Pesquisar este blog

segunda-feira, maio 21, 2018

ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE POESIA MÚSICA, ARTES PLÁSTICAS - JOÂO DA PENHA


POR QUE se há escolhido a poesia de Eric Ponty com um propósito demonstrar-nos à particular da Poesia em nossa época? POR QUE não Drummond ou Manuel Bandeira, por que não Gonzaga (o Poeta Inconfidente) ou Gullar, por que não Shakespeare ou Camões, cujos últimos não podemos deixar de citar dois sonetos? 

XIII

Se fores tu e tu eu! Porém, aí, amor,
Só tu serás teu contudo convivas;
Despontes a abandonar esta ilusão.
Chegas noutro tuas atrações finas.

Assim conseguirás que não se finde,
Está na beleza detenhas, posto
Que quando o doce rebento te traslade
Serás de novo tu, ao faças mortal.

Tão digna residência não carece,
Que um mal tutor a deixando deixada,
A expensas de inverno e suas correntes.

E do frio eterno morte traz vácuo.
Não esbanjas, pois, amor, meu ao dar-lhe
Ao teu filho o que tu tiveste: um pai.

Shakespeare
 Amor é fogo que arde sem se ver.

Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

 É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

 É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

 Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor

Camões


Pode ser. Contudo, só é escolhido àquele que se matem a meta. Porém é possível deduzir da obra dum único poeta, a interior em geral da poesia? O que é em geral, é dizer, o que vale para muitos, só podemos alcançá-lo por meio duma meditação comparativa.



A isto é imperativo um esclarecimento de um maior número possível da variedade de poesias e de géneros poéticos. A poesia de Eric Ponty é só uma dentre muitas. De nenhuma maneira suficiente nela só como um único modelo para a consignação da profundeza da poesia contemporânea. Por isso nosso propósito já está fracassado desde o princípio, se entendemos por «interior da poesia» o que se contradiz no opinião geral e que vale além disso para toda poesia. Porém este universal que vale além disso para todo particular é sempre apático, daquele «cerne» que nunca pode ser capital.



Agora entretanto, buscamos precisamente o capital da essência que nos força a resolver-se se nela o correto para tomarmos sério a poesia e como ela se concebe; se juntos obtivermos os supostos a mantende-nos no domínio da Poesia e como ela se dá.


Só que poetizar sobre o poeta não é o sinal dum princípio de narcisismo atrapalhado e a vez desta confissão duma carência de plenitude do mundo? Poetizar sobre o poeta não é nenhum abuso desconcertante, algo duradouro, um extremo?

Eric Ponty não se foi escolhido porque sua obra, como dentre outras, realize o eficaz geral da poesia, senão porque unicamente porque está encarregada com a consignação poética de poetizar a própria profundeza da poesia. Éric Ponty é a nós neste sentido admirável Poeta de Poetas. Por isto está neste ponto crucial como nos atesta em:

Á LÌVIA

De celeste, quietamente ressoantes
Tomamos tal calma que se simula tão plena
De areia está ancestral de nós mesmos,
Sala habitada do destino;
Entorno das verdes campos arejadas
À nuvem nos advém da jovialidade
E brilhando tão distantes,
Globais de maduríssimos lembranças
Cálices coroados doiro,
Harmonicamente ordenados, sendo admirável fila,
Ao dali alado aqui e ali ascendendo sobre
O chão alacado, ficam às mesas imóveis.
Pois vindo tão distante quanto o azul do céu
Até aqui, agora no final desta tarde,
Se há trazido achegos hospedeiros.

Segundo o linguista Noam Chomsky «Tomemos nossa própria história, a história da conquista do hemisfério ocidental (…) Os trabalhos antropológicos atuais indicam que o número de nativos no hemisfério ocidental pode ter sido acerca de 100 milhões (…) Tomemos só, por exemplo o norte de Rio Grande onde habitavam uns 10 o 12 milhões de índios americanos (…) Muitos deles foram inteiramente erradicados ou vieram a ser exterminados, outros sucumbiram a enfermidade trazidas pelos europeus. Sendo um genocídio massivo (…) », fazendo dos Estados Unidos um caso à parte.

