Resignação
sumptuosidade persa e papal,
Heliogabalus e Sardanapalus!
O meu desejo criou-se sob tetos dourados,
Entre perfumes, ao som da música,
haréns sem fim, paraísos físicos!
Hoje mais calmo e não menos ardente,
Mas sabendo que a vida e que é preciso dobrar-se,
Tive de refrear a minha bela loucura,
Sem, no entanto, me resignar demasiado.
Assim seja! O grandioso escapa-me,
Mas evita o amável e evita a escória!
E continuo a odiar a mulher bonita!
A rima assonante e o amigo prudente.
NEVERMORE
Memória, memória, o queres de mim? outono
Fez o tordo voar pelo ar monótono ido,
Que deste sol brilhava monotonamente
Sobre o bosque amarelado onde sopra a brisa.
Estávamos sós e andávamos a sonhar,
Ela e eu, os nossos velos e axiomas ao vento.
De repente, recuando pra mim o olhar tocante, ela disse:
"Qual foi o dia mais feliz!", veio da voz dourada,
Voz suave e sonora, de timbre fresco e angélica.
Que de um sorriso discreto respondeu-me,
E eu beijei-lhe a mão branca com devoção.
- Ah! Primeiras flores, como são perfumadas!
E como soa com um murmúrio encantador
Que do primeiro sim dos lábios amados!
AO FIM DE TRÊS ANOS
Depois de lhes abrir a porta estreita e instável,
Passei pelo pequeno jardim, som dourado,
suave iluminado pelo sol da manhã,
fazendo cintilar cada flor com brilho húmido.
Nada alterou. Voltei a ver tudo: o humilde caramanchão
Com as suas vinhas loucas e cadeiras de vime...
A fonte ainda faz o teu murmúrio prateado
E o velho treme com a tua queixa eterna.
As rosas, como antes, esvoaçam; como antes,
Os lírios altos e orgulhosos balançam ao vento.
Cada cotovia que vem e vai é-me conhecida.
Até encontrei de pé, Velléda,
cujo reboco está a descascar no fim da avenida.
- Frágil, no meio do cheiro suave da reseda.
VOEU
Ah! as oarystis! as primeiras amantes!
O ouro dos velos, o azul dos olhos, a flor da tua carne,
E depois, no meio em perfumes de corpos jovens e queridos,
A temível espontaneidade das carícias!
Estarão todas estas alegrias longe o suficiente!
E toda essa franqueza! Ai de mim! todos eles
A primavera dos pesares fugiu dos negros invernos
Dos meus problemas, dos desgostos, minhas angústias!
De modo que agora estou só, triste e só,
Desolado e desesperado, mais frio que um avô,
E como um pobre órfão sem uma irmã mais velha.
Ó mulher de amor quente e mimoso,
Gentil, atenciosa e morena, e nunca surpreendida,
E que às vezes te beija na testa, como uma criança!
PAUL VERLAINE - TRAD. ERIC PONTY
Nenhum comentário:
Postar um comentário