Pesquisar este blog

terça-feira, abril 04, 2023

Luis de Góngora y Argote TRAD.ERIC PONTY

 Era filho de Francisco de Argote, jurista e corregedor em Córdoba, e de sua esposa, Leonora de Argote, pertencendo assim a uma das famílias privilegiadas da cidade.

Aos 15 anos foi para Salamanca para cursar os estudos jurídicos e filosóficos na sua Universidade. Cursou a Universidade sem destaque, e decidindo-se enveredar pela carreira eclesiástica, tomou ordens menores em 1585. Por essa altura já era conhecido como poeta, sendo os seus dotes líricos louvados por Miguel de Cervantes na sua La Galatea.

Iniciou a sua carreira eclesiástica com um emprego na catedral de Córdova, mas a sua vida boémia e a mordacidade de algumas das suas poesias trouxeram-lhe a reprovação dos seus superiores na igreja, sendo-lhe negada a ordenação sacerdotal.

Em 1605 foi-lhe finalmente concedida ordenação sacerdotal e por influência do duque de Sandoval foi nomeado em 1617 para um dos postos de capelão honorário do rei Filipe III de Espanha, fixando-se então em Madrid e passando a frequentar a corte. Diz-se que se arruinou financeiramente com o seu estilo de vida, amante de luxos e de divertimentos, e por ter procurado conseguir cargos e prebendas para quase todos os seus familiares.

No ano em que faleceu (1626) o impressor Juan López Vicuña publicou uma antologia intitulada Obras en verso del Homero español, a primeira edição impressa dedicada exclusivamente às obras de Góngora. Apesar de uma dedicatória ao censor geral, a edição foi mandada recolher pela Inquisição, tendo pouca divulgação. Nova edição surgiu em 1633 pela mão de Gonzalo de Hoces, conhecendo algum sucesso.

Apesar de já nas suas obras iniciais encontrarmos o típico conceptismo do barroco, Góngora, cujo talento era o de um esteta com forte tendência para a autocrítica (costumava dizer: el mayor fiscal de mis obras soy yo), não se conformava com os cânones existentes. Assim, decidiu tentar, segundo as suas próprias palavras, hacer algo no para muchos e intensificar ainda mais a retórica e a imitação da poesia latina clássica. Para tal, introduziu numerosos cultismos e una sintaxe baseada no hipérbato e na simetria.

A Juan Rufo, de sua “Áustria”

Cantastes Rufo, já, tão heroicamente,
Daquele César, novo augusta história,
Que está duvidosa entre os dois glória,
E a qual se deva dar nenhum assento.

E assim Fama, que hoje de gente em gente,
Quer que dos dois a igual da memória,
Do tempo e do olvido haja duma vitória,
Une do louro a cada qual à frente.

Deveis com grande razão ser igualados,
Pois fostes cada qual único em sua arte,
Ele só em armas, vós em nas letras só.

E ao fim ambos igualmente ajudados,
Ele à espada do sangramento de Marte,
Vós da lira do seu sagrado Apolo.

A Córdova

Oh excelso muro, oh torres consumadas,
Da honra da majestade, da galhardia!
Oh grande rio, grande rei Andaluzia,
De areias nobres, já que não doiradas.

Oh fértil canto, oh serras levantadas,
Que privilegia o céu e doira o dia!
Oh sempre gloriosa pátria minha,
Tanto de plumas quanto de espadas.

Se entre aquelas ruinas e seus despojos,
Que enriquece Genil e Dauro banha,
Tua memória não foi alimento meu.

Nunca mereçam meus ausentes olhos,
Ver teu muro tuas torres e teu rio,
Teu canto e serra, oh pátria, oh flor da espada!

De uma enfermidade de Dom Antônio de pazos, bispo de Córdova

Deste mais que a neve, branco touro,
Robusta honra que deste gado meu,
E destas aves duas, que ao novo dia,
Saúdam de haver com doce choro.

A ti ele mais rubro, Deus do alto coro,
Está estranha faço oferenda pia,
Sobre este com flama, vencido envia,
Seu fumo de âmbar e sua chama de ouro.

Porque tanta saúde seja reposta,
Do nosso sacro e douto pastor rico,
Que um os que nascerem estão em vão.

Já que das três coroas que neste unido
Ao menos maioral do Tajo, e sejam
Planta abrigo, arminhos a com pelica.

Do Márquez de Santa Cruz

Não em bronzes, que caducam, mortal mão,
Oh católico Sol dos gananciosos,
(que já entre gloriosos capitães
És deidade armada, Marte Humano.)

Esculpirá teus maduros, senão em vão,
Quando descobrir queira tuas fadigas,
E as bem reportadas bandeiras,
Do Turco, do Inglês, do Lusitano. 

Em um mar de tuas velas coroado,
De teus remos ao outro escarnecido,
Tábuas serão de coisas tão estranhas.

Da imortalidade ele não cansado,
Pincel os logre, e sejam tuas rojadas
Alma do tempo, espada do olvido.


A Don Luís de Vargas

Teu (cujo ilustre entre uma e outro muro,
Da imperial cidade, pátrio edifício,
Ao Tajo olha em seu húmido exercício,
Pintar os campos e doirar a areia).

Marginalize aquele Lauro em boa hora,
Aqueles dois (já mudas de ofício),
Relíquias doces do gentil Salicio,
Heroica lira, pastoral aveia.

Chegadas, oh claríssimo mancebo,
Ao douto peito, a sua suave boca,
Punindo lei ao mar, freio aos ventos.

Sucede em todo castelhano Febo,
(Que agora és glória muita e terra pouca),
Na pátria, em profissão, em instrumentos.

Na morte de duas senhoras monjas irmãs naturais de Córdoba

Sobre as urnas de cristal tão lavradas
De vidro em pedestais tão sustentadas
Chorando estão as ninfas já sem vidas,
O Betis em suas húmidas moradas.

Tanta sua formosura Dele amá-las
Que ao que as demais ninfas doloridas,
Se mostram de seu terno fim sentidas,
Ele derramado em lágrimas cansadas.

- Almas – lhes disse – vosso voo santo,
Seguir penso até esses sacros ninhos,
Do bem se goza sem tremer contrário.

Que vista essa beleza em meu grão canto,
Por o céu seremos convertidos,
Que gémeas vós outras, já em Aquário.  

De pura honestidade ao templo sagrado

De pura honestidade ao templo sagrado,
Cujo belo cimento e gentil muro,
De branco nácar e alabastro duro
Foi por divina mão já fabricado.

Pequena porta de coral apreciado,
Claras umbreiras de olhar seguro,
Que a esmeralda fina verde puro,
Haveis para virdes tão usurpados.

Soberbo teto cujas cimbras ouro.
Ao claro sol, enquanto em torno gira,
Ornam a luz, coroam a beleza.

Ídolo belo, há quem humilde adoro,
Ouve piedoso ao que por ti suspira,
Teu hino canta, e tuas virtudes rez

  
Trás vermelha Aurora, o sol doirado,

Trás vermelha Aurora, o sol doirado,
Por as portas saia, deste oriente,
Ela às flores a rosada frente
Ele de acesos raios tão coroados.

Similar seu contento o seu cuidado,
Qual com voz doce, qual com voz dolente,
As ternas aves com à luz presente,
No fresco ar e nesse verde prado. 

Quando saiu, bastante a dar, Leonora,
Corpo aos ventos e as pedras da alma,
Cantando seu rico albergue e logo.

Nem ouvi as aves mais, nem vi Aurora,
Porque ao sair, o todo ficou em calma,
O eu, que és mais certo surdo e cego.

Oh clara honra líquido elemento

Oh clara honra de líquido elemento,
Doce arrozinho de corrente planta,
Cuja água dentre erva se dilata
Doação sonora com passo lento.

Pois a por quem gelar e arder me sento
(durante em ti que olha) do Amor retrata,
De seu rosto a neve deste escarlate
Em teu tranquilo e brando movimento.
Vete como ti vais, não deixes folhas,
A undosa renda a cristalina parada
Com quem governa tua veloz corrente.

Que não é bem que confusamente acolha
Tanta beleza em seu profundo seno
O grande senhor do húmido tridente.

Ao transmontar do sol, a ninfa minha

Ao transmontar do sol, a ninfa minha,
De flores despojadas ao verde canto,
Quantas trocavas da formosa mão,
Tantas ao branco pé crescer fazia.

Ondulações ao vento que corria,
Ao ouro fino com error galante,
Qual verde folha de álamo vigor,
Se move ao roxo despontar do dia.

Mas logo que uniu suas Senas belas,
dos vários despojos desta sua fralda,
(término posto de ouro e da neve),

Jurarei que vazio mais sua grinalda,
Com ser das flores, a outra ser de estrelas,
Que a ilustra ao céu em luzes novas.

Oh clara honra líquido elemento

Oh clara honra de líquido elemento,
Doce arrozinho de corrente planta,
Cuja água dentre erva se dilata
Doação sonora com passo lento.

Pois a por quem gelar e arder me sento
(durante em ti que olha) do Amor retrata,
De seu rosto a neve deste escarlate
Em teu tranquilo e brando movimento.
Vete como ti vais, não deixes folhas,
A undosa renda a cristalina parada
Com quem governa tua veloz corrente.

Que não é bem que confusamente acolha
Tanta beleza em seu profundo seno
O grande senhor do húmido tridente.
Qual parece ao romper da manhã

Qual parece ao romper da manhã,
Pérola branca sobre frescas rosas,
Os quais mãos fecha artificiosas,
Bordadura pérola sobre grande.

Tais de minha pastora soberana,
Pareciam as lágrimas formosas,
Sobre as sobrancelhas milagrosas,
De quem mesclados leites, sangue mana.

Laçando as voltas de seu terno canto,
Um ardente suspiro em meu peito,
Tal que o mais duro canto enterneça.

Si enternecer bastara um duro canto,
Olhas que haver com um coração fato,
Que ao canto e ao suspiro foi de cera.

Já beijando umas mãos cristalinas

Já beijando umas mãos cristalinas,
Já me anulando a um branco e liso colo,
Já esparzindo por aquele cabelo,
Que Amor sacou entre ouro de suas minas.

Já quebrando naquelas pérolas finas,
Palavras doces mil sem merece-lo,
Já cogitando de cada lábio belo,
Purpuras rosas sem tremor de espinhos.

Estava, oh claro sol tão invejoso,
Quando tua luz me ferindo aos olhos,
Matou minha glória, e acabou minha sorte.

Si o céu já não é menos poderoso,
Por que não dão as tuas mais iradas,
Raios, como teu filho, te deu morte. 

Já beijando umas mãos cristalinas

Já beijando umas mãos cristalinas,
Já me anulando a um branco e liso colo,
Já esparzindo por aquele cabelo,
Que Amor sacou entre ouro de suas minas.

Já quebrando naquelas pérolas finas,
Palavras doces mil sem merece-lo,
Já cogitando de cada lábio belo,
Purpuras rosas sem tremor de espinhos.

Estava, oh claro sol tão invejoso,
Quando tua luz me ferindo aos olhos,
Matou minha glória, e acabou minha sorte.

Si o céu já não é menos poderoso,
Por que não dão as tuas mais iradas,
Raios, como teu filho, te deu morte. 
Luis de Góngora y Argote TRAD.ERIC  PONTY


ERIC PONTY-POETA-TRADUTOR-LIBRETISTA

Nenhum comentário: