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sábado, fevereiro 10, 2018

LOPE DA VEGA E CARPIO - SONETOS - TRAD. ERIC PONTY

I

Versos Amor, conceitos esparzidos,
Argilosos da alma em meus cuidados,
Partos dos meus sentidos abrasados,
Com mais dor e liberdade nascidos.

Expostos este mundo em de que perdidos,
De tão rasgados audíveis trocados,
Que só donde fostes e já argilosos,
Estiveram por sangue conhecidos.

Pois do que furtais labirinto a Creta
Ao Dédalo dos altos pensamentos,
Á fúria do mar, as chamas do abismo.

Se aquele réptil formoso não aceita,
Deixas à terra, entretida aos teus ventos,
Que descansais em vosso centro mesmo. 

II

Quando imagino meus breves dias
Aos muitos que Amor tirano me deve,
E em meu cabelo antecipar a neve,
Mais que os anos, que tristeza minha.

Veio com suas falsas alegrias,
Veneno que em cristal à razão se bebe,
Por quem este apetite que se atreve,
Vestida de minhas doces fantasias.

Que ervas do olvido há dado para o gosto,
Á razão sem saber deste teu ofício,
Queres contra à razão satisfazer? 

Mas consolar-te pode meu desgosto,
Que és o remédio há quem eu me indico
É remédio de Amor queres vencer.

III

Cleópatra e Antônio ardoroso vinho,
Duas pérolas, quis dar maior grandeza,
Que por se mostrar forma natureza, 
De instrumento de Amor tão divino.

Por honrar seu amoroso desatino,
Que foi mostro no Amor, como beleza,
A primeira bebeu, de cuja riqueza,
Honrar pudera à urbe deste menino.

Mas não querendo a segunda Antônio,
Que já Cleópatra desfazer queria,
De dois milagres, reservou o segundo.

Ficou a pérola solta em testemunho,
Que não teve igual, até aquele dia,
Bela Lucinda que nasceste ao mundo.

IV

Era da alegre véspera do dia,
Que há sem igual que nasceu nesta terra,
Do cárcere mortal e de humana guerra,
Á Pátria de tão celestial saia.

E era idade que mais viva ardia,
o novo sangue em meu peito encerra,
(Quando do conselho e razão desterra,
A vaidade do que apetite guia).

Quando o Amor me ensaiou primeira vez,
De Luciana em seu sol os olhos belos,
Me abraçando como teu raio fora.

Doce prisão e do doce arder por eles,
Sem dúvida seu fogo foi minha esfera,
Que com ver-me morrer descanso deles.

V

Serviu Jacob os sete largos anos,
Breves, sem fim que aspereza fora,
A Lia que gozava, e Raquel espera,
Outros sete, chorando desenganos.

Assim guardam palavras os estranhos,
Porém efeito vive considera,
Que poderá gozar antes que morra,
E que tiveram fim os teus danos.

Aí daquela alma padecer disposta,
Que espera Raquel em tua outra vida,
E tendo em Lia para sempre esta.  

VI

Ao sepulcro de Amor, que contra fio,
Tempo fez Artemisa viver claro,
A torre belíssima que de Faro,
Um tempo destas naves luz e asilo.

Ao templo Efésio famoso estilo,
Colosso do sol, único tão raro,
Ao muro de Semíramis reparo,
E das altas Pirâmides do Nilo.

Enfim destes milagres inauditos,
A de Júpiter Olímpica ao templo,
Pirâmides, Colosso, Mausoléu.

E quantos hoje do mundo tem escritos,
A fama venceu de minha fé o exemplo,
Que é maior impressão que meu amor só.

VII

Isto que saúda são destas das fontes,
Os montes destes, estão na ribeira,
Onde vi do meu sol desta primeira,
Os belos olhos, desta serena frente.

Este é o rio humilde a corrente,
E está a quarta e verde primavera,
Que esmalta alegre campo e reverbera
No doirado Toro sol tão de ardente.

Árvores, já mudas tua fé constante,
Mas, do grande desvario, do plano,
Então monte o deixe sem qualquer dúvida.

Logo não será justo que se espante,
Que mude parecer ao peito humano,
E passando do tempo monte muda.

TRAD. ERIC PONTY

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