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sexta-feira, outubro 31, 2025

AS FLORES DO MAL - CHARLES BAUDELAIRE - NOVA TRADUÇÃO - ERIC PONTY

 https://clubedeautores.com.br/livro/as-flores-do-mal 

Embora Ponty mantenha uma alta fidelidade ao original, ele também adapta a linguagem de forma que é natural para leitores de língua portuguesa. Ele evita a literalidade extrema, que poderia resultar em uma tradução e artificial. Em vez disso, Ponty opta por uma abordagem que prioriza a fluidez e a acessibilidade, sem perder a complexidade do texto. Ponty escolhe palavras que, embora não sejam traduções diretas, capturam a essência do sentimento de posição e grandiosidade do poeta comparado ao albatroz. Eric Ponty consegue realizar uma tradução de As flores do Mal que respeita a obra original, ao mesmo tempo em que adapta a linguagem para que seja natural e fluida em português. Ele equilibra habilmente a fidelidade ao texto original com a necessidade de manter a fluidez e a acessibilidade, preservando o tom sombrio e decadente que define a poesia de Baudelaire. Esta tradução oferece aos leitores lusófonos uma experiência rica e envolvente, mantendo-se fiel ao espírito da obra original numa nova edição apurada.

 

quarta-feira, outubro 29, 2025

O SOL - CHARLES BAUDELAIRE - FLORES DO MAL - POEMA EXPURGADO - TRAD. ERIC PONTY

 Ao longo do antigo subúrbio, onde pendem nas cabanas
As persianas, abrigo de luxúrias secretas,
Quando o sol cruel bate com raios redobrados
Sobre a cidade e os campos, sobre os telhados e os trigos,
Eu vou me exercitar só na minha esgrima fantasiosa,
Fiscando em todos os cantos os acasos da rima,
Tropeçando nas palavras quais nos paralelepípedos,
Às vezes esbarrando em versos há muito sonhados.

Este pai nutritivo, inimigo das cloroses,
Desperta nos campos os vermes como as rosas;
Faz evaporar as preocupações para o céu,
E enche os cérebros e as colmeias de mel.
É ele quem rejuvenesce os portadores de muletas
E os torna alegres e doces quais meninas,
E ordena que as colheitas cresçam e amadureçam
No coração imortal que sempre quer florescer!

Quando, qual um poeta, ele desce às cidades,
Ele enobrece o destino das coisas mais vis,
E entra como rei, sem barulho e sem criados,
Em todos os hospitais e em todos os palácios.

CHARLES BAUDELAIRE- TRAD. ERIC PONTY



terça-feira, outubro 28, 2025

DOIS POEMAS - VICTOR HUGO - TRAD. ERIC PONTY

 A Coruja


E vi acima da minha cabeça um ponto preto.
E esse ponto preto parecia uma mosca na sombra.
E nada tinha limites e nada tinha número; 
E tudo se confundia com tudo; o Norte
E a noite formavam um único turbilhão. 
Algumas formas sem nome, larvas exaustas
Ou sopros negros, passavam nas nuvens surdas; 
E todo o resto estava imóvel e velado.
Então, subindo, subindo, subindo, voei em direção
àquele ponto que parecia recuar na névoa, pois é lei
do ser em quem o espírito se acende ir em direção ao
que foge e ao que se cala.
Ora, o que eu havia tomado por uma mosca era
uma coruja, triste, fria, sombria, e de sua pupila
Caía menos luz do dia do que da noite de suas asas. [...]

1º de janeiro de 


Quando criança, dirão mais tarde que o avô o adorava; 
que ele fez o melhor que pôde na Terra, 
que teve pouca alegria e muitos invejosos, 
que na época em que era pequeno ele já era velho, 
que não tinha palavras rudes nem ares taciturnos, 
e que ele os deixou na estação das rosas; 
Que ele morreu, que era um homem clemente; 
Que, no famoso inverno do grande bombardeio, 
Ele atravessava Paris trágica e cheia de espadas, 
Para lhes trazer montes de brinquedos, bonecas, 
E marionetes fazendo mil gestos engraçados; 
E vocês ficarão pensativos sob as árvores profundas.

 1º de janeiro de 1871

 

     ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA 

SONETOS - POESIA REUNIDA - WALTER BENJAMIN - TRADUÇÃO ERIC PONTY

 https://clubedeautores.com.br//livro/sonetos-19


 

Se tivesse profetizado sua morte para o mundo
A natureza o teria precedido na morte
Retornado com um comando inexorável
Estando no esquecimento eterno.


No céu havia suaves auroras da alvorada,
Na hora em que seu manto se esvaiu
As florestas estavam todas coloridas pela tristeza negra
A noite cobriu o mar em um barco silencioso.


Das estrelas formou-se uma tristeza sem nome
O monumento de seu olhar no arco celestial
E a escuridão com sua espessa parede nega.


A luz da nova primavera está se formando
A estação vê no estado silencioso das estrelas
Dessa cisterna refletora de sua morte.

WALTER BENJAMIN TRADUÇÃO ERIC PONTY

  

     ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

A FUNÇÃO DO POETA - I - VICTOR HUGO - TRAD. ERIC PONTY

 ¿Por que se exilar, ó poeta?
Na multidão onde o vemos?
O que são festas, caos sem raios
As festas, caos sem raios?
Em sua atmosfera contaminada
Morre sua poesia murcha;
O hálito deles rouba seu incenso.
Seu coração, em suas lutas servis,
É como os gramados da cidade
Roídos pelos pés dos transeuntes.
Nas capitais enevoadas
Não ouves com terror o clamor,
Como dois poderes fatais,
O povo e o rei se enfrentam?
Desses ódios que tudo desperta
De que adianta encher seu ouvido,
O poeta, ó mestre, ó semeador?
Tudo para o Deus que você nomeia,
Não se misture com esses homens
Que vivem em um rumor!

Ressoará, alma pura que apura,
No concerto pacífico!
Desabrocha, flor sagrada,
Sob os amplos céus do deserto!
Ó sonhador, busque os retiros,
Os abrigos, as discretas cavernas,
E o esquecimento para encontrar o amor,
E o silêncio para ouvir
A voz do alto, severa e terna,
E a sombra para ver o dia!

Vá para a floresta, vá para as praias!
Componha suas canções inspiradas
Com a canção das folhas
E o hino das ondas azuis!
Deus o espera na solidão;
Deus não está nas multidões;
O homem é pequeno, ingrato e vaidoso.
Nos campos tudo vibra e suspira.
A natureza é a grande lira,
O poeta é o arco divino!

Saia de nossas tempestades, ó sábio!
Deixe o império trabalhar para você,
Que faz sua perigosa passagem
Sem nenhuma bússola ou leme,
Como um navio que em dezembro
O pescador, das profundezas de seu quarto
Onde as redes secas estão penduradas,
Ouves a noite passar nas sombras
Com um ruído sinistro e sombrio
De mastros trêmulos e pendentes!

VICTOR HUGO - TRAD. ERIC PONTY

 

    ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

segunda-feira, outubro 27, 2025

CARTAS DE CHARLES BAUDELAIRE - TRAD. ERIC PONTY

 https://clubedeautores.com.br//livro/cartas-de-charles-baudelaire

Essa correspondência é, acima de tudo, um drama no qual Baudelaire é ao mesmo tempo o autor, o diretor e o ator. Essa é, sem dúvida, a razão pela qual ela nunca foi relegada à categoria de parafernália biográfica pelos defensores da própria obra. É de fato uma correspondência, no sentido que normalmente atribuímos à palavra? O leitor hipócrita que souber lê-la fraternalmente responderá que é uma obra, e talvez a mais existencial de Baudelaire. Ela transforma uma vida em um destino. A presente edição contém cartas e testemunhos e abrange o período de janeiro de 1832 a fevereiro de 1866. 

  
  ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

CORRESPONDÊCIA DE CHARLES BAUDELAIRE - TRAD. ERIC PONTY

 10. — A Alphonse Baudelaire [1840] [Paris.] 
Meu bom irmão, creio ter falhado gravemente na cortesia fraternal ao não lhe escrever desde que estou em Paris. Deveria ter escrito a você e à minha irmã para agradecer pela magnífica hospitalidade que recebi lá. Mas o costume do dia de Ano Novo, independentemente do que se diga e das piadas que se façam [ tir], tem a sua utilidade, pois obriga as pessoas a dizerem coisas muito carinhosas que pensam e que apenas a preguiça as impedia de escrever. É por isso que desejo a ambos um ano doce e bom, tranquilo e alegre com os seus amigos. Peço que diga o mesmo ao Sr. Rigaut, que é um homem gentil, e também ao seu pobre pintor. Acredito que você ficaria bastante satisfeito em saber como passo meus dias em Paris. Desde que você me mandou de volta para cá, não fui à escola nem ao advogado, tanto que reclamaram que eu não ia muito. Mas, em 1841, fiz uma reforma geral na minha conduta. Este ano, tive o prazer de enviar música para minha irmã. Entregue a ela em meu nome. Como músico profundo que sou, escolhi o álbum cujas vinhetas eram as mais bem desenhadas. Quanto a você, que é meu irmão, não lhe dou nenhum presente, a não ser um magnífico chapéu que acabei de criar e que poderá fazê-lo rir. Isso é o que se chama de presente poético.

Há palavras castas que todos nós profanamos: 
Os amantes do incenso fazem um estranho abuso 
Não conheço ninguém que não adore algum anjo. 
Acho que os que estão no Paraíso não têm muita inveja.

Esse nome sublime e doce não deve ser dado 
(Somente a corações belos, puros, virgens e imaculados. 
Veja! Um pouco de lama pende de tua asa 
Quando teu anjo ri e se senta em teu colo.

Eu, quando eu era criança, minha tolice ingênua - 
- Uma garota tão ruim quanto bonita - 
Eu a chamava de meu anjo. Ela teve cinco amantes.

Pobres tolos! Com tanta sede que estamos sendo afagados  
Que eu ainda gostaria de abraçar alguma mulher jocosa 
A quem dizer: meu anjo -, entre dois lençóis muito alvos.

CHARLES BAUDELAIRE - TRAD. ERIC PONTY

 

domingo, outubro 26, 2025

AO LEITOR - CHARLES BAUDELAIRE - TRAD. ERIC PONTY

A estupidez, o erro, o pecado, a mesquinhez 
Ocupam nossas mentes e trabalham nossos corpos,
E alimentamos nossos remorsos amáveis, 
Como os mendigos alimentam teus vermes.

Nossos dolos são acintosos, nossos pesares covardes, 
Cobramos caro por nossas confissões,
E voltamos alegres ao caminho lamacento,
Crendo choros vis podemos lavar nossas manchas.

No travesseiro do mal, é Satanás Trismegisto
Que embala longamente nosso espírito
encantado, E o rico metal de nossa vontade
É todo vaporizado por esse químico habilidoso.

É o Diabo que segura os fios que nos movem!
Encontramos encantos em objetos repugnantes; 
A cada dia descemos um passo em direção ao Inferno, 
Sem horror, por meio das trevas fétidas.

Assim como um pobre libertino que transa e come o
seio martirizado de uma prostituta antiga,
Roubamos de passagem um prazer clandestino
Que esprememos com força como uma laranja velha.

Apertado, fervilhante, como um milhão de vermes,
Em nossos cérebros se agita um povo de demônios,
E, quando respiramos, a morte em nossos pulmões
Desce, rio invisível, com tuas queixas surdas.

Se o estupro, o veneno, a adaga, o incêndio,
Ainda não bordaram seus agradáveis desígnios 
No tecido banal de nossos destinos lamentáveis,
É porque nossa alma, infeliz, não é ousada o regular.

Mas entre os chacais, as panteras, as cadelas,
Os macacos, os escorpiões, os abutres, as cobras,
Monstros que gritam, uivam, rosnam, rastejam 
No infame zoológico dos nossos vícios,

Há um mais feio, mais malvado, mais imundo!
Embora não faça grandes gestos nem grites, 
Transformaria de bom grado a Terra em escombros
E, num bocejo, engoliria todo esse mundo;

É o Tédio! Com os olhos cheios de lamentos involuntários, 
Ele sonha com cadafalsos enquanto fuma seu narguilé.
Tu o conheces, leitor, esse monstro delicado.
— Hipócrita leitor — meu semelhante — meu irmão!

 CHARLES BAUDELAIRE - TRAD. ERIC PONTY


 


Les Conquérants de l’Or - II - José-Maria de Heredia - Trad. Eric Ponty

 Dois anos haviam se passado, quando um soldado abstruso
Que desde então foi nomeado marquês por sua conquista,
François Pizarre, ousou fazer o pedido
Para armar um galeão para navegar além de
Puerto Pinas. Então Pedrarias d'Avila
o fez entender que, naquele momento
Não era sensato tentar a aventura
E seus perigos sem número ou lucro; além disso,
Que não lhe agradava ver que os melhores
De todos os seus homens de guerra, em aventuras tolas,
Prodigalizavam o sangue das veias espanholas,
E que ninguém antes dele, dentre tantos cavaleiros,
Tinha triunfado sobre os mangues
Que nestas costas cruzam seus nós inextricáveis;
Que, tendo a tempestade despedaçado estaleiros e cabos
Em vão se aventuraram em seus navios,
Voltaram moribundos e desamparados,
E ainda muito felizes por terem salvado suas vidas.

Mas esse conselho só serviu para aguçar seu apetite.
Foi assim que Diego d'Almagro, por contrato,
tendo reunido suas riquezas e suas armas,
E Dom Fernão de Luque tendo fornecido as somas,
No ano de mil quinhentos e vinte e quatro, com cem homens,
Pizarro, o primeiro, em uma manhã nebulosa
De novembro, montando um mau brigue,
Fez-se ao mar e lançou toda a sua lona ao vento,
Confiou prontamente em seu fadário da sorte.

Mas, a princípio, tudo parecia desmentir sua esperança.
O vento tornou-se tempestuoso, e até o céu negro
O mar terrível, inchando suas ondas escuras,
esmagou as vigias, quebrou os mastros e a âncora,
e deixou o triste navio tão esfarrapado quanto uma jangada.
Enfim, após dez dias de angústia, com falta de água
E comida, com sua tripulação muito cansada,
Pizarro desembarcou em uma costa baixa.

Na borda, os mangues formavam uma longa treliça;
Mais acima, um bosque impenetrável e esplêndido
De lianas floridas e trepadeiras,
A margem do rio subia em suaves declives
Em direção à distante e escura linha das florestas.
E esse país não era nada além de um vasto pântano.


Estava chovendo. Os soldados ficaram convulsos
Com o assédio venenoso dos mosquitos
Que escureciam o céu com enxames zumbindo,
Pisam com horror nesses baixios insalubres,
Novos répteis e insetos estranhos,
Ou viram surgir lagoas vis,
Em suas barrigas escamadas envolvendo um pé retorcido,
Esses lagartos monstruosos que chamamos de jacarés.
E quando a noite chegava, na terra encharcada,
Em suas capas, ao lado da espada inútil,
Quando se deitavam sem nada para comer
Do que raiz amarga ou pimenta rubra,
Sobre o grupo adormecido desses buscadores de império
Flutuava, crepe vivo, o voo suave dos vampiros,
E aqueles que eles marcavam com seus beijos peludos
Dormiam tão fortemente que não acordavam mais.

É por isso que os soldados, pela força e pela oração,
Forçaram seu líder a voltar atrás,
E, apesar de si mesmo, dando um adeus eterno
Ao triste arraial do porto de Saint-Mathieu,
Pizarre, pelo mar recém-aberto,
Com Bartolomé seguindo a descoberta,
Em um único brigantino de calado raso
Voltou a navegar, passando por Punta de Pasado,
O bom piloto Ruiz teve uma sorte notável,
O primeiro dos aratus a cruzar a linha
E progredir mais para o sul no mundo ocidental.

A costa se apartou, e as árvores de sândalo
exalavam sua brisa perfumada sobre o mar.
Uma leve fumaça subia de todos os lados,
E os alegres marinheiros, encostados nas cobertas,
viam os rios brilharem em fitas tortuosas
Pelo campo e ao longo das praias
Fugindo dos campos cultivados e caindo pelas aldeias.

Depois, abraçaram a costa mais de perto,
Para seus olhos atônitos, as florestas surgiram.

Ao pé dos vulcões mortos, sob a zona de cinzas,
O ebenier, o gayac e os palissandres duros,
Até os limites azuis dos últimos horizontes
Rolando a corrente escura da folhagem verde,
Variada em folhagem e variada em essência.


Espalhando brio de sua magnificência;
E de norte a sul, de leste a oeste,
Cobrindo toda a costa e todo o continente,
Onde quer que os olhos pudessem alcançar, os galhos
Continuavam com um murmúrio eterno
Como o som dos mares. Sozinho, nessa moldura negra
Brilhava um lago, um espelho imóvel
Onde o sol, mergulhando no meio dessa sombra,
Fez um grande buraco dourado na vegetação escura.

José-Maria de Heredia - Trad. Eric Ponty

 

    ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

CINCO POEMAS - VICTOR HUGO - TRAD. ERIC PONTY

 Janeiro voltou. Não tema, nobre mulher!
Não se importe com o ano que está passando 
e com aqueles que passarão!
Meu amor sempre jovem está florescendo em minha alma;
Sua beleza sempre jovem está em flor em sua fronte.
Seja sempre séria e gentil, ó tu que eu idolatro;
Que tua humilde auréola deslumbres os olhos!
Qual leite puro alastrado em um vaso de alabastro,
Encha seu peito religioso de dignidade.
Resista à passagem do tempo. Tua beleza o protege.
Enfrente o inverno. Logo maio estará de volta.
Deus, para apagar a idade e derreter a neve,
nos devolverás a primavera e nos deixarás o amor.

1º de janeiro de 1842.


Eu estava contando uma história
Para quatro ou cinco crianças, um público seleto,
E eu estava, eu acho, no seguinte ponto:
"... Em um momento em que Deus estava de costas, o diabo
Entrou, silencioso e amigável,
Como muitas vezes faz, por trás do bom Deus;
Ele cortou um pedaço de tecido azul do céu,
E, para ocultar o buraco, colocou uma nuvem sobre ele... "
Jeanne me interrompeu. - Vamos, Jeanne, comporte-se,
disse George, interessado no demônio e em Deus;
Estamos ouvindo, fique quieta. - Jeanne não se incomodou com isso.
- Pensei que o céu fosse feito de seda", disse ela.



Eu o amo, com seus olhos cândidos e seu ar masculino,
Seu lenço siamês e seu pescoço bronzeado,
Com seu riso e sua alegria,
Entre a Liberdade, rainha dos olhos orgulhosos,
E a Fraternidade, doce anjo abrindo suas asas,
Minha igualdade camponesa!

Todos os homens são homens; e não mais do que os céus
A lei não tem margens;
Minha liberdade sombria sente o peso anômalo
De toda servidão.
Com cada prisioneiro eu me sinto encerrado;
Suas correntes são nossas;
Guerra contra os reis! Libertação! Um povo oprimido
Oprime todos os outros.


A estação está amainando,
As sombras se tornam mais longas, 
do azul se desvanece,
O vento se refresca na colina,
O pássaro treme, a grama está fria.

Agosto luta contra setembro;
O oceano não tem mais ancião;
Cada dia perde um minuto,
Cada amanhecer lamenta um raio.

A mosca, como se estivesse presa,
Está imóvel em meu teto;
E como um floco de neve branco,
Pouco a pouco, o verão se derrete.

VICTOR HUGO - TRAD. ERIC PONTY

 

    ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

A VÓS, REIS. - VICTOR HUGO - TRAD. ERIC PONTY

Quando os cristãos foram condenados aos leões na antiguidade
Pelo levita e pelo pretor, tratados para defender
Uma causa idólatra,
Eles foram em frente, enquanto o vasto Coliseu
Milhares de pessoas reunidas os observavam, 
e eles caíram em meio ao grito do aplauso do "povo".
Na véspera daquele dia de suas noites, o último!
Nos portões de suas masmorras, um maravilhoso repasto,
Rico, sem restrições, sem preço,
Para que os condenados pudessem (por assim dizer) 
ganhar força antes de sangrar, com um dó ignorante, 
os carcereiros se alastrar-se para os mártires de Cristo.
Oh, era estranho para um aluno de Paulo reclinar-se
Em um sofá voluptuoso, enquanto o vinho Falerniano    
Enchia sua taça até a borda!
Música dulcíssima da Grécia, repouso asiático,
Fragrância picante da Arábia, rosa italiana,
Tudo unido para ele!
Todo luxo versado na vasta extensão da Terra,
Em profusão obtidos, foram postos para realçar
O repasto que lhe davam;
E nenhum sibarita, aleitado no colo do deleite,
Que tivesse provado um festim qual que auferiu naquela noite
Os eleitos da sepultura.
E o leão, enquanto isso, sacudia sua pesada corrente,
O tigre uivava alto e ferozmente, frenético por manchar
A arena sedenta de sangue;
Enquanto as mulheres de Roma, que vitoriaram esses feitos
E que cortejavam o gozo vindouro, devem
Envergonhar a hiena punge.
Elas que figuraram qual convidadas naquela véspera derradeira,
Por sua vez, no dia seguinte, estavam esperados a dar
Aos leões seu sustento;
Pois eis que, sob o disfarce de um servo naquela leira,
Onde suas vítimas fruíam de tudo o que a vida pode dar,
A morte estava gerindo.
Assim, ó monarcas da terra, foi seu festim de poder,
Mas o toque de finados atroou em sua hora festiva.
É seu axioma que soa!
Para o tigre popular está exigida uma presa,
E a boca da fome republicana se nutrirá
Em um festim de reis!

VICTOR HUGO - TRAD. ERIC PONTY

 

    ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA 

MOISÉS NO NILO. - VICTOR HUGO - TRAD. ERIC PONTY

 ("Minhas irmãs, a onda está mais fresca.")

{PARA OS JOGOS FLORAIS, 
Toulouse, 10 de fevereiro de 1820}.

"Irmãs! A onda é mais fresca no raio
Da jovem manhã; os ceifeiros estão dormindo;
A margem do rio é solitária: venham!
Os primeiros murmúrios da velha Memphis se arrastam
Desmaiam em meu ouvido; e aqui, sem sermos vistos, 
nos afastamos no fundo do bosque,
A não ser pelo olhar orvalhado da aurora.
"No palácio de meu pai, belo de se ver,
Brilham todas as artes, mas oh! esta margem do rio,
Com flores alegres, é muito mais caro para mim
Do que vasos de ouro e pórfiro brilhantes e amplos;
Que alegria no céu o canto dos pássaros!
Mais doces esses zéfiros flutuam do que todas as chuvas
De odores caros em nossos caramanchões reais.
"O céu é puro, a corrente cintilante é clara:
Soltem suas zonas, minhas donzelas, e se joguem
Para flutuar um pouco sobre estes arbustos próximos
Suas vestes azuis e transparentes: tirem minha coroa,
E tirem meu véu ciumento, pois aqui
Hoje ficaremos alegres, enquanto nos movemos
Nossos membros em meio ao murmúrio da onda.
"Apresse-se; mas através das brumas felpudas da manhã,
O que estou vendo? Olhem ao longo do riacho!
Não, donzelas tímidas - não devemos voltar!
Parece que, ao longo da torrente
Uma palmeira antiga, travessa ao mar fundo,
Que do deserto distante procede,
Para baixo, para ver nossas maravilhosas pirâmides.
"Mas, se posso confiar em meus olhos, -
É a casca de Hermes, ou a concha
De Íris, levada suavemente pelos suspiros
Da brisa leve ao longo da ondulação;
Mas não: é um barco onde repousa docemente    
Um bebê dormindo, e seu descanso tranquilo
Parece que está no peito de sua mãe.
"Ele dorme - oh, veja! Seu pequeno leito flutuante    
Nada no fluxo inconstante do poderoso rio,
Em um ninho de pombas brancas; e lá, em perigo, foi conduzido
Pelos ventos fracos, e vagando para lá e para cá,
O berço desce; sob sua cabeça tranquila
Os golfos se movem, e cada onda ameaçadora    
Parece embalar a criança em um túmulo.
"Ele acorda - ah, donzelas de Mênfis! Depressa, oh, depressa!
Ele chora! Ai de mim! Que mãe poderia confiar
Que mãe poderia confiar sua prole aos restos ferinos e aquosos?
Ele estende seus braços, a maré ondulante
Murmura ao seu redor, onde tudo está rudemente colocado,
Ele descansa apenas com alguns frágeis juncos por baixo,
Entre a inocência indefesa e a morte.
"Oh! levem-no para alto! Talvez ele seja um daqueles
Dos sombrios filhos de Israel, que, meu senhor, proscreve;
Ah! cruel foi a ordem que se ergueu
Contra a mais inocente das tribos estrangeiras!
Pobre criança! Meu coração anseia por seus sofrimentos,
Eu gostaria de ser sua mãe; mas darei    
Se não seu surgimento, pelo menos o direito de viver."
Assim falou Ífis; a esperança real e o orgulho
De um grande monarca; enquanto suas donzelas se abordavam,
Vagueavam ao longo da margem sinuosa do Nilo;
E essas belezas amainadas, ao lado
A mãe trêmula, observando com olhos arregalados
Sua graciosa senhora, admirando-a como estava,
Mais bela que o gênio do dilúvio!
As águas quebradas por seus pés meigos    
Recebem o ávido banhista, que sozinho
Guiada pelo mais gentil dó, ela se esforça para achar
O bebê acordado; e, veja, o prêmio foi ganho!
Ela segura o fardo choroso com um doce
E um brilho virginal de orgulho em sua fronte,
Que até agora não conhecia outro rubor senão o da modéstia.
Abrindo com mãos cautelosas o leito de junco,
Ela levou o bebê resgatado devagar para fora
Para além das areias úmidas; ao seu ajuntamento
Suas donzelas curiosas correram ao redor
Para beijar a testa do recém-nascido com um toque gentil;
Felicitando a criança com sorrisos e dobrar para perto
E puxando seus rostos sobre seus grandes olhos atônitos!
Apresse-se que, de longe, em dúvida e medo,
Observa, com os olhos tensos, o menino destinado
O amado dos céus! Aproxime-se como um estranho,
E abraça o jovem Moisés com alegria maternal;
Nem teme que a fúcsia e o silêncio
Traiam sua carinhosa e oculta reivindicação,
Pois Iphis ainda não conhece o nome de uma mãe!
Com um coração alegre e um rosto triunfal,
A princesa levou ao altivo Faraó    
O humilde bebê de uma raça odiada,
Banhado com as lágrimas amargas que um pai derramou;
Enquanto o som alto ressoava no lugar sagrado
Do trono branco do Céu, a voz dos coros de anjos
Intuía o tema de suas liras eternas!
"Não lamente mais sua andança na terra;
Ó Jacó, não deixe que suas lágrimas aumentem
A torrente do rio egípcio: Eis!
Logo, nas margens do Jordão, habitarão tuas tendas;
E Gósen verá teu povo partir
Apesar do poder da lei e da marca do Egito,
De sua triste servidão para a terra nubente de Canaã.
"O Rei das Pragas, o Escolhido do Sinai,
É aquele que, sobre as águas impetuosas, foi conduzido,
Uma mão possante resgatou para o céu;
Vós, cujos peitos briosos renegam os caminhos do céu!
Atendei, sede humildes, pois seu poder está próximo
Israel, um berço redimirá seu valor.
Um berço ainda salvará a terra espalhada!"

 VICTOR HUGO - TRAD. ERIC PONTY

 

     ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

sábado, outubro 25, 2025

Les Conquérants de l’Or - I - José-Maria de Heredia - Trad. Eric Ponty

 Depois de Balboa, conduzindo seu bom cavalo
Por meio de bosques não lavrados, para alto e para baixo,
Do outro lado destas altas Cordilheiras,
Pisoteou o lodo quente das costas insalubres
Do istmo que compartilha com suas gigantescas montanhas
A imensidão sombria dos dois grandes oceanos,
E que ele, lançando-se nele armado a partir da costa,
Plantou seu estandarte na espuma virgem,
Todos os aventureiros, cujos espíritos estavam inflamados,
Sonharam, ao chegar ao porto do Panamá,

Para achar uma esperança gananciosa e admirável,
Para as margens douradas do Pacífico,
O prometido El Dorado que fugiu diante deles,
E, permutando sonhos monstruosos com ouro,
Para forçar até o fundo dessas zonas tórridas
A amarga virgindade das amazonas
Que a raça dos heróis não havia conseguido domar
Para derrubar os deuses obstinados
E derrotar, verdadeiros filhos de seu ancestral Hércules
Os povos da Aurora e os do Crepúsculo.

Eles sabiam que, enfrentando esses ilustres perigos
Chegariam às margens onde germinam os berilos
E Doboyba, com suas ricas ravinas,
Com o vasto colapso de templos em ruínas
A necrópole dourada dos príncipes de Zenu;
E ainda seguindo a passagem desconhecida
Para a Índia, além das Ilhas das Especiarias
E a terra onde borbulha no fundo dos báratros
Em um leito de prata fina, a Fonte da Saúde
Eles veriam, subindo em um céu enlevado
Até o zênite torrado com o fogo das pedras preciosas,
Cintilantes ao sol, os encantos vivos
Serras de esmeralda e picos de safira
Que ocultam a antiga e fabulosa Ophir.

E quando Vasco Nuñez pagou com sua cabeça
O orgulho de ter tentado essa grande conquista,
Perseguindo após ele essa miragem fascinante,
Apesar de sua morte, a flor dos gentis, usando
O galhardete de Castela esquartejado pela Áustria,
Chegou às profundezas dos bosques de Côte-Riche
Pelo meio da horrível montanha ou navegando
Ao longo dos recifes negros que cercam Verágua,
E em direção ao leste, apesar dos grandes naufrágios,
As margens onde o Orinoco, inchado pelas chuvaradas,
Imergindo um imenso horizonte com sua lama,
Sob o brilho febril de um céu carregado de veneno,
Deságua no mar por suas cinquenta bocas.

Enfim, uma centena de compartes, todos de boa estirpe
Embarcaram com Pascual d'Andagoya
Que, prosseguindo ainda mais em sua rota, navegou ao longo
O golfo onde surge o Oceano Pacífico,
Virou para o sul, contornou a Ilha das Pérolas
E seguiu em frente a toda vela,
Tendo assim, entre os colonizadores da época,
Ter sido o primeiro a desbravar novos mares
Com as esporas de pesadas caravelas.

Mas quando, dez meses estava doente e desconsolado,    
Tendo navegado por toda parte sem lucro
Em direção a esse El Dorado que era apenas um mito vão,
Afrontou a morte cem vezes, excedeu o limite
Do mundo, tendo perdido quinze soldados em vinte,
Em seus navios quebrados Andagoya retornaram,
Pedrarias d'Avila ficou muito zangado;
E aqueles que, de acordo com a história popular,
Fidalgos e homens da estrada, haviam se reunido
No Panamá, foram irresolutos pelo golpe.

Ora, os senhores, vendo que duramente poderiam
Empregar suas pessoas em ações de guerra,
partiram para o México; mas aqueles que, sem nada,
tinham vindo tentar a sorte nas praias de Darien,
Querendo driblar a indesejável miséria,
O que vale um grande peito para vencer a fortuna,
Discutindo os mais belos sonhos com o ânimo vazio,
Com suas espadas ociosas e suas capas em farrapos,
Embora fossem todos bons aratus ou velhos bateristas,
Notando as ondas se agitarem na enseada,
Confiando que um líder ousado os comandasse.

José-Maria de Heredia - Trad. Eric Ponty

  

    ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

Sonetos - José-Maria de Heredia - Trad. Eric Ponty

 A Centaura


Na outrora, por bosques, rochas, riachos e vales
Vagueava o brioso rebanho dos incontáveis centauros;
Em teus flancos, o sol brincava com a sombra,
Eles baralhavam crinas negras com nossos cabelos loiros.

O verão floresce a grama em vão. Nós a pisamos
Sozinhos. Cerrado rasteira abarca a toca deixada;
E às vezes eu me encontro, na noite quente e escura,
Tremendo com o convocado distante dos garanhões.

Pois a raça diminuía dia a dia na margem,
Dos filhos prodigiosos gerados pela Nuvem,
Abandona-nos, acossa a Mulher sã que peca.

