Pesquisar este blog

sábado, agosto 16, 2025

Pentimentos & Imagética - Iosito Aguiar

(Releitura Poética do Livro Homo-Imagens de Eric Ponty)

 Dissecação para o grito


Meus olhos novamente ungidos
Sim, meus olhos futuristas
                           cubistas
               interseccionistas
Que não param de sorver toda a beleza
                                            espectral
                                          sucedânea
                                        sem suporte
                                     desconjuntada
                                sempre emersa
                                   sempre variável
                                        sempre livre
Sempre em contínuas mutações
Sempre em insondáveis divergências

I

E se ante o cotidiano
  entre ruas, avenidas e transeuntes
inesperadamente abríssemos a boca
      num ato brusco e sem melodia?
Será que aquele impensado gesto
faria sucumbir a crua realidade?

Que somos senão sombras
do que ontem sonhávamos?
Não somos mais que fátuos do vivido
Nossa memória do criado sempre se desfaz!

Nada mais nos resta que soluçar
após tão brusca passagem
e a revelação de não nos transcendermos
Sempre devemos desfazer o feito
Para depois, descer exaustos
                            num grito.

II
Nos desfiguramos ante o som
    como se fôssemos íntegros
           e nem percebêssemos
       que tudo estava figurado
       e que desfiguramos tudo
  como se tudo fora a imagem
      a mesma imagem vertida
   na reflexão da mesma onda.

O cotidiano é um enfado
estranha selva de almas
onde nossos gestos se findam.

No final, talvez reste uma lembrança
                                 que nos libere
     da condição de animais enfarados
últimos deste universo
que se auto-destrói.

No Cosmo, somos apenas um eco
e de nada valerá nosso reflexo
ante a consciência do Ahânkara

 

III

Abatidos seguimos nossa via
portando réstias de memórias
que se decompõem
ante nossa inconsciência
                           ao sol.
Aquele homem sob a velha árvore
será apenas um reflexo
ou mera ilusão de ótica?
Será que ainda lhe pulsa o coração?
Solitários, sim, não passamos de ecos
ecos soluçantes do espetáculo
                                 da vida.
Ecos áridos, degredados de quem
                        ainda que queira
não pode interferir.


IV


 A noite se adensa em nossa alma
Embora sua existência pareça sólida
tudo não passa de conjecturas
onde vários eus se fixam 
para que não nos dissipemos na aurora

Sob a lua se nos olharmos ao espelho
não veremos mais que fantasmas
O rosto refletido pelos argênteos raios 
nada pode dizer-nos de novo.

Sob a nossa apaziguada pele
Sob a estrutura de tôscos crâneos
após a dissecação do tempo
Não restará mais que um vago riso.

V

Adentrar a consciência
lançar-se às interrogações
nos espaços dos eus
restam escadas
que não conduzem a nada
Embora as portas continuem abertas
e as paredes exibam os mesmos rebôcos
O eco do grito primal
que lançamos ao nascer
talvez ainda possa ser ouvido
por entre os esquecidos pássaros
dos esquecidos sonhos
É um grito vindo das estrelas.


VII

Onde abrigar esta dor
dos sonhos passados?
Aquele esperado mensageiro
não passava de uma ilusão
num diálogo sussurrado
É por isso, como se fora um sonho,
que esta dor sempre se renova a cada dia
Estações da alma, estações do tempo
Fenecemos nas mesmas angústias
apesar da réstia de esperança.

VII

Fugir! por quê e prá quê?
Pense a casualidade como sina
ou o nascimento de um herói ou covarde
Como será isto se toda sina é igual?
                                 Não há fugir
embora a noite e sua escuridão
proporcione abrigo, esquecimento
Nosso eu se move na escuridão
num labirinto de sombras
desde nosso nascimento

                                                          VIII

                                    Solidão
verdade a ser carregada na alma
                              na memória
Qual feixe de perspectivas relativas
                         olhemos em volta!
Não se vê mais que dissecados sonhos
Sonhos migrados da inconsciência
E da sua irrealidade nada nos advém
além das mesmas suposições.
 Iosito Aguiar
 

 

 ERIC PONTY POETA-TRADUTOR-LIBRETTISTA 

Nenhum comentário: