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quarta-feira, abril 05, 2023

JUAN BUSCÁN -TRAD.ERIC PONTY

 (Barcelona, 21 de Setembro de 1492 - Perpignan, 1542), foi um poeta e tradutor espanhol.

De família nobre, recebeu excelente formação humanística e serviu na corte dos Reis Católicos e depois na do imperador Carlos I de Espanha. Foi preceptor do Duque de Alba. Casou com uma culta dama valenciana, doña Ana Girón Rebolledo. Viajou à Italia como embaixador e ali encontrou Garcilaso de la Vega, com quem fez amizade.

Boscán, que havia cultivado antes a poesia cortesã no estilo dos cancioneiros, após sua estada na Itália introduziu na poesia espanhola o verso hendecassílabo, o soneto, a oitava real, o terceto encadeado, a canção estrófica e os hendecassílabos brancos, além de motivos da poesia de Petrarca, influenciando Garcilaso de la Vega e Diego Hurtado de Mendoza. Seu poema Hero y Leandro foi o primeiro em espanhol que tratou de temas legendários e mitológicos clássicos. Sua Epistola a Mendoza introduziu na Espanha o modelo da epístola moral, imitando Horácio, onde expôs o ideal estóico. Traduziu Il Libro del cortegiano de Baldassare Castiglione e preparou edições de Garcilaso de la Vega.

Nesta edição encontram-se os primeiros 16 sonetos feitos pelo poeta em língua espanhola introduzindo o Soneto.

XXI – Soneto

Nunca de amor esteve tão contento,
Que em seu elogio meus versos ocupar-se,
Nem a nada aconselhe que se enganei,
Buscando ao amor contentamento.

Isto sempre julgou meu entendimento,
Que deste mal todo homem a guardar-se,
E assim, porque esta lei se conservasse,
Folgar ser todos d´escarnecimento.

Oh vós outros andais traz meus escritos,
Os que de Deus tão grande merece haveis,
Que do poder de amor fostes quitados!


XXX – Soneto

As chagas que de amor, que são invisíveis,
Quero como visíveis que se apresentem,
Porque aqueles que humanamente sentem
Se espantem de acidentes tão terríveis.

Os casos de justiça mais horríveis,
Em público hão de ser porque castigados
Com sua torpeza, e de que se amedrontem
Até os seus corações invencíveis.

Eu trago aqui a história de meus males,
Donde ilustre de amor hão ter concorrido,
Tão fortes, que não sei como contá-las.

Eu só em tantas guerras fui ferido,
E são minhas feridas, os sinais,
Tão feias, que hei vergonha mostrá-las.

 XXI – Soneto

Nunca de amor esteve tão contento,
Que em seu elogio meus versos ocupar-se,
Nem a nada aconselhe que se enganei,
Buscando ao amor contentamento.

Isto sempre julgou meu entendimento,
Que deste mal todo homem a guardar-se,
E assim, porque esta lei se conservasse,
Folgar ser todos d´escarnecimento.

Oh vós outros andais traz meus escritos,
Os que de Deus tão grande merece haveis,
Que do poder de amor fostes quitados!


XXX – Soneto

As chagas que de amor, que são invisíveis,
Quero como visíveis que se apresentem,
Porque aqueles que humanamente sentem
Se espantem de acidentes tão terríveis.

Os casos de justiça mais horríveis,
Em público hão de ser porque castigados
Com sua torpeza, e de que se amedrontem
Até os seus corações invencíveis.

Eu trago aqui a história de meus males,
Donde ilustre de amor hão ter concorrido,
Tão fortes, que não sei como contá-las.

Eu só em tantas guerras fui ferido,
E são minhas feridas, os sinais,
Tão feias, que hei vergonha mostrá-las. 

XXXIII - Soneto

Há um bem não fui saído desta cama,
Nem da ama de leite fui eu deixado
Quando o amor me teve condenado
A ser dos que seguem a sua fortuna.

Deu-me logo misérias, duma a uma,
Por fazer meu costume em seu cuidado,
Depois em mim dum golpe há descartada,
Quando mal há debaixo de uma lua.

Na dor fui eu criado e fui eu nascido
Dando dum triste passo em outro amargo,
Tanto que si, há passos, és desta morte.

Oh, coração que sempre há de padecido,
Dê-me tão forte mal, como és tão largo?
E mal tão largo, diz, como és tão forte?

XXXIV – Soneto

Ao alto céu, que em seus movimentos,
Por diversas figuras discorrendo,
Em nosso sentir fraco está influindo
Diversos e de contrários sentimentos.

E uma vez move brandos pensamentos,
Outra vez asperezas vão incendiando,
E és seu uso ao trairmos revolvendo
Agora com pesa agora contento.

Fixo está em mim nunca haver mudança,
De planeta nem, porém em eu sentido,
Clavado em meus tormentos, todavia.

De ver outro hemisfério não hei esperança,
Assim donde uma vez me há anoitecido,
Ali me estou sem esperar o dia.

XXXV – Soneto

Só e pensativo de infértil desertos,
Meus passos dou cuidados e cansados,
Estorvados olhos trago levantados,
A ver não veja alguém meu desconcerto.

Meus tormentos ali vêm tão certos,
Vão meus sentimentos tão carregados,
Que um dos campos me soltem ser pesados,
Porque todos não estão secos e mortos.

Se ouço falar acaso algum dum rico,
E a voz do pastor dá aos meus ouvidos,
Ali se me resolve meu cuidado.

E ficam espantados meus sentidos,
Como é ter sido não haver desesperado
Depois de tantos cantos doloridos?


XXXVI – Soneto

Quis amá-los senhora, de meu grado,
Com brancos sentimentos brandamente
E então eu me senti tão de acidente 
Com o qual não ficarei melhorado.

Deste amor não haveis vós contentado,
Porque sair os vistes mansamente,
Senão que, por mostrá-los mais valente,
Minha branda vontade haveis forçado.

Aborreço-me na mansa vassalagem,
E quiseste de usar de sua tirania,
Vosso reino estragado com ultraje.

Danais maldosamente a fé que é minha,
Assim os quis quebrar em homenagem,
E si agora pudesse eu que o faria.
XXXVII – Soneto

Como sozinho o ar este cometa,
Ou algum outro sinal novo espantarmos,
E tanto seu temor faz ao avisarmos,
Que então cada um é grande profeta.

Assim mostra nosso bem clara e oculta,
Si a mim meus sentimentos quereis dar-nos
Não podemos, porém, muito alteramos,
Tão novo está no bem nosso planeta.

Não sofre minha dor nenhum estado,
De nenhum bem si não és mui pouco a pouco,
De outra arte penso ser sempre enganado.

Nunca creio ao prazer, ao que lhe toco,
E sim a vez tão mal, hei me assegurado,
Temo que tenham todos por um louco.

XXXVIII – Soneto

Quereis-me de vós, senhora, quando,
De vossas artes fui um ser tão ignorante
Que me cambava em ver vosso semelhante
Vosso ser pelo gesto imaginando.

Ficasse depois de desenganado
E vi no que de vós me viste diante,
Que vosso uso e natura és culpada
Que vós já sobre vós não tenhais mando.

Assim que agora não há de que queixar-me,
Meu direito e minhas queixas hão parado,
Pois vós não tendes que já de pagar-me.

Não ei de ser eu de prudência tão minguado,
Que deste fogo, no qual fui queixar-me
Fiquei queixoso em ver que há queimado.

XXXIX – Soneto

Não és tempo já de não ter temperança,
Se minha dor quisesse consenti-la,
Perdoou minha fatiga e ao senti-la,
Ao desgosto que do sofrer me alcança.

Mas ao amor me põe com tanta sua lança,
Que oxalá já pudesse não de sofre-la;  
Hajam de mim os homens já manchados,
Sequer porque sou eu sua semelhança.

Caiu e levanto, espero e desconfio,
Não tenho de viver senão que sinto,
Já quando sou parece desvario.

Si um pouco mais em meu penar porfio,
Em mim presto se acabará o tormento,
Seu poder acabando com o meu.


XL – Soneto

Vime através em fortes penas dado,
Quase sem vida, e os demais perdido,
E então fui de prudência de tão caído
Que em tanto mal me vi estar descuidado.

Hei entendido depois tão mal estado,
Quando as gentes dele me hão advertido,
E si agora, aqui estou arrependido,
Não me contento, pois, tanto hei demorado.

Não demore em entender logo engano,
Porém, o miserável, não lhe queria,
Acabar de crer de tão forte dano.

Venceu ao fim a verdade minha porfia,
E ficou confirmado o desengano,
Tomando nova volta na alma minha.

XLI – Soneto

Deixa-me em paz, oh duros pensamentos,
Basta-os do dano e a vergonha feita,
Se todo é passado de que se aprova,
Inventar sobre meus novos tormentos?

Natura em mim perdeu seus movimentos,
N´alma já dos pés da dor que si enche,
Tem por bem, nesta regra tão estreita,
A tantos casos, a tantos sofrimentos.

Amor, fortuna e morte que és presente,
Me levaram ao fim por suas jornadas,
E minha conta devia ter me chegado.

Já quando acaso arrochar acidente,
Si volto ao rosto e olho minhas pisadas,
Temo em ver me por onde me hei passado.

XLII – Soneto

Eu conto já dos passos que vou dando,
Vendo bem as terras que eu me trespasso,
Si o peço em me dar um só do passo,
Quero sempre parar e sempre ando.

Trago este corpo que por força mando,
E com carga dele vou me tão ao passo,
E em pouca terra tanta da dor passo,
Que és quando ando a andar-me reparando.

Eu que farei que me parti com cuidado?
Mal volverá quem tanto mal me há feito,
Assim és agora mal quando eu faço.

Ando comigo em tudo já tão penado,
Que em mim de nada fico satisfeito,
Porém de ver que não me satisfaço.

XLIII – Soneto

Põe-me na vida mais brava importuna,
De pedir mim vezes a Deus mortalha,
Põe-me idade madurês, mas que trabalha,
Nos braços da ama ou em nesta cama.

Põe-me embaixo em próspera da fortuna,
Põe-me do sol ao trato humano encontra,
O a do por frio ao alto mar se imóvel,
No abismo que encima desta lua.

Põe-me dos nossos pés vivem as gentes,
O na terra ou em céu ou em que vento,
Põe-me dentre feras, posta entre dentes.

Da morte e do sangue és tudo o fundamento,
Onde queira conservar sempre presente,
Os olhos por quem morro tão contento.

XLIV – Soneto

Quando será que volta a ver os olhos,
De donde amor me fez tanta da guerra
E possa estar olhando aquela terra,
Que me deixei com todos meus despojos?

Não posso, triste, mais com meus nojos,
A cada passo o coração me cerra,
Ver tanto canto em meio e tanta serra,
Por viver me arrancam desta abundância.

Ando mil vezes por tomar o meu voo,
E volver mal, sem esperar razão,
Haver por mais prudência esta loucura.

Porém logo levanto-me um tremor,
Conosco que me engana ao coração,
Estando estou por não estragar a cura.

JUAN BUSCÁN -TRAD.ERIC PONTY


ERIC PONTY-POETA-TRADUTOR-LIBRETISTA

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