É que o amor, mesmo pelos brutos, nos arrebata;
O grito que nos arranca é um relincho de um eco,
E teu desejo apenas nos abraça; não nos desata.

Centauros e Lapitas


A multidão nupcial corre para o banquete,
Centauros e guerreiros ébrios, ousados e belos;
E a carne heroica, no reflexo das tochas,
Mistura-se com velo ardente dos filhos da Nuvem.

Risos, tumulto... Um grito! A Noiva poluída,
Premida por um peito negro, sob a púrpura esfarrapada,
Luta, e os anéis de bronze com choque dos cascos,
E a mesa desaba com as vaias vindas quais ecos.


Então, aquele para quem o mais alto é um anão,
se levanta. Em seu crânio, um focinho leonino
com garras e crinas douradas. É Hércules.

E de uma ponta a outra da enorme sala,
Domados pelo terrível olho onde a raiva ferve,
O rebanho monstruoso recua, se serve.

Fuga do centauro


Eles fogem, ébrios de homicídio e rebelião,
Para a montanha íngreme que protege teu retiro;
O medo os apressa, sentindo a morte pronta
E sentem o cheiro do leão no crepúsculo.

Eles se cruzam, pisando em hidras e estelionato,
Ravinas, torrentes, cabrestos, imparáveis;
E já, no céu, ergue-se ao longe a crista
De Ossa, Olimpo ou o negro Pelion.

Às vezes, um dos membros em fuga da manada feroz
De repente se levanta, se vira, olha, e se ergue,
E em um único salto se junta ao gado fraterno;

Pois ele viu a lua cheia e deslumbrante
Deitada atrás deles, espantalho supremo,
O horror gigantesco da sombra hercúlea.


O nascimento de Afrodite

Antes de tudo, o Caos envolvia os mundos
Onde o Espaço e o Tempo rolavam sem medida;
Então Gaia, favorável a seus filhos, os Titãs,
Dar seu grande ventre com teus seios frutíferos.

Eles caíram. O Styx os cobriu com tuas ondas.
E nunca, sob o éter do relâmpago, a primavera
Brilhado os sóis brilhantes,
Nem o generoso verão madurou as belas colheitas.

Ferozes, ignorantes do riso e dos jogos,
Os Imortais sentavam-se no Olimpo nevado.
Mas o céu fez chover o orvalho viril;

O oceano se abriu, e em tua nudez
Radiante, emergindo da espuma ardente.
No sangue de Ouranos floresceu Afrodite.

José-Maria de Heredia - Trad. Eric Ponty

  

   ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

MIGUEL DE UNAMUNO - TRAD. ERIC PONTY

 0FERTORIO

A mi querido amigo Pedro Eguillor


Não é dos Apeninos, nos contrafortes do leste, 
de Archanda, nossa Archanda, que alegra a noite 
que peguei neste verão, por bem ou por mal 
rosas frescas em um campo de esmeralda.

Que bom que o sol não sobe lá 
as montanhas me concederam esse desperdício 
de sonetos; eu os fecho com o broche 
deste ofertório e os entrego a você, guirlanda. 

Eles vão para o Nervión a partir da costa 
este do Tormes; para aquele meu Vizcaya 
levando comigo das solidões de Castela.

Não com um arado, mas com uma pá; 
guarde-as para mim em tua cadeira abrigada 
para o caso de um dia minha fé fraquejar.

POSTA DE SOL


Sabeis qual é o tormento mais feroz? 
É o de um orador que se torna mudo; 
o de um pintor, supremo no nu, 
tremendo em tuas mãos; perder teu talento.

Estando diante dos néscios, e é quando 
em que a luta se faz de mais difícil, 
apenas para se achar sem lança e escudo, 
enchendo esse o inimigo de alegria.

Ser envolvido pelas nuvens do pôr do sol 
quando, afinal, nosso sol ofuscar-se 
é pior do que morrer. Passo terrível.

Sentir nossa mente desmaiar! 
Será que nosso pecado é tão terrível assim? 
que mereça o martírio de Luzbel?

FELIX CUlPA!

 

A árvore da vida está repleta de frutos 
e ficar na frente da árvore do conhecimento 
repleta de flores de essência aromática 
por Deus a nossos pais proibidas.


Mas o lucro por causa do prazer olvida 
a mulher, e abusando de tua inocência 
o homem dá - feliz anarquia - a flor do aviso, 
que nos convida então a mais conhecimento.

Desde então, o pagamento do imposto 
de nossa morte é o eixo da vida; 
a alma se envolve faz em luto cristão.

Entregamos o sacrifício com relutância 
da virtude para colher teus frutos, 
enquanto o vício floresce perfumado!

MIGUEL DE UNAMUNO - TRAD. ERIC PONTY

 

    ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

sexta-feira, outubro 24, 2025

TROPHÉES - JOSÉ-MARIA DE HEREDIA-TRAD. ERIC PONTY

 ESQUECIMENTO


As ruínas do Templo se espalham por todo o pontal,
Em cujas alturas de bronze heróis de bronze minguam,
Com deusas de mármore, de cuja glória é vã 
A grama tênia abriga ternamente da vista.

Somente às vezes um pastor descuidado, que,
Levando seu rebanho a beber, canta uma velha 
cepa que nós inundamos os céus até o fundo,
Mostra forma escura contra o azul sem limites.

A Terra, doce mãe dos Deuses de outrora, 
Na primavera, vã e eloquentemente tece 
Em torno desta capital de folhas de acanto;

Mas o homem, não mais assisado por sonhos antigos,
Ouve sem tremor, nos imos da meia-noite,
O mar em luto, por tuas sirenes perdidas, chorar.

Neméia


DESDE QUE o domador solitário na floresta sombria 
ousou procurar cada rastro assustador, 
rugidos retumbantes contaram o abraço feroz.
Agora o sol se põe, e o silêncio embala os ouvidos.

O pastor em direção a Tirynthus foge com medo 
Pelo meio de arbustos, e freios com passo célere, 
E vê, olhos esbugalhados do lugar de tuas órbitas, 
O monstro fulvo na borda dessa floresta atrás.

Ele grita. Ele viu o terrível terror de Neméia, 
Contra o céu vermelho-sangue teu maxilar armado,
Com a crina desgrenhada e as presas malignas.

Pois então o crepúsculo misterioso se aproxima, 
Grande Hércules, em torno dele a pele flutuante,
Homem mexido com fera, cresce um herói admirável.

STYMPHALUS


Em toda parte, à sua frente, milhares de pássaros,
Da margem lamacenta onde o herói corre,
Voaram, como uma súbita rajada,
Sobre o lago sombrio, cujas águas banhavam.


Outros, de um voo mais baixo, cruzaram redes negras,
Roçaram a fronte beijada pelos lábios de Opala,
Quando, ajustando a flecha triunfal ao nervo,
Arqueiros soberbos, pisam pelos pântanos.

Daí em diante, com flechas cravadas, 
Com nuvem receosa derrama um dilúvio horrendo, 
Aos gritos gritantes, raiados ardentes de levina chacina.

Por fim, o Sol vê, por meio da espessa nuvem, 
as aberturas feitas pelas hastes de Hércules,
O herói lavado de sangue sorrindo para o céu.

JOSÉ-MARIA DE HEREDIATRAD. ERIC PONTY

 

   ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

LXII – Franciscæ meæ laudes - Charles Baudelaire - Trad. Eric Ponty

 

Cantarei para ti com novas cordas, 
ó pequena canção, que tocas 
nesta solidão do teu coração.

Envolve-te em grinaldas, 
ó mulher delicada, por meio 
da qual pecados são expiados!

Como benfeitor Lete, 
gostaria de atrair beijos de ti, 
que estás imbuída de magnetismo.

Quando a tempestade dos vícios 
moveu todas as passagens, 
Tu apareceste, ó Divindade,

Como uma estrela salvadora 
nos naufrágios do amor... 
Penderei o meu peito nas tuas asas!

Piscina cheia desta virtude, 
Fonte da eterna juventude, 
dá voz aos lábios dos mudos!

O que era imundo, queimaste-o; 
O que era bruto, refinou-o; 
O que era frouxo, fortaleceu-o.

Na fome, a minha taberna, 
na noite, a minha lamparina, 
guia-me sempre impecável.

Agora majora à força, 
doce banho com os doces 
dos aromas de pomadas!

Enrola a mica na minha cintura, 
ó peitoral da castidade, 
tingido de água seráfica;

Tigela a brilhar com valiosas, 
pão salgado, carne macia, 
vinho divinal, Francisca!

Charles Baudelaire - Trad. Eric Ponty

  

  ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

LES ESTUAIRES D'OMBRE - ANDRÉ FONTAINAS-TRAD. ERIC PONTY

 Inhorruit unda tenebris 
VIRGILE



Aurora vã! Se lágrimas velam um sorriso, 
São presságios das nossas fugas de alegrias? 
Olhos de outra pessoa veriam seguir jogo de cerdas? 
Em breves arrepios ao longo das paredes de pórfiro? 

Mas nenhum gesto que o amanhecer ainda não reflita
No fantástico disperso que tu exibi 
Ou, verbo, não se grave em hinos, jovens presas 
A promulgar: nada é, a não ser escrever. 

Uma névoa envelhecida agoniza no pilar, 
E lá se esgota a voz rouca de angústia sufocante 
Para se sentir surgindo diante das ofensas atrelar. 

Nos portos dourados de outrora, onde se curvava 
Corinto Nenhum efebo navega em votos de alma nova 
Rumo às pelagens selvagens que a aurora revela.

II 

Ó Pastor, se com dedos frágeis alisas 
A malsana lã noturna das ovelhas, 
Oh! É um sorriso que cintila como mil rubis 
Cuja aurora se estrela, e delícias lânguidas. 

No entanto, a sombra. A noite torna as melissas mais pesadas. 
Hora dos aromas, ninguém sabe se sofres de angústia, 
o feixe de angústia onde estão, preparados, 
As espadas afiadas de um ardil onde tu enfraqueces.

 Ainda a sombra, e que alvorecer teria explicado o céu negro?
 A sombra: sob a colina está a floresta, ameaça 
Feitiços prontos para destruir a esperança. 

Na escuridão, onde o horror persistente se agita 
Da alma que foi Tu, pastor loiro, aos rumores 
Espalhadas pelos arbustos da Noite, assim morre.    

III 

O gelo: viver livre na ira do inverno, 
Rumor que se reflete no vidro da manhã,
Onde, talvez, vibra efémera a élitro a ir,
De tal voo ou de sopro espesso de menu - vair. 

O céu cinzento se abriu! Para si mesmo semiaberto: 
Não é verdade que uma mitra flui pela fronte sombria? 
Não! Nobreza senil onde ninguém foge a um título 
A mentir menos vil do que rasteja o verme. 

A hora segue a hora, nenhuma é única: 
Semelhante a si mesma, eis que vem aquele que a envolve 
Para nascer de súbito dela e morrer abruptamente. 

Um cardo azul, nem mesmo, no sudário, 
nem cirse oferecendo, sonho anódino e desdém do jardim, 
Não fosse um espinho para formar um tirso.

IV 

Medroso, um bronze vermelho sufoca na viburnum,
O sombrio soluço da sombra de onde a Única escuta,
Montar um luto de angústia nas rochas negras da estrada,
De uma bombarde grave ou de um morne cromorne. 

Mas do grave cromorno à triste bombarde
O furacão só bebeu o sangue da minha dúvida; 
Estás tu, de pé, a Morte que o dedo na abóbada 
A meu medo suscita um voo do Unicórnio? 

A Esperança! Já não há mais aquelas cujas corolas escuras 
Abrindo um fogo de êxtase à aurora dos nossos olhos, 
E até o teu sorriso é de um ouro preocupado; 

A esperança fumegante e vaga, pesado monte de ruínas 
Exala-se nos céus da noite em sopros obscuros, 
E a silva cresce sozinha à sombra das velhas paredes.



Rade com os futuros arrepios dos oceanos de auroras, 
Será isso o reflexo de um crepúsculo distante? 
Que naves coroadas com o teu azul astral
 Aterrarão nos cais dos teus jardins sonoros? 

Cidade, ó Tu, do triunfo e das flores, que decoras 
De alegria, com a tua multidão em festa, um litoral 
Onde padres sem pompa e sem luto augural
 Desviam-se de beber em ânforas impuras: 

Mantenha o orgulho de viver e o orgulho no amor 
E a doçura vibrante de um sonho casto. 
Orgulho ingênuo, com os olhos voltados para o mar, na torre, 

Vigília, mastros de sombra vagueiam pelo vasto mar; 
Vento do mar, ameaça sombria aos jardins claros, 
Teme a nuvem bruno de tempestade e relâmpagos.

ANDRÉ FONTAINAS-TRAD. ERIC PONTY

 

 ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

SONETOS - ANDRÉ FONTAINAS -TRAD. ERIC PONTY

 O ENCONTRO PROPÍCIO 


Eis a aurora propícia e a manhã divina 
Sorrir para o Solitário da floresta má,
Rumor farpado e aprazado da noite densa abrandar-se, 
O canto claro do sol despertou no céu distante. 

Com o novo aroma fresco da salva e do tomilho 
A sua alma deslumbra-se e a brisa que beija 
O mar azul-celeste ao pé da falésia 
A esperança renasceu, o orgulho do seu destino.

Ele sente renascer em si a glória da Alegria 
E o ardor do seu sonho heroico brilha forte 
Tal qual festa em chamas desta manhã rubra, 

E logo seus olhos avistam no horizonte, muito calmos, 
Ao passo dos seus brutos, e desdobrar as suas palmas, 
Os reis que ele acreditava estarem mortos pisando ao sol.

PRESSENTIMENTO 


Antes que as insuspeitas auroras cheguem até ti, 
Risos cujo brilho virgem se assemelha ao teu riso, 
Alastrar-se a brenha escura, onde apenas salgueiro fulgura, 
Os arrepios do olvido cujas asas não surgiram, 

Derrama, criança, o teu olhar: as flores murcharão 
Oferecer ao céu a tua taça inquieta que treme 
De onde talvez se abra a brecha para dois briosos jazerem juntos 
O perfume letárgico que os embriaga de anos.

Talvez uma noite de cinzas ou os últimos escombros 
Descerão entre véus e sombras pesadas 
Encostar-se, na beira do jardim das suas estradas, 

O sorriso do seu tédio, de onde, cansada e doce, 
Mostras o caminho adormecido sob o musgo     
Àqueles cujo destino esbarrou na rocha das dúvidas.

CONSELHO     

A Pierre Louÿs. 

Gema nos lábios, um sorriso esvoaça com asas 
Translúcida e melancólica é a tua vida; 
Aqui está morrido o fado e um sonho desviado 
No herói que amas e que te inspira. 

Mas não colherás dos teus gestos e delas 
Nem as flores perfumadas que a tua tristeza inveja, 
Nem a delicada emoção de ser uma alma cativa 
Às miragens de jogos fúteis e fiéis.

Os olhos não são um espelho nem o mar. 
Acorde. A chama ondula à tua vertigem, 
Uma lareira sombria em cinzas! Teme o inverno. 

O beijo delirante faísca com prestígio: O que importa? 
chora ociosamente ou pensa no teu sudário, 
A vida sonha perdidamente, jaze sozinha.

I

O que, no terror ermo de seus cabelos dispersos
A criança pálida sonha com mãos floridas
De grinaldas pálidas? - Sonha ela com os prados
De outrora, com suas poças de nenúfares

Cujos dedos floriram os caminhos do acaso
E nesses devaneios a criança pálida sonha
Seus olhos ardem com o brilho das joias
Que enfeitam seus vestidos de ouro e brocado.

Mas ela não vê nada ao seu redor. O quarto
Derrete-se em vapores de especiarias e âmbar,
A janela se abre para o ar quente da noite;

Os desejos pesados, como os fogos mutáveis da opala
Morrem soluçando na névoa da noite
Onde a ingênua criança está nua em seu espelho.

II

Ó brisas e beijos das brisas, para os teus lábios 
Quais palpites em nudezes reais do esplendor 
Gladíolos e lírios, e o aroma torna-se mais apurado 
Verbenas afáveis em arrepios frescos e melosos.

Rubis claros coruscantes chegados por ourives inábeis, 
Ofereceu-se a ti, sedutora, a candura 
Que hastes! E tu ris, criança errante
 Quem nutre em nossos jardins o rebanho das tuas cabras.

Ó pastor, adormeces na relva verde, 
Um tirso ondula ao teu sonho com braços retorcidos 
De entusiasmo ardente por algum amor antigo,

Tu tremes! E eis que há arbustos diante dos teus olhos, 
Nua e com teus cabelos louros cingidos pela mística murta, 
Erguendo-se a Vivente com um olhar radiante.

ANDRÉ FONTAINAS -TRAD. ERIC PONTY

 

  ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA

DOIS POEMAS CURTOS EM DEDICAÇÃO - ANDRÉ FONTAINAS- TRAD. ERIC PONTY

 I


É uma alegria entre as horas de inverno 
Mergulhar na janela gelada, 
Contemplar: as pétalas cintilam e coruscam 
Abrir um beco onde nossos sonhos possam viver.

Acordar. A manhã pura irrompe e ri, 
É a hora do êxtase de viver sob o sol calmo, 
E nada, exceto em sonhos, no jardim claro, nenhum som 
Mas um lento tremor vão, Ó palmas!

Veja o vida nova e o florescimento no vasto silêncio 
Que seu olhar anima, tremendo de amor, 
0 querido eu, o antigo e excitado ardor, 
Com o qual a paz de meu fundo amor o invade.

II


No passado, soia dizer com palavras melancólicas, 
Adorei a sombra trémula das árvores altas 
Que inclinam a sua folhagem sobre as margens 
Do riacho com seu murmúrio claro entre as pedras; 
Eu adorava a paz assonorentada, onde a aldeia 
Durante os dias, durante as horas, 
No pacífico olvido da vida, 
Se estica sem saber nem mesmo de sua felicidade; 
No passado, sonhávamos nossa passagem pelos prados,
Silencioso como as feras e as gramíneas, 
Dedos enredados, e meus olhos aprontando seus pensamentos, 
Ambos, sozinhos, triunfantes e soberbos, 
Disjuntos, e ainda mais magníficos por isso!
No passado! E já é passado 
Aquele tempo despreocupado de envenenar-se frívola; 
Dantes! Mas rejeite a memória 
Pesada como um manto, e se endireite.
Seu orgulho em relação ao futuro: 
O que importa? O que era é apenas pó, 
O pó vil das estradas 
Mancha menos os pés descalços e feridos que as arrastam
Não vamos nos cansar em busca do amanhã!

Qual é apego disso? Tempo presente, tempo passado. 
O que já passou não existe mais, 
E apenas o futuro nos prende; 

Tudo o que flui e escorre 
Em vão se acumula: 
Desfrute de uma ocasião; deixe-o fugir, se ele fugir:
Você gosta do dia, ele é a noite; 
O dia renascerá ao alvorecer 
E nossa alegria voltará a faiscar
Se amanhã o sol surgir e cintilar 
Em nossa esperança, entre a multidão e a cidade 
Onde o fermento e o barulho 
Confusamente, em estranha fartura, ao encanto
Universal da vida. 
Então! o homem trêmulo, qual uma folha, 
Esperta para saudar a aurora e dá as boas-vindas 
Qual um irmão, à sua glória o sonho: 
0 Sonho, 
Um sonho que amanhecerá amanhã... 

Vamos olvidar o passado, vamos sonhar, dê-nos suas mãos.

ANDRÉ FONTAINAS- TRAD. ERIC PONTY

 

 ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA