim guardam palavras os estranhos,
Porém efeito vive considera,
Que poderá gozar antes que morra,
E que tiveram fim os teus danos.

Aí daquela alma padecer disposta,
Que espera Raquel em tua outra vida,
E tendo em Lia para sempre esta.  

VI

Ao sepulcro de Amor, que contra fio,
Tempo fez Artemisa viver claro,
A torre belíssima que de Faro,
Um tempo destas naves luz e asilo.

Ao templo Efésio famoso estilo,
Colosso do sol, único tão raro,
Ao muro de Semíramis reparo,
E das altas Pirâmides do Nilo.

Enfim destes milagres inauditos,
A de Júpiter Olímpica ao templo,
Pirâmides, Colosso, Mausoléu.

E quantos hoje do mundo tem escritos,
A fama venceu de minha fé o exemplo,
Que é maior impressão que meu amor só.

VII

Isto que saúda são destas das fontes,
Os montes destes, estão na ribeira,
Onde vi do meu sol desta primeira,
Os belos olhos, desta serena frente.

Este é o rio humilde a corrente,
E está a quarta e verde primavera,
Que esmalta alegre campo e reverbera
No doirado Toro sol tão de ardente.

Árvores, já mudas tua fé constante,
Mas, do grande desvario, do plano,
Então monte o deixe sem qualquer dúvida.

Logo não será justo que se espante,
Que mude parecer ao peito humano,
E passando do tempo monte muda.

TRAD. ERIC PONTY

quinta-feira, fevereiro 08, 2018

Caderno de Nova York - José Hierro - PRELÚDIO - TRAD. ERIC PONTY

PRELÚDIO
Depois de mil, de milhões de anos,
Muito despois,
De que os dinossauros se extinguiram,
Chegava a este lugar
O acompanhavam outros como ele,
Erguidos como ele
(Como ele, provavelmente, algo com receios).
A partir de onomatopeias,
De monossílabos, gruídos,
Desenvolveu um sistema de sequências sonoras.
Poderia assim memorizar sucessos do passado,
De articular em suas adivinhações,
Pois o presente —ele o intuía— não começa nem finaliza
Em si mesmo, senão que é ponto de interseção
Entre o sucedido e o pelo suceder,
Chamado entre a madeira e a cinza.

Os sons domesticados nos diziam
Muito mais do que diziam
(Originavam círculos concêntricos
—como a pedra arrojada à agua—
Que se multiplicavam, se expandiam,
Se atenuavam até regressar a lisura e o sossego):
E todos percebiam sua essência misteriosa
Que não sabiam decifrar.

Com reverencia temerosa
Escutavam mensagens tão incompreensíveis
Como os da chama, a onda, o trono
(Talvez com a mesma inquietude com que escutamos ao doutor
Que diagnostica nosso mal
Utilizando tecnicismos nunca ouvidos,
De maneira que não sabemos
Se —impassível e professional—
É nossa morte o que anuncia
O é sendo à vida).

Nada se compreendeu então suas palavras.
Por isso andam, agora, as palavras,
Passando por entre ventos,
Ávidas de que alguém as recolhas
Séculos despois de pronunciadas.

E aqui estão aguardando que alguém as escute,
Aqui onde confluem Broadway e a Sétima Avenida.

Foi aqui onde ele me avistou,
Onde narrou a crónica
Deste instante em que estou evocam-no.
Aqui, entre anúncios luminosos,
Na cidade de Nova York.
TRAD.ERIC PONTY

Juan Gelman - 2 POEMAS - TRAD. ERIC PONTY

MADRUGADA

Jogos do céu molham a madrugada da cidade violenta.
Ela respira conosco.
Somos os que incendiamos o amor para que esse dure,
Para que sobreviva a toda solidão.
Temos queimado o medo, temos olhado de frente a frente a dor
Antes de merecer esta esperança.
Temos aberto as janelas para dar-lhe mil rostos.

AS FÁBRICAS DO AMOR

I
E construí teu rosto.
Com adivinhações do amor, construí em teu rosto
Nos longínquos pátios da infância.
Alvanéu com vingança,
Eu me ocultei do mundo para falar tua imagem,
Para dar-lhe a voz,
Para pôr doçura em tua saliva.
Quantas vezes temi
Apenas se acobertar pela luz do verão
Enquanto te descrevia por meu sangue.
Pura minha,
Está feita de quantas estações
E tua graça descende como quantos crepúsculos.
Quantas de minhas jornadas inventarão tuas mãos.
Que infinito de beijos contra a solidão
Fundi teus passos no pó.
Eu te oficializei, te recitei pelos os caminhos,
Escrevi todos teus nomes ao fundo de minha sombra,
Lhe falei dum lugar em meu leito,
Te amei, estrela invisível, noite a noite.
Assim fui que os que cantaram os silêncios.
Anos e anos trabalhei para fazer-te
Antes de ouvir um só som de tua alma.
TRAD.ERIC PONTY

Insônia - Dámaso Alonso - TRAD. ERIC PONTY

Madrid é uma cidade de mais de um milhão de cadáveres (segundo as últimas estadísticas).
Às vezes na noite eu me remexo e me incorporo neste ninho no que faz 45 anos que me apodreço,
E passo largas horas ouvindo gemer do furacão, o ladrar dos cachorros, o fluir brandamente à luz da lua.
E passo largas horas gemendo como o furacão, ladrando como um cão enfurecido, fluindo como o leite do úbere quente duma grande vaca amarela.
E passo largas horas perguntando à Deus, perguntando por que se apodrece lentamente em minha alma,
Por quê se apodrecem mais dum milhão de cadáveres nesta cidade de Madrid.
Por quê mil milhões de cadáveres se apodrecem lentamente no mundo.
Diga-me, em que horto quer abonar com nossa podridão?
Temendo que se te sigam os grandes rosais do dia,
As tristes açucenas letais de tuas noites?
TRAD. ERIC PONTY

Miguel de Cervantes Saavedra - Sobre enamorar-se - TRAD. ERIC PONTY

A casa dos céus e selvas de Ousadia
Terceira jornada
REINALDOS:
Que não quer aparecer,
Ô bem, por mim mal perdido?
Havendo visto, pastor, acaso,
Por entre esta espessura,
Um milagre de formosura
Por quem eu mil mortes passo?
Haja visto uns olhos belos
Que duas estrelas assemelham,
E um dos cabelos que deixam,
Por serem ouro, serem cabelos?
Havendo visto, a dita, duma frente
Como de espaçoso ribeiro,
E uma fileira outra fileira
Das ricas perolas de Oriente?
Diz-me si haja visto uma boca
Que respira odor sabei-o,
E uns lábios por quem creio
Que o fino coral se apouca.
De si havendo visto uma garganta
Que seja coluna deste céu,
E dum branco peito de yelo,
Do seu fogo Amor se quebra;
E umas mãos que são fechas
Em torno do marfim branco,
Dum composto que é branco
Do Amor desponta suas flechas.

CORINTO:
Tendo, pelo dito, senhor,
Umbigo que se aqueça quimera,
Os pés de barro, como era
Á daquele rei Dom Senhor?
Porque, ao dizer-te verdade,
Não hei visto nestas montanhas
Coisas tão ricas e estranhas
E de tanta qualidade
E sendo mui fácil coisa,
Se elas por aqui vissem,
Por invisíveis fossem
Vê-las em minha vista curiosa.
Que dum espaçoso ribeiro,
Duas estrelas e um tesouro
De cabelos, que são doiro,
Onde esconder-se poderia?
E ao sabe-lo odor que falas,
Não me levará atrás de si?
Porque em minha vida senti
Catarro em meus narizes.
Mas, enfim, dizer-te quero
O que hei falado, não sendo terceiro.

REINALDOS:
Que são? Me diga.

CORINTO:
Três pés dum porco
E umas das mãos de carneiro.

REINALDOS:
Ô Que de puta, velhaco!;
Pois, com Reinaldos de enganas?

CORINTO:
Das minhas doações se enganas
Sempre de tais prêmios que retiro.
TRAD.ERIC PONTY

François de Malherbe - SONETOS - TRAD. ERIC PONTY

CXXIII - POUR MONSEIGNEUR LE CARDINAL DE RICHELIEU 

As pessoas, que são incensos; pessoas, que das vítimas,
Deste grande Cardeal, grande Chefe de Obra ambos,
Quem tem apenas glória, não sejas ambição,
Fazer morrer na insolência destes teus crimes.

Com que lhes é servidor desvelo magnitude,
Ou são espíritos lavram, fazem velar olhos,
Que enganam ao conluio de nosso sedicioso,
Que se sujeitam tua fúria legítimas mãos?

O mérito de um homem, ou sábio, ou guerreiro,
Encontrar  recompensa nos chapéus dos louros,
Cuja vaidade grego atribuiu teus exemplos.

O eu, atrevo a dizer, é tão alta de tão alta,
É como nosso Deus sem lugares nos templos,
Tudo podes fazer a ele é menor não deves.

cv - A MONSIEUR DE LA MORELLE, SUR LA PASTORALE DE L'AMOUR CONTRAIRE

Se um podes adquirir a plumas desta glória,
De uns mais belos espíritos que é do universo,
Quero abandonar-vos, julgo filhas-memória,
Na graça que se diz teus  amorosos versos:

E parece que neles há vistosa história,
Da travessia de  amor acasos mais diversos,
Dum discurso perfeito à todos fazem crer,
Que é prosa é nada na perda dos belos versos.

Quando eles guardam verem o assunto encantado,
Doutamente retrata, de tão dignamente,
Sem dúvida eles vão dizer-vos, qual eu penso.

Que por favorecer homens e dos seus deuses,
E purgar ignorantes tudo que viste ambos,
Ele faças na união por meio tua eloquência.

AO MONSEIGNEUR PAI DO REI

Musas, quando findar esta longa remessa,
Para satisfazer Gaston, a notar sobre ele?
O desvelo do qual se tem glória dos outros,
Que podeis ser melhor servidor bela dama?

E neste desgraçado século um se engane,
Qualquer um lhe ofereça algo para seu tédio,
Miserável novena, onde irá ser o apoio,
Se ele não apertar mão, há quem nem favoreceu.

Creio bem o medo ousar mais que não se deve,
E, das dificuldades de obreiro arrogante,
Remover vos desejo que a força lhe deste.

Mas tanto belo objeto a cada dia acrescido,
Já que idade tão jovem que coleção espanta,
Como irás fornecer quando tiver vinte anos?

LXXIX - POUR LE MARQUIS DE LA VIEUVILLE

É verdade, Vieuville, e quem quer que lhes negue,
Condene impunimente o bom gosto meu rei;
Nosso dever altares com sincera fé,
Cuja vossa destreza disputa a mania.

Desvelo laborioso teu tão livre gênio,
Que fora da razão não sagaz ponto a lei,
Pondo fim as desgraças que atraiu após si,
Duma profusão nossa terrível mania.

Todos com que as virtudes restam desejar,
Estes que graça espírito deseja honrar,
E quem eternidade tua musa lhes imprima.

Eu bem que no desígnio que minha alma forma,
Mas eu sou generoso, e tenho desta máxima,
Que ele não deve ser prezado não se é amado.

LXXVIII - Ao Rei - Soneto -

E que de valor nulo dum outro segundo,
E que só tão fatal como de nossas curas,
Dê coragem parede verde da sessão,
Nossa ilhota consiga à paz terra sobre onda.

Que hidra da França fez-se em revoltas fecundas,
Nós sermos todos da morte não há mais da poção,
Certa felicidade que justa razão,
Promete da tua fronte da coroa do mundo.

Mas que em tão belos fatos me quer testemunho,
Reconheça meu Rei que este é auge desvelo,
Que de tua obrigação, tenhas chaves destinos.

Todos sabeis louvar, mas não tão igualmente,
Obras comuns que vivem perto de alguns anos;
Isto que de Malherbe escreveu sejas eterno.

XXX - Soneto -

Beleza, da qual graça surpresa natura,
Equivocasse, pois cedi a injuria da sorte,
Eu ao abandonar-vos, tão longe de seu porto,
Em partir com vontades dos ventos jornada.

Eu neste tédio grande ao qual me faz sofrer,
É a única razão que me impediu da morte,
E dúvidas que eu tinha fazem último ânimo,
Não sendo mal-empregado um imo duro. 

Calista, estás a pensar? O que a fez acanhada?
Irá resolver para não ater o desprezo,
Quem da minha paciência indigna se demonstra.

Mas, ô de meu erro estranho qual se faz inova;
Eu lhes desejo doce, e, no entanto, confesso,
De quem eu devas minha saúde à crueldade.

XXVIII - soneto -

Nada és tão belo como Calista é luxuosa,
É uma obra à natureza onde fez todo esforço,
E a nossa idade é ingrata olhar tantos tesouros,
Senão se eleves glória meu ferrete eterno.

A limpidez tua tez não é coisa mortal;
Que do bálsamo é tua boca, e a rosa irreal;
Tua palavra e tua voz ressuscitam  os mortos,
E, a arte não se semelha doçura natura.

Brancura em tua garganta deslumbra os olhares,
Que são o amor em teus olhos, embebeu tuas setas,
Sendo feito ao perceber , um visível milagre.

Nesta cifra infinita de graças e encantos,
O que quer dizer, minha razão? Crida ao crível,
Havido julgamento e adorá-la passar-vos?

Ao Rei Henri, O Grande

O meu Rei, se é um, bem para as futuras coisas,
Que na Escola de Apolo aprendeu-se à verdade,
Que ordem maravilhosa grandes aventuras,
Tua ida se satisfaças no louro porvir.

Aos que jovens leões vão juntar a sua presa!
Que quer margem de Tage de agouro batalhas,
E que desejou Oriente mantido em teu império,
Por querer reconstruir as muralhas de Tróia.

Irão ser desgraçados em somente um ponto;
É que se à tua coragem com fortuna unida,
Fáceis desconfiar de um e de um outro hemisfério.

À tua glória é tão grande na boca de todos,
Que sempre irá ser dito não poderás ao menos,
Que eles já se declarem à honra ser vencidos.

A MADAME LA PRINCESSE DOUAIRIÈRE 
CHARLOTTE DE LA TRIMOUILLE


O que, grande Princesa de adorada terra,
E que mesmo que céu é cingido a lhe admirar,
Vós resolveste a ver-nos nosso conviver,
Em uma obscuridade eternal duração.

A Flama de vosso olho onde coração chispa,
É da rara virtude não dás nada optar,
Assim, não nos cansei de nosso desespero,
A driblar vontade dela que és desejada?

Vosso ser lugar, onde há sempre verdes campos.
Por que nunca tiveram, mas invernos cálidos,
Pareçam que aparência possui quaisquer méritos.

Mas, assim, fez da causa: De que nossas lágrimas.
São sendo fazer caso tão pequena coisa.
Há quem cada instante dá causa de mil flores?

XCII - Sobre a morte de seus filhos

Que meus filhos perderam teus restos mortais,
Um filho foi bravura que eu amei mais forte,
Eu nem imputei ponto da injúria da sorte,
Pois que ao findar um homem é coisa natural.

E mais que dois velhacos, surpresa infiel,
Ter terminado dias duma trágica morte,
Nessa minha dor não tem um lugar conforto,
Todos meus sentimentos estão acordo ela.

Ô meu Deus, Salvador, pois que para razão,
A desordem do meu coração faz sem cura,
O véu dessa vingança este véu é legítimo.

Fizesse que do tom prova eu seja avigorado,
Tua justiça conviva, e, aos autores do crime,
São filhos do carrasco tem crucificado.
TRAD. ERIC PONTY
POETA,TRADUTOR,LIBRETISTA ERIC PONTY