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domingo, abril 15, 2018

MADEMOSELI DE PICASSO - TRAD. ERIC PONTY


I

São Versos louvor, conceitos esparsos,
Engendrados d´alma em meus zelosos,
Parte de meus doídos abrasados,
Com mais flores liberdade surgida;

Expostos ao mundo em que vão perdidos,
Tão certos olvidaste são trocados
Que só donde fossem já engendrados
Foram-se ao sangue versados pelo mundo:

Pois lhes furtais ao labirinto à Creta,
Ao Dédalo dos altos chamamentos,
Á fúria ao mar, às flamas ao abismo!

Se daquela áspide formosa aceita,
Deixa à terra, entreter os fortes ventos,
Descansareis em vosso centro mesmo.

II

Quando imagino meus breves dias,
Aos mui que ao tirano Amor me atreve,
E em meu cabelo antecipar à neve,
Mais que os anos, às tristezas minhas.

Vejo que são suas falsas alegrias
O Veneno no cristal razão bebeu,
Por quem o apetite voraz se atreve
Vestido em mil doces fantasias.

Que ervas do olvido há dado gosto
À razão, que, sem fazer seu artificio
Quer contrarrazão satisfazer-te?

Mas consolar-lhe pode meu desgosto,
Que és desejo do remédio indicio,
O Remédio de amor querer vender-lhe.

III

Musa se te aborreço, hei que há condeno
O que estes desta sorte em meu sentido:
Que infama ao ferro ao escorpião ferido,
E há quem o fora, mancha imundas cinzas.

Sois feita agulha mortíferos veneno
Que dana há quem o verte inadvertido;
É no fim, és tão mal e destemido
Que há um para aborrecido não sois bons.

Teu aspecto à minha memória ofereço,
Ao que com susto contradizer peço,
Por dar-me eu uma pena que mereço:

Pois quando ti considero o que disse,
Não só a ti, corrida, te aborreço,
Porém foste mim tempo que te quis.

IV

Em minha dor tão mortal tal ferida,
Dum agravo de amor me lamentava;
É por ver si minha morte se chegava,
Procurava que fosse mais crescida.

Tudo que no mal n´alma fez divertida,
Pena por pena em sua dor me somava,
Cada circunstância ponderava
Que sobravam mil mortes há uma vida.

E quando, ao golpe dum e outro me firo,
Rendido ao coração dava, penoso,
Senhas darem-se o último do suspiro.

Não sei com que destino prodigioso
Volvi em meu acordo e dizendo: Me admiro?
Quem louvar-te há sido mais que ditoso?
 
ERIC PONTY

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