Pois vens que não me hão dado algum soneto
Que se ilustre este livro de abertura,
Vim há vós, pluma, minha mal podada,
E fazer-lhe, algo careça de discreto.
Haveis se escuse o temerário aperto,
De andar convosco de outra encruzilhada,
Mendigando alambazas, desculpada,
Fatiga e impertinente, eu os prometo.
Todo soneto e rima ali se achega,
E adorna-os de umbrais sejam dos bons,
Ao que adulação sejam ruim casta.
E dai-me há vós que essa viagem tenha
Do sal com um pãozinho pelo menos,
Lhes marcando por vendível, e basta.
I
Sereníssima Rainha, em quem se fala
O que Deus pode dar-nos a um ser humano;
O Amparo universal do ser cristão,
De quem a santa fama nunca cala;
Arma feliz, de cuja fina rede
Se viste o grão Felipe soberano,
Ínclito rei do grande solo hispânico,
Há quem fortuna e mundo se avassala.
Qual engenho podia aventurar-se
Apregoar do bem que estás me mostrando,
Se já no divino visse converter-se?
Que, em ser mortal, farás acovardar-se,
E assim lhe vai melhor sentir calando
Daquilo que és difícil de lhe dizer-se.
II
Aqui do valor da espanhola terra;
Aqui da flor dessa francesa gente;
Aqui quem concordou o diferente,
De oliva foi coroado aquela guerra,
Aqui, pequeno espaço, vem se encerra,
Desta nossa clara luz de ocidente,
Aqui parte enterrada da excelente
Causa que nosso bem todo desterra.
Olhe-me quem é mundo e sua pujança,
E de como, da mais alegre vida,
A morte leva sempre da vitória!
Também olha a bem-aventurança
Que goza nossa rainha esclarecida
Que neste eterno reino desta glória.
TRAD.ERIC PONTY
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