Falemos contudo agora de alguma coisa de música talvez jazz. Nas análises verbais duma partitura musical poderá, até certo ponto, dilucidar sua estrutura formal, seus elementos técnicos e sua instrumentação. Porém ali onde não é o reino da musicologia no sentido estrito, ali onde não agrava a uma «metalinguagem» passa a ser um parasita da música —«chave», «tom», «síncope»—, falar da música, oral o escrita, é um compromisso muito ambíguo como nos advém Adorno em sua Moda em Tempo de Jazz, talvez um ensaio superado por gênios formado nos clássicos, mas voltados ao jazz como nos comprova nesta composição: RITUAL de Keith Jarrett, compositor afro descendente e interpretado pelo pianista e maestro Dennis Russell Davies de descendência caucasiana.


Uma narração, uma crítica duma execução musical se empata menos do mundo sonoro real que do executante o da recepção por este público. É um recorte feito por analogia. Apenas podemos dizer nada que pertença à sustância desta composição. Uns quantos destemidos, Boecio, Rousseau, Nietzsche, Proust e Adorno entre eles, hão tratado de traduzir em palavras o tema da música e seus significados. Ocasionalmente hão deparado «contrapontos» metafóricos, modos de sugerir, simulacros de grosso efeito evocador sem dúvida, há nestes casos em que esses virtuosismos semióticos possuem mais sedução, «escapam desta questão» no sentido estrito da expressão. Válido apesar disso e, não passam de derivações.

E nisto convocando a supor que o que é inesgotavelmente significativo podendo também carecer de sentido mais explícito. Significado da harmonia está exatamente quando está sendo adimplida em sua desempenho e sua audição (há quem «escuta» uma composição quando se põe ler no silêncio sua “partitura” (o Texto), contudo, estes são pessoas quais privilegiados, uns dois ou quatro) tal como nesta tradução esmerada e primordial de Ponty:

Há uma passante
A rua ensurdecedora uivava ao redor de mim.
Magra, delgada, luto rigor, com dor majestosa,
Uma mulher passou, fazer com sua mão fastuosa

Se alçaram, oscilaram dobrado festão Amim;

Tão Ágil e nobre, perna alva de estátua.
Eu, crispado excêntrico qual, bebia chão
Sua olhar, céu pálido onde brota a furação,
À doçura que fascina e o prazer que mata.

Um raio… aceita, à noite!  Fugaz graça ao fundo,
Cujo olhar me há feito de pronto renascer,
Não volverei já a verte até a além-mundo?

Outra parte, mui longe de aqui! Mui tarde! Jamais!
Pois ignoro aonde vai, e não sabes onde vou,
Ah Tu, a quem eu tivera amado, Ah tu, sabias!

Porém que é o quem está ganhando, interiorizando, ao que se está respondendo? Que é o que nos põe em todos estes movimentos? Aqui chegamos a uma dualidade de «sentido» e de «significado» que a epistemologia, a hermenêutica filosófica e às investigações psicológicas terão sido quase inábeis de dilucidar.


Qualquer que seja à solução, à pergunta sobre origem de obra de arte se converte em pergunta sobre a essência da arte. Porém como nós devemos deixar aberta a questão de se a arte é como é geral, tratemos de reencontrar a sua essência da arte onde à arte indubitavelmente impera em sua realidade. Arte está em si na prória obra de arte, pois ela processe a própria existência. É intransferível às gerações duma formação cultural como bem prova esta bela composição de Duparc  L'Invitation au Voyage:



Minha delicada Irmã,
Pensa no alvorecer
Em que embraveçamos, num passeio,
Adorar a valer, amar e fenecer
No país que é a tua ideia!
Os sóis róscidos.

Desses céus nubilosos
A mim conservam a graça
Místico e atroz
Dessa visão infiel
Cintilando através do lamento.

Lá, tudo é paz e rigor,
Luxo, beleza e languidez.

Os movediços afáveis,
Pelas estações idas,
Enfeitariam o clima;
As mais raras fina flores
Embaralhando odores
A um âmbar líquido e ambiente,

Lares inauditos, Cristais infindos,
Toda uma pompa leste,
Tudo aí à alma
Pensaria em tranquilidade
Sua doce língua natal.

Lá, tudo é paz e rigor,
Luxo, beleza e languidez.

Viaja sobre os caminhos
Adormecer junto às docas
Barquinhos de caráter vagabundo;
É para receber
Teu menor deleite
Que eles vêm do fim do orbe.

- Os sanguíneos ocidentes
Regam as vertentes,
Os canis, toda a urbe,
E em seu douro os tece;
O mundo entorpece
Na tépida luz que o envolve.

Lá, tudo é paz e rigor,
Luxo, beleza e languidez.

Á tanto, devemos completar o curso deste círculo. Não é este um expediente ou uma deficiência. Os mais firmes sabem andar por esse caminho, e ficar nele sendo uma festa do pensamento, supõem de que o pensamento seja um oficio. Não só é um círculo ao passo principal da obra de arte, e o deste que exista obra, senão cada passo aprisionado que tentamos circundar neste círculo não passa dum Mito de Sísifo de Camus, ou seja, o estado cíclico da história.




Ao se encontrar à essência da arte que realmente está na obra, busquemos então na própria obra real e nos interrogaremos que é como sendo um imago do real.



As obras de arte são conhecidas por todo mundo. As obras de arquitetura e escultura se encontram nas praças públicas, ou nas igrejas e nas casas. Nessas coleções e exposições se depositam obras de arte das mais diferentes épocas e povos.

Se percebemos em sua intacta realidade, sem prejudicar, se demostrando que às obras são tão naturalmente existentes como todas coisas existentes. Um quadro exposto na parede é como um fúsil de caça ou guarda-chuva.

Uma pintura, por exemplo, de Oscar Arararipe que em seu quadro “Inocente a fumaça da Maria fumaça.” que representa uma locomotiva de conduzia de campesinos, afro decentes até o Imperador Dom Pedro II e seus decentes, e, serviu a transportar “indesejados” trazendo-nos uma vaga exposição de outra transfiguração da realidade.


Porém quiçá nos chocasse esta maneira tão tosca e superficial de percebermos o que seja à obra. Tal representação da obra pode há ter-lhe conservada ou cunhada do museu. Devemos, pois, tomar a obra de arte como daqueles que a experimentam e dela usufruem. A madeira na obra talhada. O colorido está no quadro como em Oscar Arararipe. À voz na obra falada ou escrita. O som permanece a música. O cozimento está tão para mutação na obra de arte que deveríamos dizer o seu contrário: Uma vez que à arquitetura está na pedra está intransponível. A pedra está para arquitetura como São Pedro para Vaticano. Como nos adverte Sartre: A existência precede a essência. Uma coisa inertemente o outro. Isto não se ressoa na arte.

Nestas obras destes Poetas se hão realizado a interior da poesia tão ricamente ou algo mais que à criação que Eric Ponty, tão talento prematuro foi brusco interrompido por outras vertentes, que se demonstraram numa falácia mineira como nos comprova o nascimento do novo milênio. ERIC PONTY nós lançando num novo dilema.



João da Penha, jornalista e professor aposentado, colaborou em publicações culturais como Encontros com a Civilização Brasileira, Cult e Tempo Brasileiro. Autor, dentre outros livros, de O que é existencialismo (Brasiliense, 2011, 17. ed.) e Períodos Filosóficos (Ática 2000, 4. ed.), traduziu para revistas e jornais poemas dos russos Sierguêi Iessiênin e Alieksandr Blok, e contos de José Maria Argüedas, Júlio Cortázar e Gabriel García Márquez, publicados em Os primeiros contos de dez mestres da narrativa latino-americana (Paz e Terra, 1978). Como ler Wittgenstein. São Paulo: Paulus, 2013. 


Nenhum comentário: