10. — A Alphonse Baudelaire [1840] [Paris.]
Meu bom irmão, creio ter falhado gravemente na cortesia fraternal ao não lhe escrever desde que estou em Paris. Deveria ter escrito a você e à minha irmã para agradecer pela magnífica hospitalidade que recebi lá. Mas o costume do dia de Ano Novo, independentemente do que se diga e das piadas que se façam [ tir], tem a sua utilidade, pois obriga as pessoas a dizerem coisas muito carinhosas que pensam e que apenas a preguiça as impedia de escrever. É por isso que desejo a ambos um ano doce e bom, tranquilo e alegre com os seus amigos. Peço que diga o mesmo ao Sr. Rigaut, que é um homem gentil, e também ao seu pobre pintor. Acredito que você ficaria bastante satisfeito em saber como passo meus dias em Paris. Desde que você me mandou de volta para cá, não fui à escola nem ao advogado, tanto que reclamaram que eu não ia muito. Mas, em 1841, fiz uma reforma geral na minha conduta. Este ano, tive o prazer de enviar música para minha irmã. Entregue a ela em meu nome. Como músico profundo que sou, escolhi o álbum cujas vinhetas eram as mais bem desenhadas. Quanto a você, que é meu irmão, não lhe dou nenhum presente, a não ser um magnífico chapéu que acabei de criar e que poderá fazê-lo rir. Isso é o que se chama de presente poético.
Há palavras castas que todos nós profanamos:
Os amantes do incenso fazem um estranho abuso
Não conheço ninguém que não adore algum anjo.
Acho que os que estão no Paraíso não têm muita inveja.
Esse nome sublime e doce não deve ser dado
(Somente a corações belos, puros, virgens e imaculados.
Veja! Um pouco de lama pende de tua asa
Quando teu anjo ri e se senta em teu colo.
Eu, quando eu era criança, minha tolice ingênua -
- Uma garota tão ruim quanto bonita -
Eu a chamava de meu anjo. Ela teve cinco amantes.
Pobres tolos! Com tanta sede que estamos sendo afagados
Que eu ainda gostaria de abraçar alguma mulher jocosa
A quem dizer: meu anjo -, entre dois lençóis muito alvos.
CHARLES BAUDELAIRE - TRAD. ERIC PONTY

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