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sexta-feira, agosto 04, 2017

Afiadeira - Paul Valéry - Trad. Eric Ponty



Afiadeira
A Lia não fia
No azul da janela a afiadeira sentada,
Onde melodioso jardim se desvanece;
A velha ronca que ruge embriagada.

Laça, bebendo azul, de fiar a onda
Cabeleira, tão débil em seus dedos evasiva,
Ela sonha, e sua pequena cabeça se inclina.

Um arbusto ao ar puro faz uma fonte viva
Que, suspendida no dia, rega deliciosa
De suas pétalas caídas que ao jardim ativa.

Um talo, onde o vagabundo vento repousa,
Curvado em vão saúda de sua graça estrelada,
Mostrando-se magnífica, a velha roca, sua rosa.

Mas a dormioca fia uma lã isolada;
Misteriosamente a frágil sombra se entrelaça
Ao fio de seus largos dedos, que dormem, afiados.

O sonho se devaneia com uma preguiça,
Angélico, e sem cessar, o doce e crédulo fuso,
A cabeleira ondulada ao gosto da fineza…

Detrás de tantas flores, o azul é fuçador,
Afiadeira de folhagem, a claridade se ergue:
O céu verde se padece. A última árvore tostada.

Tua irmã, a grande rosa onde sorri uma santa,
Perfuma tua vaga frente ao vento de sua manhã
Casta, e te faz crer enlanguescer… planta abolir

No azul da janela onde fia a lã.
Trad. Eric Ponty

LA FILEUSE

Lilia…, neque nent.
ASSISE, la fileuse au bleu de la croisée
Où le jardin mélodieux se dodeline ;
Le rouet ancien qui ronfle l’a grisée.

Lasse, ayant bu l’azur, de filer la câline 
Chevelure, à ses doigts si faibles évasive,
Elle songe, et sa tête petite s’incline.

Un arbuste et l’air pur font une source vive
Qui, suspendue au jour, délicieuse arrose
De ses pertes de fleurs le jardin de l’oisive.

Une tige, où le vent vagabond se repose,
Courbe le salut vain de sa grâce étoilée,
Dédiant magnifique, au vieux rouet, sa rose.

Mais la dormeuse file une laine isolée ;
Mystérieusement l’ombre frêle se tresse
Au fil de ses doigts longs et qui dorment, filée.

Le songe se dévide avec une paresse
Angélique, et sans cesse, au doux fuseau crédule,
La chevelure ondule au gré de la caresse…

Derrière tant de fleurs, l’azur se dissimule,
Fileuse de feuillage et de lumière ceinte :
Tout le ciel vert se meurt. Le dernier arbre brûle.

Ta sœur, la grande rose où sourit une sainte,
Parfume ton front vague au vent de son haleine
Innocente, et tu crois languir… Tu es éteinte

 Au bleu de la croisée où tu filais la laine.

Paul Valéry




Ao Leitor - Charles Baudelaire - Trad. Eric Ponty



Ao Leitor

Insensatez e erro, da miséria e pecado
Possuir nossas almas cansar nossa carne.
E, como um cão, alimentamos nosso pesar manso
Quão os mendigos levam a comer seus piolhos.

Nossos pecados são teimosos, nossa contrição;
Damos generosos nossos votos de fé
E voltam alegres com passagem entulho,
Pensar que os prantos vão lavar nossas nódoas.

Na almofada do mal está o alquimista
Satã Trimegistro, serena nossa alma cativa,
E todo o metal mais rico da nossa vontade
É sublimado por suas artes herméticas.

Realmente o Diabo puxa todas nossas cordas!
No grosso objetos repugnantes, achamos encantos;
Cada dia estamos um passo adiante no inferno,
Teor para se mover pelo meio do poço fétido.

Como um libertino pobre vai chupar e beijar
A triste e atribulado seio duma velha puta,
Nós furtamos prazer furtivo quando passamos,
Uma laranja moída que cingimos e apertamos.

Fechar, fervilhar, quão um milhão de vermes,
Tumultos duma nação infernal nas nossas cabeças,
E, quando respiramos, morte flui nossos pulmões,
Um fluxo secreto de gritos abafados e deploráveis.

Se matar, ou se ardor criminoso, veneno, estupro
Ainda não adornamos nossas boas ideações,
A tela banal de nossos destinos deploráveis,
É só que nosso espírito não tem seiva.

Mas lá com todos chacais, panteras, mastins,
Os macacos, escorpiões, abutres, cobras,
Uivam, gritam, grunhindo, brutos rastejantes,
Numa infame coletânea de nossos vícios,

Uma criatura apenas é mais suja e infida!
Apesar não faça bons gestos, nem grandes gritos,
Ele voluntariamente devastaria a terra
E em uma andorinha mordida em todo o mundo;

Ele é Ennui!  - Com olhos cheios choros ele sonha
De andaimes, enquanto sopra cachimbo d´água.
Leitor, tu conheces este monstro meigo também;
- Leitor hipócrita, - companheiro, meu irmão!
Tradução Eric Ponty

AU LECTEUR
A SOTTISE, L’ERREUR, LE péché, la lésine,
Occupent nos esprits et travaillent nos corps,
Et nous alimentons nos aimables remords,
Comme les mendiants nourrissent leur vermine.

Nos péchés sont têtus, nos repentirs sont lâches ;
Nous nous faisons payer grassement nos aveux,
Et nous rentrons gaiement dans le chemin bourbeux,
Croyant par de vils pleurs laver toutes nos taches.

 Sur l’oreiller du mal c’est Satan Trismégiste
Qui berce longuement notre esprit enchanté,
Et le riche métal de notre volonté
Est tout vaporisé par ce savant chimiste.

C’est le Diable qui tient les fils qui nous remuent !
Aux objets répugnants nous trouvons des appas ;
Chaque jour vers l’Enfer nous descendons d’un pas,
Sans horreur, à travers des ténèbres qui puent.

Ainsi qu’un débauché pauvre qui baise et mange
Le sein martyrisé d’une antique catin,
Nous volons au passage un plaisir clandestin
Que nous pressons bien fort comme une vieille orange.

Serré, fourmillant, comme un million d’helminthes,
Dans nos cerveaux ribote un peuple de Démons,
Et, quand nous respirons, la Mort dans nos poumons
Descend, fleuve invisible, avec de sourdes plaintes.

Si le viol, le poison, le poignard, l’incendie,
N’ont pas encor brodé de leurs plaisants dessins
Le canevas banal de nos piteux destins,
C’est que notre âme, hélas ! n’est pas assez hardie.

Mais parmi les chacals, les panthères, les lices,
Les singes, les scorpions, les vautours, les serpents,
Les monstres glapissants, hurlants, grognants, rampants,
Dans la ménagerie infâme de nos vices,

Il en est un plus laid, plus méchant, plus immonde !
Quoiqu’il ne pousse ni grands gestes ni grands cris,
Il ferait volontiers de la terre un débris
Et dans un bâillement avalerait le monde ;

C’est l’Ennui ! — l’œil chargé d’un pleur involontaire,
Il rêve d’échafauds en fumant son houka.
Tu le connais, lecteur, ce monstre délicat,
 — Hypocrite lecteur, — mon semblable, — mon frère!
Charles Baudelaire

A Dante ALIGHIERI II - Michelangelo Buonarroti Rime – Tradução Eric Ponty



A Dante ALIGHIERI II
Qualquer língua pode falar deve ser dito,
Pois, olhos cegos, esplendor brilhou muito forte;
"É mais fácil culpar daqueles fizeram errado,
Doente soar menos louvor boca de ouro.
Ele a abusou parte dor era afoita,
  Então subi a Deus, instruir almas por canção;
  O céu dos portões optou por sofrer os pés,
  Contra seu desejo, seu país jorrou.
Sem graça eu a chamei, e a sua própria dor
O mal foi com miséria; ao sinal, peguei isso,
  Isso sempre é a melhor causa mais aversão:
Entre mil provas, deixe-se de jazer;
Apesar nunca fosse dita mais torta do que a dele,
O seu igual ou seu melhor nunca brotou.

Quante dirne si de’ non si può dire,
ché troppo agli orbi il suo splendor s’accese;
biasmar si può più ‘l popol che l’offese,
c’al suo men pregio ogni maggior salire.
5 Questo discese a’ merti del fallire
per l’util nostro, e poi a Dio ascese;
e le porte, che ‘l ciel non gli contese,
la patria chiuse al suo giusto desire.
Ingrata, dico, e della suo fortuna
10 a suo danno nutrice; ond’è ben segno
c’a’ più perfetti abonda di più guai.
Fra mille altre ragion sol ha quest’una:
se par non ebbe il suo exilio indegno,
simil uom né maggior non nacque mai.
Michelangelo Buonarroti Rime – Tradução Eric Ponty