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sexta-feira, janeiro 12, 2018

Os embates dum caracol aventureiro - Federico Garcia Lorca - Trad. Eric Ponty

Existe candura infantil
No alvorecer sereno.
As árvores alargam
Seus braços ao chão.

Um sopro tremente
Ganga as sementeiras.
E as aranhas ampliam
Suas passagens de seda
- Confins na limpidez do cristal
Da feição.

Na via
Uma fonte lê
Sua canção entre as chelpas
E o caracol, pacifico
Corriqueiro da vereda
Desconhecido e miserável
A vista observa
A nobre quietude
Da Casta
Deu-lhe coragem e fé
Olvidando-se das aflições
De sua morada
Observar o fim da seda.
Colocou-se a marchar e adentrou-se
Em uma brenha de heras
E de urtigas. No meão
Existia duas rãs antigas
Que recebiam sol,
Enfadadas e doentias.

“Esses hinos atuais
- Murmurava uma dentre elas-
“São incultos. ” Juntos
Amigavelmente – lhe responde
A outra rã-das-moitas, que se achava
Com chaga e quase alucinada
“ Quando nova cria
Que se enfim Deus escutasse
A nossa serenata traria
Dó. E minha noção
Pois já existi assaz
Faz com que não ache.
Eu já não faço serenata...”

As duas rãs se lamentar
Exorando uma pedincha
A uma rã jovem
Que sobrevém convencida
Espaçando as ervas.

Ante brenha triste
O caracol se terrifica
Quer berrar. Não pode
As rãs aproximam-se dele

“É uma mariposa? ”
- Diz a pouco mais ofuscada
“Tem dois cornichos”
- A outra rã contrapõe
“É caracol que notarás
Caracol, doutros chãos.

“Chego da minha moradia e quero
Bem já retornar para ela. ”
“É uma peste muito inerme
- Exclama a rã ofuscada
“Não seduzes nunca? ” “Não canto”
Diz caracol. “ Nem faz as preces?
“Também não – Jamais estudei
“ Nem acredita na existência eterna?
“Do que se trata disso?

“É existir eterna
Dentro d’água mais amaina
Perto dum chão florejada
Que argentário manjar escora. ”

“ Quando o garoto me falou
Um dia a minha paupérrima avó
Que, ao padecer, eu partiria
Para unidas folhagens mais tenras
Do arvoredo mais alto.

“ Uma irreligiosa foi tua avó.
O fato te contamos
Nós. Fias nela”,
Falam as rãs irritadas.

“ Por que quis observar a senda? ”
- Soluça o caracol. “Sim, acredito
Para sempre uma existência eterna
Que (me) predicais...”

As rãs
Muito contemplativas, arredam
E o caracol, assombrado
Vai-se arrastando no bosque.

As duas rãs pedintes
Como enigmas ficam.
Uma delas se argumenta.
“Acreditas na existência eterna”
“ Não creio! ” Pronunciando muito triste
A rã chaga e alucinada
“ Por que nos pronunciamos
Ante o caracol que cresse?
“Por que... Me indago a razão
- Pronuncia a rã cega.
“Parto-me de emoção
Ao notar a firmeza
Com que avocam os meus filhos
Deus nos concebe acéquia.

As formigas exclamam
Mexendo as suas antenas.
“Trucidar-te-emos; és
Inerte e perversa
Os afazeres são sua lei. ”

“Observei estrelas”,
Diz a formiga com ferimento.
E o caracol sentencia:
“Deixa que parta,
Prossegui os vossos trabalhos.
É crível que muito preciso
Entregue faleça.

Pela feição dulcifico
Atravessou uma abelha.
A formiga, estertorando
Cheira a tarde enorme
E conta: “ É aquela vai conduzir-me
Uma estrela.

As demais formiguinhas 
Evadem ao observe-la morta.

O Caracol anseia
E tonto se arreda
Repleto de confusão
Pelo ensejo do eterno. A senda
Não se finda”- exclama.
“ Quiçá às estrelas
Se abeirar-se por aqui.
Mas minha boa covardia.
Me atalhará de abeirar-se.
Não falemos mais nelas. ”

Tudo jazia brumoso
De sol precário e bruma.
Campanários distantes
Evocam pessoas à igreja,
E o caracol, pacifico
Corriqueiro da senda
Tonto e irrequieto
A vista vê.      

Trad, Èric Ponty





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