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domingo, agosto 31, 2025
UMA GLOSA AS FLORES DO MAL DE WLADIMIR SALDANHA - ERIC PONTY
sábado, agosto 30, 2025
Canção Suave - Poema Belga - FERNAND SEVERIN - Trad. Eric Ponty
"Um sopro soprou; no lustre se apagou:
À noite, azulada e tépida, entra com tua languidez.
Um canto de ave distante, triste qual um lamento,
Que surge, às vezes, na paz de meu coração.
Como é bom estar no mundo! E amar! E ouvir
Uma confissão roubada responder às tuas confissões...
Coroei tua testa com uma frágil e terna faixa;
As lágrimas da noite tremem em teus cabelos.
Aproxime-se... O amor tem essas palavras supremas
Que não são envoltas a menos que sejam ditas suaves.
Veja, minha querida filha, eu sei que tu me amas,
Mas minha alma, sem elas, não sentiria isso.
Mais perto, mais perto de mim! Tudo ainda nos afasta!
Que um suspiro, respiração, um arrepio menos discreto
Me dê essa confissão que as palavras ignoram:
Só será tão doce ao preço de tal segredo.
Ó minha filha! Os mortos que dormem sob a terra
Perderam tudo, sem dúvida, com o surgimento do dia...
Mas nada aflige tanto teu sonho ermo
Do que o alvitre desse momento de amor.
Eu amo-a... Nesta noite, clara com opalas,
Onde a lua nasceu tão só, e tão trêmula,
As flores que matam, lindas e pálidas.
Emaranhar em tua cabeça com flores que o fazem sonhar.
Achamos que estamos unidos, e o amor tem asas!
Oh, fale, fale outra vez! Deixe-me ouvir tua voz,
Vaga, alada, infantil, onde as vogais cantam,
Morrendo no ar noturno dum som de oboé distante.
Prolongue tua doce ressonância para sempre!
Foi teu coração que soou naquele timbre dourado e fresco.
Vá dormir.... Eu ouvirei o canto no silêncio.
Todas aquelas confissões advindas, cujo eco ainda vibra.
... Um sopro soprou; a lâmpada se apagou:
À noite, azulada e tépida, entra com tua languidez.
Um canto de pássaro distante, triste qual um lamento,
Surge, às vezes, na paz de meu coração.
FERNAND SEVERIN - TRAD. ERIC PONTY
ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA
O Beijo - Théodore de Banville. - Trad. Eric Ponty
Tendo assistido a todas as apresentações realizadas no teatro do Parc pela trupe do Théâtre Libre, conseguimos reconstituir toda uma cena de O Beijo, a requintada peça INÉDITA de Théodore de Banville. O mestre nos perdoará esse roubo de... memória, sabendo o quanto esse fragmento de sua obra-prima será apreciado pelo nosso público letrado.
Pierrot acaba de dar a Urgële o beijo que lhe devolve a juventude e a beleza:
PIERROT
Céu e Terra! Que metamorfose é essa?
Ó cabelos macios! olhos cintilantes! Boca rosada!
Oh, como você foi bom em pedir minha ajuda!
Diga-me, quem é você, belo demônio,
Linda rainha, enfeitada com fogo e pérolas,
Estrela, raio, flor, estrela?
A URGËLE
Eu sou a fada
Urgele. Um encantador que me cortejou,
Para me punir por ter rejeitado teu amor,
Me transformou em uma velha terrível.
Mas eu renasci com minha beleza. Eu acordei.
Sim, a maravilha tão louca amarga, tão atroz
Cruel, não existe mais; e eu lhe agradeço.
Borboleta, minha prisão fúnebre está sendo despedaçada,
Não sou nada além de alegria, orgulho, esperança e um sorriso;
Pois no musgo verde e nestes bosques dispersos,
Teu beijo me fez jovem outra vez, e eu estou indo embora!
PIERROT
Obrigado, senhora, acho que sim,
fazendo um grande sacrifício e assentar em grandes despesas.
E... você está indo embora? Como me disse isso?
Dorc, depois de Jouvence ter se precipitado sobre ti,
Estás indo embora! ah, vamos rir dessa zombaria.
Seria pura e simples fraude,
Em suma, um daqueles roubos que
Nas lojas de departamentos do Louvre,
Uma fraude certamente muito intencional,
Que o levaria direto ao tribunal!
"Vou embora!"n - E tu achas que eu ficaria feliz!
Não, senhora, eu dei um bom beijo em dinheiro,
A dívida é clara. Teria até parecido óbvio
Para o século que cantou Beatrix - e viu Dante!
Minha dívida é líquida, e para que tu possas me pagar
Pague-me, enviarei os oficiais de justiça, se imperioso.
Eu tenho direito a um beijo. - Não fuja agora,
Senhora! - Não no final do dia, mas agora mesmo.
A URGËLE
Se isso é tudo o que é preciso para me acalmar,
Bem, Pierrot, eu lhe devolverei teu beijo.
PIERROT
Um beijo! É o aceitável para a minha cara de puta!
E o que quer que eu faça com ele, Madame?
Vá até o deserto e lhe dê um presente,
Um copo de água para esfriar tua areia ardente,
E quando Rothschild, que pode comprar o Grande Urso,
Mergulhando na grande inundação chamada Bolsa de Valores,
Explorar a parte de baixo desse oceano de ouro,
Desinteresse-o, madame, com dois francos!
Pergunte aos brilhantes autores, Alphonse, Emile,
Se eles se contentariam em se vender por vinte mil,
Ofereça açúcar aos lobos para domá-los,
Mas não me fale, Madame, de um beijo!
Pois estou com muita fome, desde a sua metempsicose,
Para me contentar com tão pouco.
A URGËLE {senta-se)
O que você quer?
PIERROT
Eu quero tudo.
A URGËLE
Desculpe-me por isso!
PIERROT
Uma hidra se instala em meu peito ardente.
Sim, eu quero tudo, quero teus braços, teus olhos, teus lábios,
Todos os bens, todos os valiosos tesouros que derramas sobre mim!
Sim, tudo. E o resto. Estamos falando de um beijo!
Minha inocência está por fim pôr-se a pesar sobre mim,
E embora eu seja Pierrot, não sou menos homem,
Em alguma macieira uma maçã deve amadurecer!
Eu quero mordê-la.
A URGËLE
Oh, que lindo! O que sua mão está fazendo aí?
PIERROT
Estou apalpando teu vestido, o tecido é bom.
A URGËLE (levanta-se)
Amanhã
Nós conversaremos
PIERROT
Que tal amanhã? Não. Sozinho com teus encantos.
Estou gritando. Este grande bosque está livre de gendarmes.
Temos bosques expressamente para o nosso recinto,
E este teto de folhagem abafa nossos soluços.
Beijarei teus braços, apesar de teu sorriso,
Madame, em menos tempo do que levo para escrever isso.
Este é o momento de tomá-la e possuí-la.
E, se eu tiver que falar franqueado, quero bordar
Muitas variações sobre esse tema.
Venha comigo agora.
A URGËLE
Ouça, Pierrot, sinto que amo você.
Théodore de Banville. - Trad. Eric Ponty
ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA
Poemas Belgas - Trad. Eric Ponty
Esse é o fim do amor casto, esse sol quente
Que se vai sempre nas profundezas da memória
A triste lembrança, numa mancha negra,
Para aqueles olham por uma era fantasma corado.
Melhor do que tu, fane insensível e zombeteiro,
Irônico sol extinto que me cegou,
Minha pálida amante cá fulgura meus olhos cansados,
E sua alma tem pra mim doçura duma luz noturna.
Exatamente o que um convalescente precisa,
Pois seu amor é como a lâmpada, deslizando
Por meio de tua palidez de alabastro, um raio bruno;
O mesmo acontece comigo, quando sonho,
Teu rosto branco emerge das sombras,
Sob a luz de teus cílios, o fogo de teu olhar!...
GEORGES RODENBACH.
TRILHAS DE MAIO
Ao pé dos troncos nodosos dos carvalhos antigos
A sombra dorme, embaçando as passagens
Onde o sol de maio lança um brilho vivo.
O amor desperta, irrita os pombos-torcazes
E persegue os tentilhões que riem nos galhos
Onde o aroma perturbado das roseiras se chega.
As virgens da sempre-viçosa vestiram vestidos alvos
E sob os velhos carvalhos saem, grupos barbudos,
Para coroar testas puras com ramos de pervinca.
Entre os cantos de pássaros amorosos,
sussurrando as palavras do jovem Éves,
Eles perdem teus passos nas passagens ocas.
Nos imos das passagens consumidas, canta o ardor da seiva.
FRÉDÉRIC BATAILLE.
Scapin
Scapin está arrebatado tão-só pelo ar e pela luz.
Počte à maneira do sutil Arlequim.
Ele belisca galante um casaquin nas sombras
Sabendo o preço de uma rosa trêmière.
Fez do céu azul teu burgo, tua casa de campo:
Uma estrela é uma tocha pra esse feliz malandro
Que não tem outro aviso a não ser jazer um patife,
Orgulhoso e sempre em tua primeira verve.
Ele consegue dormir quando sente sono:
Ele nunca sonha, exceto com a luz do sol,
De garrafas bem cheias e garotas alegres.
Scapin, acima de tudo, aos nossos olhos, torna bom,
É tua boca faminta e teu nariz vivo,
Uma mistura distraída de palhaço e salteador.
ALFRED POUTHIER.
Bem, sim, é isso mesmo! Não o aceito muito bem,
Mas já vi o aceitável para suportar a ternura;
Pois teu olhar, perfurando minha carne com destreza,
Chegou ao meu peito qual um peido de pântano.
Sim, estou louca enlevada e vou lhe dizer por quê;
Estou enfeitiçada por essa trança loira
Que, qual serpente dourada, me enviou tua carícia:
Quando o vi um dia em teu terno azul!...
E, desde então, sempre estive sob tua janela,
E quero conhecer teu peito e teu corpo,
E estendo meus braços quando me deito na cama à noite!
Porque, sem tê-lo seduzido ainda, posso lhe adivinhar,
Assim tal qual se pode adivinhar - sem ver - o cheiro fino
Que jaze nas dobras nevadas de teu lenço!...
Trad. Eric Ponty
ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA
sexta-feira, agosto 29, 2025
A VIRGEM COM TARASQU - Albert Giraud - Trad. Eric Ponty
PARA WLADIMIR SALDANHA
Como tradutor, em 2014 participou da reedição de A cinza do Purgatório, de Otto Maria Carpeaux, pela Editora Danúbio, de Santa Catarina, tendo ficado responsável por verter autores simbolistas de língua francesa. Colabora com a revista francesa Actualité Verlaine mantida pela Association des Amis de Verlaine (Metz, França). Traduziu As Flores do Mal Uma tradução inédita feita pelo poeta Wladimir Saldanha, que revela toda a sofisticação, musicalidade e beleza do francês original. O livreto "Meu coração a descoberto", uma reunião de anotações, aforismos e reflexões de Baudelaire em prosa.
A Léon Varienne.
Esta noite, o velho castelo acorda: o mestre,
Se vestido em tuas melhores roupas encarnadas,
Seu papagaio em punho, encostado na janela
Resmunga alegremente com teus paladinos.
Toda a sua corte balbucia e dança ao teu lado:
Galgos erguem seus olhos humanos pra ele,
E seu anão, para encher teu cofre, em cadência,
Peregrina pelos jardins em tuas mãos.
E nas árvores azuis, parodiando as rainhas
Macacos trepadores que muito pequenos,
Para desabafar enxaquecas irônicas,
Martirizar caudas formam leque dos pavões.
No topo da torre, soam fanfarras alegres
Que irrompem das dobras boas bandeiras rubras,
Cuja rede é torcida em rajadas sedosas
Sob o vento forte que brincar com o sol.
Mestre se ergue de repente e dedos finos,
Apontam para a areia dourada da encosta,
Uma procissão distante de bispos e príncipes
Vindo em direção ao castelo na paz da noite.
Aquela que vê ali, esguia entre as palmeiras,
Orgulhosa qual espada, em tua bainha douro,
E cujos pés calmos os mendigos se beijam,
É Tiphaine, a única filha do velho rei.
Um dia, deixando doce burgo de infância,
Mulheres na roda de fiar, as flores, seu cravo,
Ela partiu, em um sonho, tão desamparada,
Só, com peito inchado por estranho propósito.
Ela voltou, pálida muito de alegria,
Pensativa, conduzir chefia ao burgo pavimentado,
Com o leve capricho de um fio de seda,
O deslumbrante monstro domado por ela:
O tarasque, a fera assustadora e voraz,
abrindo-se entre pêlos iguais a cílios,
Por meio das fendas vivas de armadura negra
Inúmeros olhos de ouro, opala e berilo.
Macacos afáveis soltam os fiéis pavões;
O bobo da corte cai de pé com espanto;
O papagaio do rei voa para longe,
E o mestre, latindo para longos galgos,
Do alto de tua sacada, ele se inclina,
apoiado pelo colorido coro dos valentes,
Ele desmaia de alegria, e em barba alva
Com braços abertos, ele chora alegremente.
O tarasque brilha, se estende e se exibe,
Abismando o chão com reflexos iridescentes,
E com um ar lânguido lambe as mãos de quem
Conduz em uma coleira até o fim de teus beijos.
E entre os ramos, gritos e canções festivas,
Os sinos de prata chovendo campanários,
Tiphaine lentamente nas costas da besta
Que orgulhosa fazendo o sinal da cruz.
Mas a virgem hesita: um fogo fatal
Acende-se forte em teus olhos de outro mundo
Com teu prisma ampliado
Qual câncer azul corroendo tua carne jovem.
E, no céu, sangrando e doente de glória,
Permutando nadadeiras com flâmulas triunfos,
Só os anjos da noite sabem o que é vitória
Na crista das torres choram os olifantes.
Albert Giraud - Trad. Eric Ponty
ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA