POR QUE se há escolhido a poesia de Eric
Ponty com um propósito demonstrar-nos à particular da Poesia em nossa época? POR
QUE não Drummond ou Manuel Bandeira, por que não Gonzaga (o Poeta Inconfidente)
ou Gullar, por que não Shakespeare ou Camões, cujos últimos não podemos deixar
de citar dois sonetos?
XIII
Se fores tu e tu eu! Porém, aí, amor,
Só tu serás teu contudo convivas;
Despontes a abandonar esta ilusão.
Chegas noutro tuas atrações finas.
Só tu serás teu contudo convivas;
Despontes a abandonar esta ilusão.
Chegas noutro tuas atrações finas.
Assim conseguirás que não se finde,
Está na beleza detenhas, posto
Que quando o doce rebento te traslade
Serás de novo tu, ao faças mortal.
Está na beleza detenhas, posto
Que quando o doce rebento te traslade
Serás de novo tu, ao faças mortal.
Tão digna residência não carece,
Que um mal tutor a deixando deixada,
A expensas de inverno e suas correntes.
Que um mal tutor a deixando deixada,
A expensas de inverno e suas correntes.
E do frio eterno morte traz vácuo.
Não esbanjas, pois, amor, meu ao dar-lhe
Ao teu filho o que tu tiveste: um pai.
Não esbanjas, pois, amor, meu ao dar-lhe
Ao teu filho o que tu tiveste: um pai.
Shakespeare
Amor é fogo que arde sem se ver.
Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.
Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor
Camões
Pode
ser. Contudo, só é escolhido àquele que se matem a meta. Porém é possível deduzir
da obra dum único poeta, a interior em geral da poesia? O que é em geral, é
dizer, o que vale para muitos, só podemos alcançá-lo por meio duma meditação
comparativa.
A
isto é imperativo um esclarecimento de um maior número possível da variedade de
poesias e de géneros poéticos. A poesia de Eric Ponty é só uma dentre muitas.
De nenhuma maneira suficiente nela só como um único modelo para a consignação da
profundeza da poesia contemporânea. Por isso nosso propósito já está fracassado
desde o princípio, se entendemos por «interior da poesia» o que se contradiz no
opinião geral e que vale além disso para toda poesia. Porém este universal que
vale além disso para todo particular é sempre apático, daquele «cerne» que
nunca pode ser capital.
Agora
entretanto, buscamos precisamente o capital da essência que nos força a resolver-se
se nela o correto para tomarmos sério a poesia e como ela se concebe; se juntos
obtivermos os supostos a mantende-nos no domínio da Poesia e como ela se dá.
Só
que poetizar sobre o poeta não é o sinal dum princípio de narcisismo atrapalhado
e a vez desta confissão duma carência de plenitude do mundo? Poetizar sobre o
poeta não é nenhum abuso desconcertante, algo duradouro, um extremo?
Eric
Ponty não se foi escolhido porque sua obra, como dentre outras, realize o eficaz
geral da poesia, senão porque unicamente porque está encarregada com a consignação
poética de poetizar a própria profundeza da poesia. Éric Ponty é a nós neste
sentido admirável Poeta de Poetas. Por isto está neste ponto crucial como nos
atesta em:
Á LÌVIA
Tomamos tal calma que se simula tão plena
De areia está ancestral de nós mesmos,
Sala habitada do destino;
Entorno das verdes campos arejadas
À nuvem nos advém da jovialidade
E brilhando tão distantes,
Globais de maduríssimos lembranças
Cálices coroados doiro,
Harmonicamente ordenados, sendo admirável fila,
Ao dali alado aqui e ali ascendendo sobre
O chão alacado, ficam às mesas imóveis.
Pois vindo tão distante quanto o azul do céu
Até aqui, agora no final desta tarde,
Se há trazido achegos hospedeiros.
Segundo
o linguista Noam Chomsky «Tomemos nossa própria história, a história da
conquista do hemisfério ocidental (…) Os trabalhos antropológicos atuais
indicam que o número de nativos no hemisfério ocidental pode ter sido acerca de
100 milhões (…) Tomemos só, por exemplo o norte de Rio Grande onde habitavam
uns 10 o 12 milhões de índios americanos (…) Muitos deles foram inteiramente
erradicados ou vieram a ser exterminados, outros sucumbiram a enfermidade
trazidas pelos europeus. Sendo um genocídio massivo (…) », fazendo dos Estados
Unidos um caso à parte.
Falemos
contudo agora de alguma coisa de música talvez jazz. Nas análises verbais duma
partitura musical poderá, até certo ponto, dilucidar sua estrutura formal, seus
elementos técnicos e sua instrumentação. Porém ali onde não é o reino da
musicologia no sentido estrito, ali onde não agrava a uma «metalinguagem» passa
a ser um parasita da música —«chave», «tom», «síncope»—, falar da música, oral
o escrita, é um compromisso muito ambíguo como nos advém Adorno em sua Moda em
Tempo de Jazz, talvez um ensaio superado por gênios formado nos clássicos, mas
voltados ao jazz como nos comprova nesta composição: RITUAL de Keith Jarrett, compositor
afro descendente e interpretado pelo pianista e maestro Dennis Russell Davies de
descendência caucasiana.
Uma
narração, uma crítica duma execução musical se empata menos do mundo sonoro
real que do executante o da recepção por este público. É um recorte feito por
analogia. Apenas podemos dizer nada que pertença à sustância desta composição.
Uns quantos destemidos, Boecio, Rousseau, Nietzsche, Proust e Adorno entre
eles, hão tratado de traduzir em palavras o tema da música e seus significados.
Ocasionalmente hão deparado «contrapontos» metafóricos, modos de sugerir,
simulacros de grosso efeito evocador sem dúvida, há nestes casos em que esses
virtuosismos semióticos possuem mais sedução, «escapam desta questão» no
sentido estrito da expressão. Válido apesar disso e, não passam de derivações.
E
nisto convocando a supor que o que é inesgotavelmente significativo podendo
também carecer de sentido mais explícito. Significado da harmonia está
exatamente quando está sendo adimplida em sua desempenho e sua audição (há quem
«escuta» uma composição quando se põe ler no silêncio sua “partitura” (o Texto),
contudo, estes são pessoas quais privilegiados, uns dois ou quatro) tal como nesta
tradução esmerada e primordial de Ponty:
Há uma passante
A rua ensurdecedora uivava ao redor de mim.
Magra, delgada, luto rigor, com dor majestosa,
Uma mulher passou, fazer com sua mão fastuosa
A rua ensurdecedora uivava ao redor de mim.
Magra, delgada, luto rigor, com dor majestosa,
Uma mulher passou, fazer com sua mão fastuosa
Se alçaram, oscilaram dobrado festão Amim;
Tão Ágil e nobre, perna alva de estátua.
Eu, crispado excêntrico qual, bebia chão
Sua olhar, céu pálido onde brota a furação,
À doçura que fascina e o prazer que mata.
Eu, crispado excêntrico qual, bebia chão
Sua olhar, céu pálido onde brota a furação,
À doçura que fascina e o prazer que mata.
Um raio… aceita, à noite! Fugaz graça ao fundo,
Cujo olhar me há feito de pronto renascer,
Não volverei já a verte até a além-mundo?
Cujo olhar me há feito de pronto renascer,
Não volverei já a verte até a além-mundo?
Outra parte, mui longe de aqui! Mui tarde! Jamais!
Pois ignoro aonde vai, e não sabes onde vou,
Ah Tu, a quem eu tivera amado, Ah tu, sabias!
Pois ignoro aonde vai, e não sabes onde vou,
Ah Tu, a quem eu tivera amado, Ah tu, sabias!
Porém
que é o quem está ganhando, interiorizando, ao que se está respondendo? Que é o
que nos põe em todos estes movimentos? Aqui chegamos a uma dualidade de
«sentido» e de «significado» que a epistemologia, a hermenêutica filosófica e
às investigações psicológicas terão sido quase inábeis de dilucidar.
Qualquer
que seja à solução, à pergunta sobre origem de obra de arte se converte em
pergunta sobre a essência da arte. Porém como nós devemos deixar aberta a
questão de se a arte é como é geral, tratemos de reencontrar a sua essência da
arte onde à arte indubitavelmente impera em sua realidade. Arte está em si na prória obra de
arte, pois ela processe a própria existência. É intransferível às gerações duma formação cultural como bem prova esta
bela composição de Duparc L'Invitation au Voyage:
Pensa no alvorecer
Em que embraveçamos, num passeio,
Adorar a valer, amar e fenecer
No país que é a tua ideia!
Os sóis róscidos.
Desses céus nubilosos
A mim conservam a graça
Místico e atroz
Dessa visão infiel
Cintilando através do lamento.
Lá, tudo é paz e rigor,
Luxo, beleza e languidez.
Os movediços afáveis,
Pelas estações idas,
Enfeitariam o clima;
As mais raras fina flores
Embaralhando odores
A um âmbar líquido e ambiente,
Lares inauditos, Cristais infindos,
Toda uma pompa leste,
Tudo aí à alma
Pensaria em tranquilidade
Sua doce língua natal.
Lá, tudo é paz e rigor,
Luxo, beleza e languidez.
Viaja sobre os caminhos
Adormecer junto às docas
Barquinhos de caráter vagabundo;
É para receber
Teu menor deleite
Que eles vêm do fim do orbe.
- Os sanguíneos ocidentes
Regam as vertentes,
Os canis, toda a urbe,
E em seu douro os tece;
O mundo entorpece
Na tépida luz que o envolve.
Lá, tudo é paz e rigor,
Luxo, beleza e languidez.
Á
tanto, devemos completar o curso deste círculo. Não é este um expediente ou uma
deficiência. Os mais firmes sabem andar por esse caminho, e ficar nele sendo
uma festa do pensamento, supõem de que o pensamento seja um oficio. Não só é um
círculo ao passo principal da obra de arte, e o deste que exista obra, senão
cada passo aprisionado que tentamos circundar neste círculo não passa dum Mito
de Sísifo de Camus, ou seja, o estado cíclico da história.
Ao
se encontrar à essência da arte que realmente está na obra, busquemos então na
própria obra real e nos interrogaremos que é como sendo um imago do real.
As
obras de arte são conhecidas por todo mundo. As obras de arquitetura e escultura
se encontram nas praças públicas, ou nas igrejas e nas casas. Nessas coleções e
exposições se depositam obras de arte das mais diferentes épocas e povos.
Se
percebemos em sua intacta realidade, sem prejudicar, se demostrando que às
obras são tão naturalmente existentes como todas coisas existentes. Um quadro
exposto na parede é como um fúsil de caça ou guarda-chuva.
Uma
pintura, por exemplo, de Oscar Arararipe que em seu quadro “Inocente a fumaça
da Maria fumaça.” que representa uma locomotiva de conduzia de campesinos, afro
decentes até o Imperador Dom Pedro II e seus decentes, e, serviu a transportar
“indesejados” trazendo-nos uma vaga exposição de outra transfiguração da
realidade.
Porém
quiçá nos chocasse esta maneira tão tosca e superficial de percebermos o que
seja à obra. Tal representação da obra pode há ter-lhe conservada ou cunhada do
museu. Devemos, pois, tomar a obra de arte como daqueles que a experimentam e
dela usufruem. A madeira na obra talhada. O colorido está no quadro como em
Oscar Arararipe. À voz na obra falada ou escrita. O som permanece a música. O
cozimento está tão para mutação na obra de arte que deveríamos dizer o seu
contrário: Uma vez que à arquitetura está na pedra está intransponível. A pedra
está para arquitetura como São Pedro para Vaticano. Como nos adverte Sartre: A
existência precede a essência. Uma coisa inertemente o outro. Isto não se ressoa na arte.
Nestas
obras destes Poetas se hão realizado a interior da poesia tão ricamente ou algo
mais que à criação que Eric Ponty, tão talento prematuro foi brusco
interrompido por outras vertentes, que se demonstraram numa falácia mineira como
nos comprova o nascimento do novo milênio. ERIC PONTY nós lançando num novo
dilema.
João da Penha, jornalista e professor
aposentado, colaborou em publicações culturais como Encontros com a Civilização
Brasileira, Cult e Tempo Brasileiro. Autor, dentre outros livros, de O que é
existencialismo (Brasiliense, 2011, 17. ed.) e Períodos Filosóficos (Ática
2000, 4. ed.), traduziu para revistas e jornais poemas dos russos Sierguêi
Iessiênin e Alieksandr Blok, e contos de José Maria Argüedas, Júlio Cortázar e
Gabriel García Márquez, publicados em Os primeiros contos de dez mestres da
narrativa latino-americana (Paz e Terra, 1978). Como ler Wittgenstein. São
Paulo: Paulus, 2013.