Segundo
se sabe, Virgílio, ao ponto de falecer, encarregou aos seus amigos que reduzem
as cinzas inconclusivo manuscrito da Eneida, no que se cifravam onze anos de nobre
e delicado labor; Shakespeare não pensou jamais em reunir em um só volume nas
muitas peças de sua obra;
Kafka
encomendou a Max Brod que destruísse as novelas e às narrações que que iriam asseguravam
sua fama. A afinidade de estes episódios ilustres és, si não me engano, ilusória.
Virgílio
não podia ignorar que contava com a piedosa desobediência de seus amigos; Kafka
com a de Brod. O caso de Shakespeare é distinto. De Quincey conjetura que a
Shakespeare à publicidade consistia na representação e não na impressão; o cenário
era importante a ele.
Por
demais, o homem que realmente quer à sonegação de seus livros não encarrega essa
tarefa a outro. Kafka e Virgílio no desejavam sua destruição; só alhearam desligar-se
da responsabilidade que uma obra sempre nos impõe.
Virgílio,
creio, obro por rações estéticas; houvera querido modificar tal qual à cadência
o tal qual epíteto. Mais complexo é o, me parece, o caso de Kafka.
Caberia
definir seu labor como uma parábola o uma série de parábolas, cujo tema é a
relação moral do indivíduo com a divindade e com sua incompreensível universo.
Apesar de seu ambiente contemporâneo, está menos cerca do que se há dado chamar
literatura moderna que do Livro de Job.
Pressupõe
una consciência religiosa e ante todo judia; sua imitação formal em outros
contextos carece de sentido. Kafka percebia sua obra como um ato de fé e não
queria que esta desalentara aos homens. Por tal ração encarregou a seu amigo na
sua destruição.
JORGE LUIZ BORGES
TRAD. ERIC PONTY
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