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terça-feira, julho 22, 2025

Esse século tinha dois anos de idade! - VICTOR HUGO - TRAD. ERIC PONTY

 Data fata secutus. DEVISE DES SAINT-JOHN

O século tinha dois anos de idade! Roma estava suprindo Esparta,
Napoleão já estava trocando tua marca sob o comando de Bonaparte,
E do primeiro cônsul, em muitos lugares,
A testa do imperador estava rompendo a estreita máscara.
Então, em Besançon, uma antiga cidade espanhola,
Lançada como semente ao capricho do ar voador,
Nascido de sangue bretão e Lorena ao mesmo tempo
Uma criança sem cor, visão ou voz;
Tão fraca quanto uma quimera,
Abandonada por todos, exceto por tua mãe,
E teu pescoço se curvou como um frágil junco
Feito ao mesmo tempo teu caixão e teu berço.
Essa criança que a vida apagou de teu livro,
E não tinha nem mesmo um amanhã para viver,
sou eu. -
Talvez um dia eu lhe diga
Que leite puro, que cuidado, que desejos, que amor,
Deram minha vida quando eu nasci condenado,
Fez de mim duas vezes o filho de minha obstinada mãe,
Um anjo que, com três filhos, se apegou a teus passos
Espalhando teu amor e não o medindo!
O amor de uma mãe! Um amor que ninguém esquece!
Pão maravilhoso que um deus compartilha e multiplica!
Uma mesa sempre servida no lar paterno!
Cada um tem tua parte e todos têm tudo!

Poderei dizer um dia, quando a noite duvidosa
Fará com que minha velhice contadora de histórias fale à noite,
Como esse alto destino de glória e terror
Que agitou o mundo nas pegadas do imperador,
Em teu sopro tempestuoso, levando-me indefeso
A todos os ventos do ar flutuou minha infância.
Pois quando o aquilão bate em tuas ondas palpitantes
O oceano convulsivo atormenta ao mesmo tempo
O navio de três andares que troveja com a tempestade,
E a folha que escapou das árvores na praia!

Agora, ainda jovem e muitas vezes experimentado,
Tenho mais de uma memória profundamente gravada,
E é possível distinguir muitas coisas passadas
Nessas dobras de minha testa que meus pensamentos cavam.
Certamente, mais de um velho sem chama ou cabelo,
Que caiu de cansaço ao final de todos os teus desejos,
Se ele visse, como um abismo na onda, ficaria pálido,
Minha alma onde meu pensamento habita, como um mundo,
Tudo o que sofri, tudo o que tentei,
Tudo o que mentiu para mim como um fruto abortado,
Meu tempo mais feliz passado sem esperança de renascimento,
Os amores, os trabalhos e a dor de minha juventude,
E embora ainda esteja na idade em que o futuro sorri,
O livro do meu coração está escrito em cada página!

Se às vezes meus pensamentos saem de meu peito,
Minhas canções se espalham pelo mundo em frangalhos;
Se me agrada esconder o amor e a dor
No canto de um romance irônico e zombeteiro;
Se eu agito o palco com minha fantasia,
Se eu me chocar aos olhos de uma multidão escolhida
Outros homens como eles, vivendo ao mesmo tempo
Com minha respiração e falando ao povo com minha voz;

Se minha cabeça, a fornalha onde meu espírito se acende,
Lancei o verso de bronze que borbulha e fumega
No ritmo profundo, o molde misterioso
Do qual sai a estrofe abrindo tuas asas nos céus;
O amor, o túmulo, a glória e a vida,
A onda que foge, pela onda incessantemente seguida,
Cada sopro, cada raio, auspicioso ou fatal,
Faz minha alma de cristal brilhar e vibrar,
Minha alma de mil vozes, que o Deus que eu adoro
Colocado no centro de tudo como um eco sonoro.

Além disso, já superei os dias ruins,
E sei de onde vim, mesmo que não saiba para onde estou indo.
A tempestade de festas com teu vento de chamas
Sem alterar a onda, agitou minha alma.
Nada de sujo em meu coração, nenhum lodo impuro
Que esperasse por um vento para perturbar teu azul!

Depois de cantar, eu ouço e contemplo,
Ao imperador caído erigindo um templo nas sombras,
Amando a liberdade por teus frutos, por tuas flores,
O trono por teu direito, o rei por teus infortúnios;
Fiel, finalmente, ao sangue que corria em minhas veias
Meu velho pai soldado, minha mãe da Vendéia!

VICTOR HUGO - TRAD. ERIC PONTY

 

    ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA 

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