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sábado, dezembro 13, 2025

ZEUS - Albert GIRAUD - TRAD. ERIC PONTY

Sob a coroa de um bando de águias imóveis,
Com grandes olhos fechados para um sonho eterno,
Zeus contém em seu seio todos os deuses inúteis 
E sozinho preenche o abismo deslumbrante do céu.

Desde sempre ele dorme seu sono solitário, 
do qual nada no futuro o despertará: 
Ele rola em sua noite os sóis e a terra,
sonhando com tudo o que foi e tudo o que será.

Nosso orgulho enlouquecido durante uma breve hora
Crê agir e se esgota em gestos decepcionantes: 
A ação tão alardeada, ó vertigem! É um sonho
Inspirado por seu sonho em sonhos vivos.

O desejo de criar que corrói nossa alma
É apenas um jogo de seu sonho sem fim,
criou a obra de beleza que sonhamos,
O sonho impassível desse sonhador divino.

Albert GIRAUD - TRAD. ERIC PONTY

   

ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA 

segunda-feira, dezembro 08, 2025

ELEGIAS A CASA DA MINHA MÃE - Marceline Desbordes-Valmore - TRAD. ERIC PONTY

 IN MEMORIAN D. RISOLETA NEVES

 Casa do nascimento, ó ninho, doce recanto do mundo!
Ó primeiro universo, onde nossos passos se voltaram!
Quarto ou céu, cujo coração guarda o mapa-múndi,
no fundo do tempo vejo o teu limiar abandonado.
Partirei cega e sem guia até à tua porta,
para tocar o berço nu que se dignou a alimentar-me.
Se eu ficar velha e fraca, que me levem até lá!
Não pude viver ali quando criança, mas gostaria de morrer ali,
caminhar em nosso pátio onde crescia um pouco de grama,
onde a aves de nossos telhados descia para beber e depois,
para deitar seus filhotes, bicava o humilde feixe,
entre as pedras azuis molhadas pelo grande poço!
Com tua frescura distante, ele ainda lava minha alma,
do presente que me queima, ele apaga a chama,
esse poço largo e dormido com cristal recluso
onde minha mãe banhava seu filho amado.
Quando ela embalava o ar com tua voz sonhadora,
quando ela estava calma, alva e pacífica à noite,
saciando a sede do pobre sentado, como se acredita ver
nos riachos da Bíblia uma lavadeira fresca!
Ela tinha sotaques de amor harmonioso    
que eu bebia com o peito enquanto brincava no pátio.
Céu! De onde vem a voz de uma mãe que canta
para ajudar o sono a descer ao berço?
Deus botou mais graça no sopro de um riacho?
É o Éden reaberto ao seu hino comovedor,
deixando no coxim da criança que dorme,
nascer todos os sóis que lhe ocultam a morte?
E a criança adormecida, sob essa alma velada,
reconhece os sons de uma vida passada?
É um cântico aprendido ao partir do céu,
onde a demitida de um jovem anjo deitou um pouco de mel?
Obrigado, meu Deus! Obrigado por este hino profundo,
ainda chorando em mim entre as risadas do mundo,
enquanto me sento em algum canto sonhador
para ouvir minha mãe, ouvindo meu coração:
esse distante adeus de sua alma à minha alma
sustenta, ao ressoar, minha fraqueza de mulher;
qual ao junco que se inclina com a brisa em teu curso
dizes-te: “Não caia! Eu venho em teu socorro.”
Ela tornou meus joelhos flexíveis à oração.
Aprendi com ela, Senhor, de onde vem a tua luz,
quando divertia meus olhos vendo brilhar os olhos dela,
que só deixavam minha fronte para falar com os céus.
Na hora do trabalho que fluía plena e pura,
eu cria que as mãos dela regiam a natureza,
instruída por Cristo, inclinada à tua voz,
que ela ouvia em oração e com a face prostrada.
Eu realmente cria nisso! E com uma fé tão terna
que me semelhava ouvir Cristo na parede:    
eu via visivelmente que, qual mulher, ela se curvava a Deus,
mas minha mãe, depois dele, ensinava isso em todos os lugares.
O sol ardente de junho que ria no quarto,
a lareira cujos clarões iluminavam dezembro,
os frutos, os trigos em flor, minha noite fresca.

Marceline Desbordes-Valmore - TRAD. ERIC PONTY

 ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

sexta-feira, dezembro 05, 2025

TRISTAN CORBIÈRE – TRADUÇÕES ERIC PONTY

 AOS FILHOS DO SACRIFÍCIO – ISAAC


Uma vez que não é permitido neste país livre,
Que, no entanto, foi a França e ainda pretende sê-lo,
Falar livremente de um homem livre e senhor
De si mesmo, de um cidadão, de um artista, - obedeça,

Então, ao monstro analfabeto e hediondo, spahi,
Que, no entanto, com suas retrocessões, te fez renascer
E, apesar de ti, fez nascer da sua boca costurada
Por três dedos de raki, campos de mortos espantados.

Uma vez que ele não sobreviveu a essa honra perdida
E, além disso, que sobrevivência poderia ser
Para aquela que permanece França, mas Aparência,
Quando Pátria rima com Morte, diga-lhe bem que invadida.

Seus restos mortais podem repousar na Ática,
nas antigas Cíclades ou na África,
o que nos importa a fé, se é que ela é imperativa?

(Neste século pouco crítico, não há ateu
Que realmente queira converter-se a Yahvé),
Pois por ela também se fenece, quais bezerros.


É sem dúvida afável entre a sombra e a poltrona
Nas profundas estações silenciosas
Falar de arte e literatura. Preciosa
É sem dúvida também a ridícula ociosa
Ó verde donzela, e estudiosa
Crítica nas suas horas para um Monsieur Crevel
Legionário burguês doutor em biologia
Versículos das ciências criador, Bette:
Que se ofereças protegida pela vela.
Na lua branca que mata as Musas
Ridícula musa tão sensual
Bela para quem toda a Filosofia
Dorme em manuais falsa esteta doutora
Ó deusa, Popote filha do tédio
Zombada pelos senhores feios dos ministérios
Os sábios reprodutores de resoluções
Matemáticos sem matemática
E a hidra feia do comércio Biroteau,
Eu mesmo desisti de fazer para vocês
Uma balada, pois vocês me envergonham
Vocês, da minha pobre universidade parasitária
Vermes secos, ratos roedores de livros
Um dia, antes de vomitar, escreverei para vocês
Uma ode cômica ou uma elegia.

E se minha música estiver um pouco sem música,
Acrescente flautas e um tambor,
E também os metais do bom e velho rock.

Norbert-Bertrand Barbe - POÈMES À TRISTAN CORBIÈRE


ÇA?    

Ensaios? - Ora, eu não tentei a fazer soslaio!
Estudo? - Preguiçoso, eu nunca saqueei.
Volume? - Muito encadernado para ser relido...
Cópia? - Infelizmente não, não é remunerado.

Um poema? - Obrigado, mas lavei minha lira.
Um livro? - ... Um livro, mais uma vez, é algo para se ler!
Documentos? - Não, não, graças a Deus, está costurado!
Álbum? - Não é branco e é muito desconexo.

Rimas? - Por onde começar? ... E isso não é bonito.
Uma obra? - Não é polida nem repolida na vida.
Canções? - Eu gostaria muito, ó minha pequena musa! ...
Passatempo? - Achas, então, que isso me diverte?

TRISTAN CORBIÈRE – TRADUÇÕES ERIC PONTY

  

 ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

quarta-feira, dezembro 03, 2025

TRÊS POEMAS - Alexander Block- Trad.Eric Ponty

  P/ÁLVARO CARDOSO GOMES 

 INTRODUÇÃO


Partiste para os campos sem retorno.
Que o teu nome seja santificado!
Mais uma vez, as lanças rubras do pôr do sol
Estenderam suas pontas para mim.

Apenas à sua flauta dourada
Nos dias sombrios, meus lábios se unirão.
Se todas as súplicas ecoaram,
Oprimido, repousarei no campo.

Passarás em porfírio dourado -
Não sou eu quem abrirá os olhos.
Deixe-me respirar neste mundo dormido,
Beijar a passagem irradiado...

Ó, arranque minha alma enferrujada!
Descansem-me com os santos.
Tu, que segura o mar e a terra
Com tua mão fina e imóvel!

Ela se transformou


Terra deserta!
No Oeste, brilhando com o frio,
O sol, qual capacete de cobre de guerreiro,
Com o rosto triste voltado
Para outros horizontes,
Para outros tempos...

E o chapéu - uma nuvem dourada -
Se eleva com penas brancas
Acima da beleza ousada
Das minhas vestes noturnas!

E as asas lamentáveis da lua -
Asas de espantalho de corvo -
Brilham como um capacete solar,
Refletindo o brilho do entardecer...
Refletindo a felicidade...

E cruzes - janelas distantes
E os cumes da floresta dentada -
Tudo respira indolente
E com a branca dimensão
Da primavera.

BOLOTNYE CHERTENYATKI

A. M. Remizov


Eu te afugentei com o chicote
Ao meio-dia, pelo meio dos arbustos,
Para esperarmos aqui juntos
O silêncio do vazio.

Aqui estamos nós, sentados no musgo,
No meio dos pântanos.
O terceiro - o mês lá em cima -
Contorceu a boca.

Eu, como você, filho dos bosques
Meu rosto também está apagado.
Mais silencioso que as águas e 
mais baixo que as ervas
Um diabo empobrecido.

No chapéu ridículo
O sino das separações.
Atrás dos ombros - ao longe -
A rede dos arcos do rio...

E nós ficamos sentados, bobos, -
Sem vida, sem força das águas.
As tampas ficam verdes
De trás para frente

O sono contaminado da água,
A ferrugem das ondas... 
Nós somos vestígios olvidados
Da profundidade de alguém...

Alexander Block- Trad.Eric Ponty

  

   ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

DOIS POEMAS - Maurice Maeterlinck- Trad. Eric Ponty

 P/ÁLVARO CARDOSO GOMES  

ORAÇÃO

ORAÇÃO Dó, meu Deus, compaixão, 
Que já falho no limiar da vontade! 
Pálida está minha alma diante da impotência, 
Diante da impotência branca e da inércia. 

A alma com as ações pela metade, 
A alma, pálida de choro e lamentações, 
Vê diante do inexplorado suas mãos fracas 
E débeis tremer e desanimar. 
E enquanto do coração sobem bolhas de sonho azul-violeta, 
um raio de lua molha suas mãos fracas, 
pálidas como cera, com seu fio prateado, um raio de lua, 
no qual já vive um brilho dos dias murchos dos lírios, 
do qual se ergue a sombra de suas mãos.

II    

Os medos de uma mulher conter-se meu peito:
Com que fiz com estes, minha parte,
Minhas mãos, os lírios da minha alma,
Meus olhos, os céus do meu coração?

Ó Senhor, tenha piedade da minha dor:
Perdi a palma e o anel, ai de mim!
Tenha piedade das minhas orações, meu pobre alívio,
Flores cortadas e frágeis em um vaso.

Tenha dó da infração da minha boca,
E das coisas não feitas, e das palavras não ditas;
Derrame lírios sobre a seca da minha febre,
E rosas sobre os pântanos!
    
Ó Deus! As pombas cujos voos são dourados,
Nos céus lembrados! Tenha piedade também,
Destas vestes que envolvem os meus lombos,
Que sussurram à minha volta, vagamente azuis!

Maurice Maeterlinck- Trad. Eric Ponty

  

  ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA 

TÊTE DE FAUNE - ARTHUR RIMBAUD – TRAD. ERIC PONTY

P/ÁLVARO CARDOSO GOMES  

NA folhagem, um verde tesouro salpicado de ouro,
Nessa folhagem incerta e florida
De esplêndidas flores onde o beijo repousa,
Vivo e perfurando a requintada bordaria,

Um fauno espantado mostra seus dois olhos
E morde as flores rubras com seus dentes alvos:
Bronzeada e feral qual um vinho velho,
Seu lábio estoura em risos sob os galhos.

E quando ele foge - qual um esquilo -
Seu riso ainda treme em cada folha,
E vemos assustado por um pintassilgo
O Beijo de Ouro do Bosque, que se recolhe.

ARTHUR RIMBAUD – TRAD. ERIC PONTY

  

   ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA 

terça-feira, dezembro 02, 2025

A CIDADE MORTA - STEFAN-GEORGE- TRAD. ERIC PONTY

A ampla baía preenche o novo porto.
Toda a beleza do país é sugada por uma lua
Das paredes brilhantes e ásperas das casas.
Ruas intermináveis com a mesma ganância
A multidão negocia durante o dia e se diverte à noite.
Apenas escárnio e piedade sobem até a mãe
No rochedo acima, com paredes negras
Empobrecida, jaz olvidada pelo tempo.

A fortaleza silenciosa vive, sonha e vê
Igual sua torre se ergue em raios eternos de sol.
O silêncio protege suas imagens sagradas.
E nas ruas gramadas, seus moradores
Os membros florescem pelo meio do tecido gasto.
Ela não sente dor. Ela sabe que o dia está a chegar:
Dos palácios luxuosos
Subindo a montanha, vem um cortejo suplicante:

Uma tristeza desoladora nos assola e nos corrompe
Se não nos ajudarem, definharemos em fartura.
Concedam-nos o ar puro de suas alturas
E fontes límpidas! Deparamos descanso no pátio
E no estábulo e em cada interstício de um portão.
Aqui, valorizem como nunca viram - as pedras
Igual a carga de cem navios preciosos. Fecho
E maduração de toda a extensão do país!

Mas vem uma resposta severa: >Aqui não há dó.
O que era bom para vocês está destruído.
Apenas sete foram salvos, aqueles que vieram outrora
E aos quais nossos filhos sorriam.
A morte os atingirá a todos. Já o seu número é um sacrilégio.
Vão com a falsa pompa que repugna aos nossos meninos!
Vejam como seus pés descalços vejam quais seus pés descalços

STEFAN-GEORGE- TRAD. ERIC PONTY

  

   ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA 

segunda-feira, dezembro 01, 2025

GOETHE - STEFAN-GEORGE- TRAD. ERIC PONTY

 Partimos com o delicado sopro da primavera
No final do verão, por meio do campo fumegante
Para a sua cidade. Ainda havia paredes robustas
E andaimes indignos de pessoas livres
E o dia - sobre naturalmente puro e quase sublime.
Chegamos à sua casa silenciosa. Lançamos
Um olhar reverente para cima e nos dispensamos. Hoje,
Quando tudo quer gritar, nossa saudação silencia.

Ainda poucas horas: o espaço consagrado
Erigindo: eles os tocam para crer
As cores vivas cintilam nas ruas.
A multidão se agita festiva
Adornando o Grande e perguntando-lhe
Como ele serve de escudo para cada clã -
Que apenas ouve a voz mais alta.
Não há limites para as alturas das almas.

O que sabem sobre o sonho rico e o canto
Que vocês admiram! Já na infância sofrem
Que vai ao muro. Se inclina para a fonte
No tormento do jovem e na inquietação do homem
E na melancolia que ele abrigou por trás do sorriso.
Se ele viesse igual alguém ainda mais belo na vida,
quem então a honraria? Ele passaria
como um rei ignoto por vocês.

Vocês o chamam de seu e agradecem e exultam -
Vocês, é claro, cheios de todos os seus impulsos
Apenas nos inferiores, quais dos animais -
E hoje apenas a sarna do povo late...
Mas não suspeitam que ele se tornou pó
Desde então, ele ainda abriga muito de vocês
E que nele, o resplandecente, já ofuscar-se muito
Do que ainda chamam então de eterno.

STEFAN-GEORGE- TRAD. ERIC PONTY

  

   ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA 

DANÇA E O POEMA DO TEMPO - STEFAN-GEORGE- TRAD. ERIC PONTY

 Quando me ajoelhei trêmulo na porta
Ao ver a mais adorável. Afundado pelo glúten,
Passei as noites amargas considerando. O amigo
Olhou para mim com dó, eu apenas suspirei
Por sua graça e pela minha canção para ela:
Eu era motivo de escárnio para as pessoas que nunca se abalam
Que planejamos assim lamentar o amor - nós
Efêmeros como se ficássemos para sempre.

Eu cresci e me tornei homem, e fui tomado pela vergonha
Da cidade e do império devastados por falsos líderes...
Onde me parecia haver salvação, eu vinha em auxílio
Com espírito e bens, e lutava contra os corruptores.
Como recompensa, fui roubado, difamado e enganado,
Um mendigo por anos nas portas de estranhos,
Sob o comando de loucos - eles logo
Apenas poeira sem nome, enquanto eu vivo.

Então, meu caminho sombrio e tortuoso.
Minha dor pelas nossas próprias torturas.
Minha raiva contra os baixos e perversos.
Na forma de minério: muitos ouviram
Assim que seu horror se ofuscar com som selvagem
E mesmo que ninguém sentisse brasas e garras
Por meio do próprio coração: ele inchou do Etsch ao Tibre
A glória para a sede dos sem paz e sem pátria.

Mas quando eu fugi do mundo. Vi os campos dos ditosos, 
ouvi o coro dos anjos E isso me causou: peguem minha harpa
E os sons enfraquecidos de meninos e velhos... ó tolos!
Peguei um pedaço de lenha da minha lareira e soprei
Tirei um pedaço de lenha da minha lareira e soprei -
Assim, o inferno precisava do fogo intenso
Para irradiar o amor supremo
E para anunciar o sol e as estrelas.

 STEFAN-GEORGE- TRAD. ERIC PONTY

  

  ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA 

O POEMA DO TEMPO - STEFAN-GEORGE- TRAD. ERIC PONTY

Vós, meus contemporâneos, já sabiam
Me aferiram e me julgaram - estavam antes errados.
Quando, no barulho e na cobiça licenciosa da vida
Com passos pesados e dedos grosseiros, correram:
Eu era estimado o príncipe ébrio de unguento
Que sacudia docemente sua τακτε zähltε
Em airosa elegância ou dignidade serena.
Em pálida festividade distante da terra.

De toda uma juventude de obras ásperas,
Não prediziam nada das tormentas da tempestade,
Após o auge dos sonhos crespos e sangrentos.
>Ainda este amigo na aliança! E não apenas ansiando
Por τατ, o rebelde envolveu
Com punhal e tocha a casa do inimigo...
Vós, experientes, não deixam transparecer nenhum arrepio. 
Não deixam transparecer nenhum sorriso.
Ficaram cegos para o que dormia sob um fino véu.

O flautista então os levou à montanha maravilhosa
Com sons sedutores e apaixonados. Mostrou-vos
Tesouros tão estranhos que, aos poucos,
O mundo que até pouco tempo atrás era 
tão elogiado passou a ser visto com desgosto.
Agora que alguns já sussurram arcádicos
E ostentam sua fraqueza: ele pega a fanfarra
Ferindo a carne podre com suas esporas
E, tocando alto, leva-os de volta para a multidão.

Enquanto os anciãos elogiam isso com admiração,
Suspiram: tal majestade desceu!
O canto das nuvens transfiguradas tornou-se um grito!
Vós assistem mudanças. Mas eu fiz o mesmo.
E a trombeta zelosa de hoje toca
E fogo líquido lança branco que amanhã
Fácil toda a beleza, força e grandeza ascendem
Da canção silenciosa de flauta de um menino.

STEFAN-GEORGE- TRAD. ERIC PONTY

  

 ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA 

domingo, novembro 30, 2025

CORRESPONDÊNCIAS - AS FLORES DO MAL, por CHARLES BAUDELAIRE - NOVA TRADUÇÃO ERIC PONTY

 

A natureza é um templo, onde colunas vivas,
às vezes, respiram um discurso confuso;
O homem pisa entre bosques de símbolos,
Cada um deles o vê uma coisa semelhante.

Como os longos ecos, sombrios, profundos,
Ouvidos de longe, se misturam em união,
Vasta qual a noite, e, a claridade do sol,
Assim perfumes, cores e os sons podem se retribuir.

Odores existem, frescos qual a pele de um bebê,
Suaves tais oboés, verdes tais a grama do prado.
-Outros corrompidos, ricos, triunfantes, plenos.

Com dimensões infinitamente vastas,
Incenso, almíscar, âmbar gris, Benjamin,
Cantando o êxtase dos sentidos e da alma.

AS FLORES DO MAL, por CHARLES BAUDELAIRE TRADUÇÃO ERIC PONTY


sábado, novembro 29, 2025

AURORA - PAUL VALÉRY - TRAD. ERIC PONTY

 A confusão sombria
Que me servia de sono,
Dissipa-se assim que surge
A rosa do sol.
Na minha alma, avanço,
Cheio de confiança:
É a primeira oração!
Mal saído das areias,
Dou passos admiráveis
Seguindo da minha razão.

Olá! Ainda adormecidas,
Aos seus sorrisos gêmeos,
Semelhanças amigas,
Que brilham entre as palavras!
Ao barulho das abelhas,
Eu as terei em cestas,
E no degrau trêmulo
Da minha escada dourada,
Minha prudência evaporada
Já põe seu pé alvo.

Que aurora sobre essas cristas
Que começam a tremer!
Já se esticam em grupos
Aquelas que pareciam dormir:
Uma brilha, outra boceja;
E sobre um pente de tartaruga
Desviando seus dedos vagos,
Ainda próxima do sonho,
A preguiçosa a encadeia
Às premissas de sua voz.

O quê! São mal-humoradas!
O que fizeram esta noite,
Senhoras da alma, Ideias,
Cortesãs por tédio?
-Sempre sábias, dizem elas,
Nossas presenças imortais
Nunca traíram o seu lar!
Não estávamos distantes,
Mas secretas aranhas
Nas trevas de você!

Não ficarás feliz,
Embriagado, ao ver da sombra surgirem
Cem mil sóis de seda
Sobre seus enigmas tecidos?
Veja o que fizemos:
Estendemos sobre seus abismos
Nossos fios primitivos,
E capturamos a natureza nua
Em uma trama tênue
De preparativos trêmulos...

Sua teia espiritual,
Eu a rompo e vou procurando
Na minha floresta sensual
Os oráculos do meu canto.
Ser! Ouvido universal!
Toda a alma se prepara
Para o extremo do desejo...
Ela se escuta tremendo
E às vezes meus lábios parecem
Captar seu estremecimento.

Aqui estão minhas vinhas sombreadas,
Os berços dos meus acasos!
As imagens são numerosas,
Tão numerosas quanto meus olhares...
Cada folha me apresenta
Uma fonte complacente,
Onde bebo esse frágil ruído...
Tudo é polpa, tudo é amêndoa,
Cada cálice me pede
Que espere por seu fruto.

Não temo os espinhos!
O despertar é bom, mesmo que seja difícil!
Essas pilhagens ideais
Não querem que tenhamos certeza:
Não há como conquistar um mundo
De feridas tão profundas
Que não sejam para o conquistador
Uma ferida fértil,
E seu próprio sangue lhe garante
Que ele é o correto possuidor.

Aproximo-me da transparência
Da bacia invisível
Onde nada minha Esperança
Que a água transporta pelo seio.
Seu pescoço corta o tempo vago
E levanta essa onda
Que faz um pescoço sem igual...
Ela sente sob a onda unida
A profundidade infinita,
E estremece desde a ponta dos pés.

PAUL VALÉRY - TRAD. ERIC PONTY

 

   ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

sexta-feira, novembro 28, 2025

Elegia - MARCEL SCHWOB - Trad. Eric Ponty

 Sem cessar, eu esculpo um verso que eu limei
Sob a pálida luz da lâmpada que douro
Ela acende na borda cintilante do toro
Do tinteiro coberto por seu fecho maciço
O rubor fugaz e moribundo do crepúsculo.
A Rima não quer me dar seu sorriso:
Mas eu a perseguirei em seu boudoir charmoso:
Não adianta gemer — abra-me sua caixa!

Suas joias estão ocultas em um cofre fechado,
Cuja fechadura desafiaria toda a arte mourisca:
Ela voa com um suspiro alarmado.
Quando meu estilete a quebra, perfura e fura,
Então ela se abate trêmula nas margens do Bósforo,
Como uma virgem oriental, agachada no lavadouro;
E ritmando suas canções ao som de seu batedor:
Como um brilhante lapidado com uma grande faceta,
Sob um véu, seus olhos brilham para me ver:
“Não adianta gemer, abra sua caixa!

A rima murmurou o som doce e amado,
Lisette, um nome triste, que ainda me persegue:
Ah! Se eu tivesse o amor que semeei por toda parte,
Quando o fogo do meu peito jorrava por cada poro!
Mas, infelizmente, quebrei minha caixa de Pandora,
expulsei os prazeres do meu sombrio castelo
e guardei a dor, um vampiro de voo negro,
morcego pálido ou morcego-de-cabeça-branca pegajoso
Batendo suas asas fracas em meu peito, seu aposento:
"Não adianta lamentar, abra sua caixa para mim. 

ENVIO

Príncipe, atice o fogo que arde a passo no abafador!
Não durma, na noite de núpcias, qual um esquilo
E brinque possante com o empurrador.
Terás que forçar a Rima para obtê-la!
“Não adianta gemer; abra-me sua caixa.”

Janeiro de 1888

MARCEL SCHWOB - Trad. Eric Ponty

 

  ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

quarta-feira, novembro 26, 2025

SONETOS - Marcel Schwob - TRAD. ERIC PONTY

 Soneto para ele

Quando ris, gosto de ver seus olhos brilharem,
Seus lábios se curvarem em sorrisos graciosos,
O rubro da sua pele, para me provocar ainda mais,
Sorrindo e refletindo covinhas provocantes.

E assim como esses deuses assobiando em suas gaitas,
Que nossos antigos joalheiros gostavam de gravar
Nas paredes de prata das enormes caixas
E com um cinzel de aço finamente cinzelado,

Sorris, abrindo ligeiramente os cantos dos lábios,
Para me mostrar os dentes com expressões melosas,
E franze a pele sob reflexos dourados tão intensos.


Quanto eu daria, ó meu pequeno deus Fauno,
Cujo riso cintila na mornidão do Beaune,
Para rir contigo sozinho, na noite, quando tudo dorme!


SONETO

Tão decaído do paraíso que se enchia de rosas,
O homem se virou pela última vez:
Na barreira branca onde sua voz tremia
Seu dedo, espada de fogo, guarda Seus lábios rosados.

Ele caiu mais baixo que o Inferno, nas neuroses
Onde o coração está pregado ofegante na cruz;
Sua testa, que iluminava a coroa dos reis
Empalidece sob o céu negro das tristezas sombrias.

Pensativo, ele ainda vê um sorriso adorado
Expirar lentamente em Sua boca vermelha,
Fruto proibido que sangra, entreaberto, na treliça.

Do Paraíso, onde flutua um grande halo dourado,
E chora amargamente sua juventude abatida
Aos pés marmóreos da fria estátua.

 Marcel Schwob - TRAD. ERIC PONTY

  

 ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

terça-feira, novembro 25, 2025

VERSAILLES - Outubro 1891. ALBERT SAMAIN

 I

Ó Versalhes, que nesta tarde tão sombria,
Por que tua lembrança me obsessa assim?
O calor do verão se afasta, e eis que
A estação outonal se abaixa sobre nós.

Quero rever, ao longo de um dia tranquilo,
Campos sombrios, cobertos por folhas secas,
E respirar antes, em uma noite dourada e suave,
Tua beleza mais comovente no final do ano.

Aqui estão teixos cônicos e tritões gordos,
Teus jardins mistos onde Luís não vem mais,
E tua pompa exibindo penas e capacetes,

Como um grande lírio, morres, nobre e triste, sem ruído;
E tua onda esgotada na borda mofada das bacias
Escorrem, suaves como um soluço na noite.

II

O Ar livre. Urbanidade dos costumes antigos.
Alta cerimônia. Reverências sem fim.
Créqui, Fronsac, belos nomes intensos qual cetim.
De mãos ducais nas antigas valencianas,

De mãos reais sobre os abetos. Antífonas
Dos bispos diante de Sua Excelência o Delfim.
Gestos de minueto e corações de biscoito fino;
E aquelas graças que se diziam ser austríacas...

Princesas de sangue azul, cuja alma cerimonial,
Durante séculos, na mais pura das castas, macerou.
Grandes senhores de espírito palito. Marquês de Sèvres,

Todo um mundo galante, vivaz, audaz, asseado e são,
Com sua espada afiada em punho e, acima de tudo,
Esse desprezo pela morte, qual uma flor, nos lábios!


III

Meus passos despertaram prestígios perdidos.
Ó psique da velha Saxônia, onde o Passado se reflete...
É aqui que a rainha, ao ouvir Zémire,
Sonhadora, se abanava na mornura das noites.


Visões: cestas, de pó e moscas; e então, leves 
Qual um perfume, bonito tal qual um sorriso,
É esse ar da velha França que tudo respira aqui;
E sempre esse cheiro penetrante de buxo...

Mas o que toma meu peito num abraço infinito,
À luz de uma longa noite durante sua agonia,
É esse Grande Trianon solitário e real,

E sua escadaria deserta, onde o outono, tão suave,
Deixa cair, sonhando, seus cabelos ruivos
Sobre as águas divinamente tristes do grande canal.

IV

O bosque de Vertumno é maltratado pelas Graças.
Essa sombra, que, gemendo de mármore em mármore,
Arrasta-se e se sustenta com um belo braço lânguido,
Ai, é o Gênio em luto pelas raças que já tão antigas.

Ó Palácio, horizonte supremo dos terraços,
Um pouco de sua beleza corre em nosso sangue;
E é isso que lhe confere um acento indescritível,
Quando um pôr do sol sublime cintila seus espelhos!

Glórias que tantos dias foram o seu cenário,
Almas cintilantes sob os lustres. Noites douradas.
Versalhes..., mas já se enferma a noite sombria.

E meu coração de repente se aperta, pois ouço,
Como um ariete sinistro nas muralhas do tempo,
Sempre, o grande ruído surdo de ondas negras na sombra.

Outubro 1891. ALBERT SAMAIN - TRAD. ERIC PONTY

 

     ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

segunda-feira, novembro 24, 2025

CANÇÃO - ALFRED DE MUSSET - TRAD. ERIC PONTY

 Eu disse ao meu coração, ao meu peito fraco: 
Não basta amar a amada? E tu não 
vês que mudar fixo é perder o tempo 
da felicidade em desejos?

Que me respondeu: Não bastas amar a tua amada: 
E não vês que mudar fixo 
tornando-se doces e queridos 
os prazeres tão passados?

Eu disse ao meu coração, ao meu fraco peito: 
Não é aceitável tanta tristeza? E não vês
que mudar fixo 
é deparar dor a cada passo?

Que me respondeu: Não é aceitável, 
Não é suficiente tanta tristeza; 
E não vês que mudar fixo 
Torna doces e valiosas as dores tão passadas?

ALFRED DE MUSSET - TRAD. ERIC PONTY

  

    ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

domingo, novembro 23, 2025

DOIS SONETOS BELGAS - TRAD. ERIC PONTY

 
Sim, é assim mesmo! Eu te conheço muito pouco,
Mas vi o oportuno para sofrer com a ternura;
Pois teu olhar, perfurando minha carne com destreza,
Chegou ao meu peito qual de uma flecha.

Sim! Estou sã enlevado e te confesso isso;
Estou seduzido por essa trança loira
Que, qual de um ofídio dourado, me enviou tua carícia:
Quando te vi um dia com teu traje azul!...

E desde então estou sempre sob tua janela,
E teu peito e teu corpo, eu gostaria de apreciar,
E estendo meus braços para ti quando me deito à noite!

Pois sem ainda tê-la seduzido - eu adivinho,
Assim qual também se adivinha - sem vê-la - o aroma doce
Que paira nas dobras alvas do teu lenço!...

GEORGES RODENBACH.


SENTIDOS DE MAIO


Ao pé dos troncos nodosos dos carvalhos seculares
A sombra dorme, amainada, ofuscar-se passagens
Ou o sol de maio espalha brilhos vivos.

O amor que desperta irrita os pombos
E persegue rindo os tentilhões nos galhos
Ou sobe o perfume rixoso das roseiras bravas.

As virgens da primavera vestiram teus vestidos brancos
E sob os velhos carvalhos vão-se ainda, grupos felizes,
Para coroar tuas frontes puras com ramos de pervincas.

Então, entre os cantos dos pássaros apaixonados,
Discretas, sussurrando palavras de jovens Éves,
Elas perdem teus passos no fundo das passagens cavadas.
No fundo das passagens cavadas canta o ardor das seivas.

FRÉDÉRIC BATAILLE.

 

   ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

quinta-feira, novembro 20, 2025

QUATRO POEMAS - Gérard de Nerval - Trad. Eric Ponty

 SONETO

(Epígrafe)

Ele viveu ora alegre qual um pássaro,
Ora apaixonado, despreocupado e terno,
Ora sombrio e sonhador qual triste Clitandre.
Um dia, ouviu alguém tocar à sua porta.

Era a Morte! Então ele a pediu para esperar
Até que ele terminasse seu último soneto;
E então, sem se emocionar, ele foi se deitar
No fundo do baú frio onde seu corpo tremia.

Ele era preguiçoso, segundo conta a história,
Deixava a tinta secar demais na escrivaninha.
Ele queria saber tudo, mas não apreciou nada.

E quando chegou o era em que, cansado dessa vida,
Numa noite de inverno, enfim sua alma foi levada,
Ele partiu dizendo: Por que eu vim?


A VICTOR HUGO (NERVAL)


Da sua amizade, mestre, levando esta prova,
Eu mantenho, portanto, sob meu braço o Reno.
 — Eu pareço um rio.

E sinto-me crescer com a comparação.
Mas será que o rio sabe, pobre Deus selvagem,
O que lhe dá um nome, uma nascente, uma margem,

E se ele corre para todos, qual é a razão.
Sentado no cume da imensa natureza,
Talvez ele ignore, como a criatura,

De onde vem esse benefício que deve aos Imortais:
Eu sei que de você, doce e santa hábito,
Vem o Entusiasmo, o Amor e o Estudo,

UMA MULHER É O AMOR


Uma mulher é o amor, a glória e a esperança;
Aos filhos que ela orienta, ao homem consolado,
Ela eleva o coração e acalma o sofrimento,
Como um espírito dos céus exilado na terra.

Curvado pelo trabalho ou pelo destino,
O homem se ergue com sua voz e sua face se ilumina;
Sempre impaciente em sua corrida limitada,
Um sorriso o domina e seu coração se suaviza.
Neste século de ferro, a glória é incerta:
É preciso se resignar a esperar por ela por muito tempo.
Mas quem não amaria, em sua graça serena,
A beleza que a dá ou que a faz ganhar?

À SENHORA HENRI HEINE


Tem olhos negros e é tão bela,
Que o poeta vê brilhar em ti a centelha
Que anima a força e que invejamos:
O gênio, por sua vez, incendeia todas as coisas;
Ele lhe devolve sua luz, e tu és a rosa
Que se embeleza sob teus raios.


O PÔR DO SOL


Quando o sol da tarde percorre as Tuileries
E incendeia as janelas do castelo,
Eu sigo pela Grande Allee e seus dois espelhos d'água
Totalmente mergulhado em meus devaneios!

E daí, meus amigos, é uma vista muito formosa
Ver, quando a noite espalha seu véu ao redor,
O pôr do sol, um quadro rico e comovente,
Emoldurado pelo arco da Estrela!

 Gérard de Nerval - Trad. Eric Ponty

 

   ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA