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quinta-feira, fevereiro 08, 2018

Caderno de Nova York - José Hierro - PRELÚDIO - TRAD. ERIC PONTY

PRELÚDIO
Depois de mil, de milhões de anos,
Muito despois,
De que os dinossauros se extinguiram,
Chegava a este lugar
O acompanhavam outros como ele,
Erguidos como ele
(Como ele, provavelmente, algo com receios).
A partir de onomatopeias,
De monossílabos, gruídos,
Desenvolveu um sistema de sequências sonoras.
Poderia assim memorizar sucessos do passado,
De articular em suas adivinhações,
Pois o presente —ele o intuía— não começa nem finaliza
Em si mesmo, senão que é ponto de interseção
Entre o sucedido e o pelo suceder,
Chamado entre a madeira e a cinza.

Os sons domesticados nos diziam
Muito mais do que diziam
(Originavam círculos concêntricos
—como a pedra arrojada à agua—
Que se multiplicavam, se expandiam,
Se atenuavam até regressar a lisura e o sossego):
E todos percebiam sua essência misteriosa
Que não sabiam decifrar.

Com reverencia temerosa
Escutavam mensagens tão incompreensíveis
Como os da chama, a onda, o trono
(Talvez com a mesma inquietude com que escutamos ao doutor
Que diagnostica nosso mal
Utilizando tecnicismos nunca ouvidos,
De maneira que não sabemos
Se —impassível e professional—
É nossa morte o que anuncia
O é sendo à vida).

Nada se compreendeu então suas palavras.
Por isso andam, agora, as palavras,
Passando por entre ventos,
Ávidas de que alguém as recolhas
Séculos despois de pronunciadas.

E aqui estão aguardando que alguém as escute,
Aqui onde confluem Broadway e a Sétima Avenida.

Foi aqui onde ele me avistou,
Onde narrou a crónica
Deste instante em que estou evocam-no.
Aqui, entre anúncios luminosos,
Na cidade de Nova York.
TRAD.ERIC PONTY

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